O cooperativismo, antes de ser uma forma de sociedade, é uma ideologia. Vivemos em um ambiente econômico extremamente capitalista, em que o mercado dita as regras do ambiente social. A competição é a regra do capitalismo e trouxe muitos benefícios, como o desenvolvimento tecnológico e a globalização, que permitem a integração de mercados continentais. Mas, junto com o desenvolvimento econômico, o sistema capitalista acarretou um enorme desequilíbrio social e uma desigualdade econômica entre os cidadãos, que, conseqüentemente, gera cada vez mais pobreza, ainda mais agravada com o poder que o dinheiro tem de proporcionar cada vez mais lucros, aumentando a distância com os desbastados. É importante frisar que não existe crime em se ganhar dinheiro, em exercer atividades lucrativas. Em uma sociedade como a nossa, é esse dinheiro em circulação que permite um mínimo de crescimento anual do país. Portanto, é necessário que os empreendedores tenham um cenário econômico favorável para investimentos e movimentação da nossa economia. Porém, todas as atividades produtivas que movimentam nosso país possuem como elemento central algo a mais do que a geração de dinheiro e lucro. É a denominada função social das empresas, da propriedade, dos contratos. Ou seja, todo acordo de vontades, toda atividade econômica e todas as propriedades devem atender, além dos interesses das partes envolvidas, a sua função social. A função social é um termo utilizado por nossa Constituição Federal para agregar um valor muito maior do que qualquer riqueza - é o valor da dignidade da pessoa humana. A busca do lucro é um direito, mas desde que não acarrete mais pobreza e desigualdade social à coletividade. É nesse contexto que surge a responsabilidade social das empresas, as desapropriações de terras improdutivas para a reforma agrária e a desconsideração judicial de cláusulas contratuais abusivas. A função social está por trás dessa evolução jurídica da sociedade. Antigamente a propriedade particular era absoluta. Atualmente, é relativa, nos limites dos interesses da coletividade. E é justamente esta coletividade que é tão importante no contexto cooperativista. Antes de ser uma forma de sociedade, a cooperativa é uma ideologia de movimentação econômica e social. No passado, algumas pessoas descobriram que ao invés de competirem entre si em alguma atividade econômica, poderiam agir conjuntamente em vista de um objetivo comum, de forma democrática, com respeito pelo próximo, dividindo os resultados na medida da colaboração de cada um. A idéia amadurece a cada dia. Temos a prática dessa filosofia com o cooperativismo de crédito, em comparação aos bancos, que têm por atividade a prestação de serviços financeiros, assim como as cooperativas de crédito. Mas, o objetivo do banco é lucrar com essa prestação de serviços, enquanto o das cooperativas é diminuir o custo dos serviços financeiros aos seus cooperados. Isso só é possível devido ao objetivo não lucrativo das cooperativas e devido à participação efetiva de seus donos, com base na democracia. Ou seja, busca-se eliminar o intermediário de serviços financeiros (banco) que lucra em cima dos cidadãos, através de uma atividade em que os cooperados são donos do negócio e usuários dos serviços, pagando-se apenas os custos da atividade. Caso a cooperativa arrecade mais do que precisou para cobrir seus custos, esses valores, chamados sobras, são devolvidos aos cooperados, de acordo com a contribuição de cada um ao longo do ano. No caso dos bancos, essa parcela não é apenas um excesso, mas o objetivo final - o lucro -, o qual é direcionado aos banqueiros e não retorna aos clientes. Por esse motivo, os bancos batem recordes consecutivos de lucros anuais. As cooperativas são sociedades de pessoas, enquanto os bancos são sociedades de capital. O valor maior das cooperativas é a pessoa do cooperado. O valor maior dos bancos é o dinheiro dos clientes, responsável pelos gordos lucros. Apenas para exemplificar um dos efeitos desta relação, nas cidades em que existem cooperativas, o Índice de Desenvolvimento Humano - IDH é superior ao das cidades que não possuem cooperativas. O motivo dessa reflexão é trazer os cidadãos para a dura realidade econômica e social do Brasil e mostrar-lhes que há um caminho para contrapor a concentração cada vez maior de riquezas e a conseqüente desigualdade social. Cada um de nós precisa se sentir responsável pelo problema. Fazendo parte de uma cooperativa, as pessoas têm a chance de se sentir parte da solução. Nota do Editor: Fábio Telles Siqueira é Assessor Jurídico do Sicoob Central Cecresp (Central das Cooperativas de Crédito do Estado de São Paulo).
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