No elevador, estamos inevitavelmente juntos, pessoas de idades diferentes, de classes sociais diferentes, de profissões diferentes. Algumas dessas pessoas se conhecem, outras não, mas isso não importa: no elevador, partilhamos um espaço comum, uma trajetória, até certo ponto, comum. Ou seja: o elevador é a vida. Mas é a vida em condições especiais, a vida, por assim dizer, compactada, ao menos em termo de espaço físico: elevadores não costumam ser muito grandes. A proximidade cria uma situação perturbadora, capaz até de gerar fantasias. Há um anúncio de TV (propaganda de desodorante, se não me engano) que fala disso: o homem entra no elevador, onde já está uma moça que o olha de maneira significativa. Fecha-se a porta. Na cena seguinte, abre-se a porta e ali está o homem, todo desfeito, sugerindo que um ato de tórrida e clandestina paixão acabou de ocorrer. Pouco provável? Certamente. Mas e se o elevador estragar? Se faltar luz? Aí pode dar tempo para muita coisa, inclusive fantasias. Ainda que muito transitória, a convivência no elevador tem suas regras, a sua etiqueta. No elevador, em geral, não se fala. Comentários casuais são permitidos ("Marque o oitavo, por favor" ou "Mas que calor está fazendo"), porém a conversação mais longa está automaticamente eliminada. Às vezes, duas pessoas entram, já no meio de um diálogo; tudo bem, mas espera-se que não falem alto: será falta de educação. Também se espera que as pessoas cedam seu lugar para aqueles que estão entrando. E aí surge uma possibilidade incômoda, traduzida numa pergunta que vale para a existência como um todo: cabe mais um? Aquele que está entrando obviamente quer uma resposta positiva; mas infelizmente nem sempre poderá contar com a boa vontade dos que já conquistaram seu espaço no diminuto recinto. O que pode gerar até conflitos. Em dezembro, em Nova York, hospedei-me num gigantesco hotel que estava completamente lotado, e no qual havia um problema: dos cinco elevadores, só dois funcionavam. Um legítimo apagão de elevadores, portanto. Resultado: quando as pessoas queriam descer, o elevador estava cheio. É uma realidade que todo mundo aceita, num primeiro momento; mas depois de esperar 20 minutos, meia hora, os hóspedes queriam descer de qualquer maneira, com ou sem lugar. Tentavam invadir o elevador, sob protestos daqueles que ali estavam, o que era considerado, pelo candidato a embarque, como uma manifestação de egoísmo. Os bate-bocas que então ocorreram provaram que o troglodita continua presente mesmo em pessoas elegantes e refinadas. Sim, ferocidade tem lugar cativo no elevador, ao menos em um cantinho. Uma vez imaginei a seguinte história. O personagem está no elevador, já cheio, quando entra um sujeito com evidente cara de bandido e que aparentemente o conhece, porque pergunta algo do tipo: "Ficou tudo bem lá?". Sem saber do que se trata, nosso personagem opta por uma evasiva: "Mais ou menos". O que deixa o outro furioso: "Mais ou menos? Quer dizer que o cara continua incomodando? Ah, mas eu vou dar um jeito nisso. Ele não perde por esperar". E sai do elevador, deixando o outro em pânico: será que, involuntariamente, ele não estará causando a morte de alguém? Do cara que não perderá por esperar? Fantasias de elevador. São as fantasias da vida, subindo ou descendo.
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