Mesa de bar, anos 70, governo militar, cerveja. Três jovens, formados, discutem seus destinos. Um conseguira, por concurso, ser funcionário de banco estatal com quinze salários/ano, benefícios e segurança para o futuro. O outro, resolvera ser profissional liberal, fizera cursos, alugara sala, avisara amigos e parentes, colocara anúncios em jornal e começara a lida. O terceiro não decidira o que fazer, queria ser livre. Não aceitava ser funcionário e nem esperar clientes. Só via uma solução: viver por conta própria, criar algo. Virou, quase sem querer, empresário. 2007, o Brasil continua a ser promessa, faz zoada, mas representa apenas 2% da economia mundial. Tem focos profundos de desigualdade, cidades estão permeadas de violência e todos, ricos e pobres, sabem que não vivem no país que sonharam. TVs, rádios e jornais falam de crimes, seqüestros, dão espaços e voz a marginais, corrupção, mas há fé e esperança. Os três amigos voltam a um bar. Já não tomam cerveja. Pedem Campari, suco e água com gás. Um tem diabetes, outro porta insuficiência coronariana e o terceiro reclama das articulações. Dão um balanço nas suas vidas. O funcionário perdeu "status", os salários reduziram-se a 13, não muda de carro há anos, aposentou-se, mas continua trabalhando, apesar do diabetes forte. O profissional liberal, por conta das coronárias, teve que parar tudo, apenas caminha cedo. É viúvo, vê pouco os filhos e netos e dá graças a Deus por possuir um lugar onde morar e a parca aposentadoria do INSS. O empresário ainda não pode se aposentar. Divorciado, continua na luta. Relembra, didático, a hiperinflação, impostos insuportáveis, juros altos, desvalorização cambial, cinco moedas, 07 planos econômicos, concorrentes draconianos e até parceiros desonestos. De repente, dez da noite, "em face de todo o exposto", soltam gargalhadas, abraçam-se, consideram-se sobreviventes e saem, sem olhar para dois "pivetes" de armas em punho, nervosos e com voz alta de urgência, pois estão na rua, pedem celulares, relógios e carteiras. Correm, um celular cai e toca. "Alô, ainda estamos vivos." Há esperança. (esta crônica é dedicada aos policiais do Ceará)
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