O perigoso impasse salarial volta a rondar as polícias. As greves e aquartelamentos de policiais militares em diversos Estados, que se tornaram rotina, potencializam esse impasse, com sérias repercussões negativas, que deixam apreensiva a comunidade. Em São Paulo, até hoje legalista diante dos regulamentos que impedem a paralisação, já existem setores que discutem a realização de operação-padrão ou paralisação de 24 horas, a título de advertência, diante da morosidade do governo quanto aos problemas salariais e sociais da categoria. No interesse geral, algo há de ser feito de imediato para evitar a chegada a esse extremo. De espíritos desarmados e sem radicalismo, o Estado empregador e os empregados policiais devem se reunir e buscar uma solução sem traumas. Esse encaminhamento, a bem da verdade, é o ideal para todos os Estados brasileiros pois, todas as polícias estão com salários defasados e em ponto de eclosão. De um lado, é certo que a greve não é direito dos policiais, e concordamos que realmente os policiais militares não devam ter direito a esse tipo de protesto, devido à essencialidade de suas funções. Mas, de outro, há de se considerar que a classe tem direito a um salário que permita viver normalmente com sua família, sem a necessidade de recorrer ao bico, também proibido, mas tolerado pelo Estado empregador como alternativa à penúria imposta pelos baixos salários. A vida do policial, outrora orgulhoso de sua condição de guardião da sociedade, está ruim a tal ponto que, hoje, ele é obrigado a andar sem farda, sem arma, sem documentos e orientar seus familiares para não declinar a sua condição de qualquer parentesco com policial. A deterioração social é tão grande que, em vez do policial caçar bandidos, os bandidos, com suas organizações criminosas cada dia mais fortes, é que caçam o policial. Tudo isso com a agravante de que, com o baixo salário, o policial muitas vezes é obrigado a morar na favela, não tem veículo próprio e não dispor de coisas básicas que, além de conforto, aumentam sua segurança. Afora a questão salarial, que é urgentíssima, os governos estaduais, juntamente com o federal, os municipais e segmentos da sociedade, não podem tardar para o início de uma grande reengenharia social. Há que se implantar reformas profundas na segurança pública, sistema penal, política de emprego e trabalho, moradia, educação e na saúde. A crise hoje instalada em todos esses (e outros) setores é o combustível para a desagregação social que vemos avançar todos os dias com o aumento da violência. A crise da segurança pública não deve ser encarada como resultante só de baixos salários dos policiais, da ousadia dos bandidos e contraventores ou da falta de oportunidades ao indivíduo que desaba no crime como única alternativa. É o produto de anos e anos de omissões e decisões equivocadas tanto do governo quanto da sociedade. Independente de procurar responsáveis pelas omissões do passado, as lideranças atuais, públicas e privadas, têm o dever de promover uma ampla revisão social, antes que a guerra civil, hoje localizada em bolsões, se alastre para toda a cidade, o Estado e o País. Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e presidente da APOMI (Associação dos Policiais Militares do Estado de São Paulo).
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