Ao revelar que o avião do presidente não voa com o reversor da turbina pinado, como fazia o Airbus da TAM que explodiu em Congonhas, o governo dá a prova da existência de, pelo menos, dois Brasis: o dos poderosos, cuja vida tem de ser protegida; e o do povo, que vai de qualquer jeito. Esse comportamento chega a ser inconstitucional, pois fere o artigo 5º da Carta Magna (todos são iguais perante a lei...) Num país sério, as vidas do chefe de Estado, dos ministros e de altas autoridades devem ter o mesmo valor da vida de qualquer cidadão. O povo é credor do mesmo cuidado que se tem com os figurões. Soa mal aos ouvidos saber que medidas básicas como essa de só voar em aviões totalmente íntegros beneficiam apenas as autoridades. É vergonhoso o grande fosso cavado entre a casta político-administrativa e o povo, que deveria ser encarado como a razão única da existência desse extrato de privilegiados. Enquanto o presidente da República, governadores de Estados e outras autoridades, que ganham altos salários, são cercados de todas as mordomias e de segurança absoluta paga pelo contribuinte, o cidadão mal remunerado (a maioria com o salário mínimo ou até menos) tem de pagar as próprias despesas e vive o drama da falta de emprego, de saúde, de educação, de segurança e de muitas outras coisas que a simples cidadania lhe deveria garantir. Ofende ao simples mortal saber da existência de aviões e veículos luxuosos (muitos deles blindados) e palácios, pagos com o dinheiro público, servindo às autoridades numa verdadeira ilha da fantasia. Toda essa gente deveria pagar a própria moradia e comida e locomover-se em aviões de carreira, como faz o povo. Só usar o recurso público em missões reconhecidamente oficiais. Fazer como fazem os servidores públicos comuns. Chega a ser utópico pensar numa reforma social que devolva a respeitabilidade há muito perdida pela classe político-administrativa, mercê dos exageros por ela cometidos. Mas não é proibido ao menos sonhar que, um dia, esse país venha a ser tomado por uma onda de sensatez e isso reduza a estratosférica distância hoje existente entre as elites (principalmente as públicas) e o cidadão. Talvez a grande solução para o Brasil esteja naquela velha música do Juca Chaves, que propõe salário mais baixo para o político e mais alto para o povo... Com o povo bem nutrido e os escândalos político-administrativos jogados nas páginas do passado, até os figurões poderão relaxar e nem precisarão mais de segurança e transporte diferenciados. E todos poderão, finalmente, voltar a ser iguais, como manda a Constituição... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e presidente da APOMI (Associação dos Policiais Militares do Estado de São Paulo).
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