Na crise do apagão, três frases surgiram, frases que já estão destinadas a figurar no folclore político brasileiro e que volta e meia serão repetidas. A primeira foi a da ministra Marta Suplicy, o agora famoso "Relaxa e goza". A segunda foi do também ministro Guido Mantega, que viu, na confusão dos aeroportos, um sinal da nova prosperidade brasileira. A terceira é do brigadeiro José Carlos Pereira, o presidente da Infraero, falando à BandNews FM: "Estou absolutamente tranqüilo para voar. Até porque os aviões estão retidos no solo e todo mundo sabe que a melhor proteção para um avião não cair é ele não decolar". Reparem que, a rigor, nenhuma das declarações é absurda. A ministra Marta simplesmente usou aquela expressão que os americanos consagraram, o "relax and enjoy" (que, a propósito, não tem necessariamente conotação sexual), para tentar uma espécie de sorridente psicoterapia - afinal, ela é psicóloga de formação. O ministro Mantega constatou algo que é real: de fato, os brasileiros estão voando mais, e os problemas seriam inevitáveis. E finalmente o presidente da Infraero disse o óbvio: avião que não decola não cai. A reação das pessoas, contudo, foi de franca irritação. Viram nas palavras das autoridades um acinte. E isto remete a uma questão importante: como deve ser o diálogo entre governantes e governados? Em primeiro lugar, governante tem de falar sério. O povo brasileiro pode ser brincalhão, e é brincalhão, mas não quer brincadeiras de seus líderes (aliás, Lula já cometeu algumas gafes neste sentido). Em segundo lugar, o povo não quer comentários. Comentários ficam reservados para as colunas de jornal (humorísticas, inclusive), para as conversas de bar. Do governo as pessoas esperam diagnósticos, e esperam soluções objetivas, rápidas, precisas, eficazes. Notem que esta é também a regra básica da relação entre médicos e pacientes e, de fato, os governantes são muitas vezes vistos como os médicos (de preferência os cirurgiões) do corpo social. Não é de admirar que a palavra final tenha ficado a cargo do comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, que, bem ou mal (e isto os próximos dias dirão), adotou resoluções enérgicas. E anunciou-as num tom que estava longe de ser ameno. Mas, no passado, não tivemos governantes risonhos? Tivemos. JK foi um exemplo. Só que o Brasil mudou desde então. O Brasil ficou um país sério. O que nos remete a uma quarta, e muito famosa, frase: o Brasil não é um país sério, teria dito o presidente francês Charles De Gaulle a propósito de uma disputa sobre pesca da lagosta com o governo brasileiro. Mas De Gaulle nunca disse tal coisa. A frase teria sido atribuída a ele pelo então embaixador do Brasil em Paris, Carlos Alves de Souza. A versão ficou e persistiu de tal maneira que o também presidente Jacques Chirac declarou, numa entrevista à imprensa brasileira: "O Brasil é um país sério", ou seja, recorreu a uma espécie de indenização moral. E a verdade é que ele está certo. Há um sentimento de que, sem seriedade, os problemas do país não serão resolvidos. A única coisa que nos tira do sério são os atrasos nos aeroportos.
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