Depois de quase três meses negando as evidências e enrolando-se cada vez mais no novelo da crise, o presidente do Senado dá os primeiros sinais de que poderá renunciar. Porém, antes de acenar com a capitulação, fez acusações (explícitas e veladas), revestidas de um tom de gravidade que toda a Nação tem necessidade de ver apuradas com seriedade e profundidade. Acuado e na defensiva, Calheiros - que, em função do cargo, tem fé pública, e é o terceiro na linha de sucessão da República - deixou para trás um rastro de insinuações e acusações que autorizam o povo a crer na existência de muitos outros escândalos com o envolvimento de figuras, até então, acima de qualquer suspeita. Da mesma forma que pressiona o senador a purgar os seus pecados, a sociedade não pode permitir que suas afirmações passem em branco e caiam no esquecimento. O próprio Congresso - para extirpar a manta negra que tem coberto suas duas casas nesses tempos de denúncias, denuncismo e impunidade - deveria tomar as rédeas e buscar melhores explicações para aquilo que o seu presidente andou falando para amedrontar seus colegas. Tem de chamá-lo a confirmar o que afirmou ou deixou escapar, e abrir processos de investigação. Já que o resultado de CPIs tem se demonstrado ineficiente - recorde-se o mau exemplo dos sanguessugas - os questionamentos de Renan poderiam ser investigados diretamente ao Ministério Público que, não sendo parte do corpo em apuração, tem a independência e o equilíbrio necessários para dirimir dúvidas e separar o joio do trigo. Chega de CPIs que "fazem-de-conta". As que vimos funcionar ultimamente serviram apenas para deslustrar a imagem dos políticos e das casas políticas, que deveriam ser o santuário e o refúgio da sociedade. O sr. Renan Calheiros deve pagar por todos os seus erros. Se exerceu a promiscuidade econômica com empresas que se relacionam com o governo e, nessas condições, poderiam receber sua ajuda, tem de receber a justa punição. Se usou documentação falsa para comprovar negócios agropecuários impossíveis, tem de ser implacavelmente atingido pela Receita Federal e demais órgãos fiscalizadores. Mais até que o cidadão comum, pois, como detentor de fé pública, nem o direito à alegação de ignorância ou de boa fé lhe pode ser admitido. Mas todos aqueles que, no momento de desespero de Renan, receberam suas tintas, têm de ser pelo menos investigados para, ao final do processo, receberem a condenação por seus atos de improbidade ou o atestado de honorabilidade com o qual poderão acertar as contas com o acusador. A dúvida é o grande algoz de humanidade. O político não pode deixar dúvidas sobre seus atos, deve ser igual à velha figura da mulher do imperador. Além de ser honesto, tem de parecer honesto e, quando necessário, provar ser honesto. Só assim essa classe hoje, rotulada com as piores frases e os mais agressivos palavrões, poderá recuperar a honra conspurcada. Quem não deve não teme. Este país só será feliz no dia em que puder ter nos cargos eletivos e deles irradiando pelo serviço público e até para a iniciativa privada, homens e mulheres retos e destemidos, cujos atos resistam a qualquer investigação ou análise e, ao final dos processos, possam continuar firmes, altivos e... respeitados. A investigação dos esperneios de Renan Calheiros pode ser o começo de uma grande e vitoriosa caminhada rumo ao futuro melhor. Pode representar a bonita flor da esperança surgindo, mesmo brotando do lodaçal... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e presidente da APOMI (Associação dos Policiais Militares do Estado de São Paulo).
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