Domingo passado (10/06), a Avenida Paulista estava lotada de homens e mulheres que, por genética, vontade ou comportamento, fugiram da ortodoxia da sexualidade. Foram três e meio milhões de pessoas corajosas, sem medo de enfrentar familiares, colegas e a sociedade, optando por quebrar regras, preconceitos, em meio à discriminação de quem se acha superior apenas por ser o que é, sem saber exatamente o que passa na cabeça e no corpo de quem tem no arco-íris a sua bandeira de resistência e paz. Nestes tempos tão sofridos, em que o amor entre homem e mulher, dentro ou fora do casamento, passa por transformações tão profundas e ainda não sedimentadas e mexem com as formas tradicionais de família, é hora de olhar o outro, não pela sua preferência sexual, mas por seu comportamento e desempenho como ser humano e cidadão. Não se pode louvar alguém apenas por ser genuinamente homem ou mulher. Tampouco, se pode condenar outra pessoa por ela ter preferências que não as ditas naturais de seu sexo. A literatura, as ciências e as religiões ainda não têm respostas para os que saíram do estabelecido na certidão de nascimento e cumprem vida diferente da esperada por suas famílias e, de forma explícita, encaram gente preconceituosa, recriminações de parentes e as chacotas de muitos. É preciso coragem para, de cara limpa ou mesmo por trás de batons, adereços e perucas, enfrentar fotógrafos, microfones e câmeras que sempre apostam no caricato ou burlesco. Os tais críticos não procuram entender a razão dessas pessoas. O que eles, os críticos, realçam, e de forma perversa destacam, são as excentricidades, esquecendo que aquilo era uma parada e chocar é uma forma de chamar a atenção para si, de dizer que, se são milhões, esperam compreensão, outros olhares, outros comportamentos e atitudes de todos. A Justiça já começa a mudar a sua visão sobre o problema e passa a ver na parceria ou união entre pessoas do mesmo sexo como um fato e não como uma anomalia ou uma abstração teológica. Nós outros, os que somos diferentes deles, porque heterodoxos, não temos o direito de torcer o nariz ou de gargalhar. O que nos compete é ver na diversidade e alteridade explícita os signos de um novo tempo, não o da era de Aquário, mas o da quebra literal dos vidros dos preconceitos, da farsa e do transbordar de águas limpas para banhar, limpar as dores, apascentar famílias e a todos os seres humanos, independente de suas preferências sexuais e idiossincrasias. Voltaire, já no século XVIII, dizia: "Um preconceito é uma opinião não submetida à razão".
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