...peso de papel
A gente vivia rindo da minha avó. Ela era velha, sabe como é, e os mais novos adoram rir de tudo o que os mais velhos fazem. Mas a gente ria mais era quando ela guardava os papéis dos presentes. Todos os natais, ela ficava andando entre os netos, recolhendo os papéis nos quais nossos carrinhos, bonecas e bolas vinham embrulhados. E ai de quem rasgasse o embrulho. Ela começava uma conversa interminável, misturando xingamentos italianos com um português enrolado, dizendo que a gente era um bando de moleque que só sabia desperdiçar. E não eram só os papéis de presente, não. Ela guardava também as sacolas plásticas, os saquinhos de papel e todas essas coisas que as lojas, padarias e supermercados colocam as coisas que a gente compra por lá. As gavetas dela viviam lotadas dessas porcarias, e quando a gente perguntava o que ela ia fazer com tudo aquilo, ela dizia que um dia poderia precisar. Tudo bem, ela podia até usar uma coisa ou outra de vez em quando, mas ela recolhia aquelas coisas com muito mais rapidez do que usava, e aquele monte de papel acabava mesmo era amarelando e esfarelando no fundo das gavetas. Uma vez, o meu pai me disse que ela era assim por causa da 2ª Guerra Mundial, durante a qual a família dela tinha passado muita necessidade, e que não era só ela, mas todo mundo que viveu aquela época tem um pouco dessa mania de não desperdiçar nada. Eu fico pensando o que é que esse pessoal, se estivesse vivo, iria pensar de nossa época, na qual celulares pelos quais pagamos uma pequena fortuna, em menos de dois anos já viram brinquedo de criança. Você já viu isso? Volta e meia, numa casa com criança pequena, a gente vê um celular jogado no chão, com uma criancinha apertando os botões, e quando a gente tenta tirar delas os pais viram pra gente e falam que aquilo é para elas brincarem mesmo, que já nem está funcionando mais. E os computadores? Outro dia desses, eu vi um computador jogado no lixo de uma casa. Tudo bem, era uma coisa bem antiga, provavelmente ainda nem tinha estrada USB, ou leitor de DVD, mas ele estava no lixo, deus do céu, e não devia ter nem dez anos de uso! - Pombas, pai, e o senhor queria que eles fizessem o quê com um computador de dez anos? Bem, é exatamente isso o que eu estou querendo dizer, filha. Dez anos, não são nada.
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