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SEÇÃO
Crônicas
28/04/2007 - 17h14
Tempo maduro
Fátima Nascimento
 

Dona Sílvia tem oitenta anos. A esta altura da vida está com a audição bastante comprometida, mas parece bem lúcida e serena. Perde um pouco da candura quando o assunto é a velhice. “Envelhecer é muito triste”. Em menos de uma hora ela disse a frase pelo menos três vezes. Eu a encontrei na sala de espera de um consultório médico.

Olhos claros, creio que verdes. Em uma das mãos, um jornal de circulação nacional. Não usava óculos, mas tinha uma lente de aumento na outra mão. Estava entretida com a leitura. Percebi que se tratava do segundo caderno, que geralmente traz em suas páginas temas mais amenos, como os relacionados à cultura. Admirei aquela mulher e imaginei se no avançar da minha idade manteria o gosto pela leitura e se seria contemplada por mais novos numa situação semelhante.

De repente, uma das páginas caiu no chão. Tentei pegar, mas antes ela já havia conseguido. Mesmo assim agradeceu. Acredito que só naquele momento notou minha presença. Falei algo, mas não entendeu logo. “O brasileiro não dá importância para o ouvido”, sentenciou. Dona Sílvia confessou-se relapsa com sua audição enquanto jovem e afirmou: “envelhecer é muito triste”.

Na noite anterior, enquanto falava ao telefone com a irmã, pressentiu que ia desmaiar. “Vou desligar porque estou desmaiando”. Contou ter acordado algum tempo depois com seu amigo-cão lambendo o rosto dela. “Envelhecer é muito triste”, repetiu. Ela mora só; tem 80 anos; gosta de ler e não ouve nada bem. É o que sei sobre dona Sílvia, além do nome e de sua opinião sobre o envelhecimento.

A longevidade na família dela é comum, também contou. Mas pra ela viver por tanto tempo não é uma dádiva porque “envelhecer é muito triste”. Apesar da idade, caminhou com firmeza. Levantou e pegou água pra si. Depois um pote com balas, que ofereceu para todos. Olhei para o relógio. Já devia estar no trabalho. Aquietei-me. Mais um atendimento e seria a minha vez.

Enquanto jovens, a vida nos impõe um ritmo frenético. Não nos enxergamos idosos mais adiante. Não cuidamos para que envelheçamos saudavelmente.  Temos pressa, mas não planejamos a caminhada aos 50, 60, 70, 80 anos. Seguimos e só.

Dona Sílvia, no auge da sabedoria octogenária, falou: “A melhor fase da vida é dos 25 aos 50 anos”. Passei da metade. Saí do consultório com uma série de exames por fazer e a certeza de que o tempo deve ser usufruído em favor de uma velhice feliz.


Nota do Editor: Fátima Nascimento é jornalista que, em suas crônicas, lê a vida com os olhos e pensa com as palavras.

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