Uso de força não-letal é rotina nas abordagens policiais
Agência USP de Notícias - O uso da força não-letal está presente na maioria dos encontros entre a Polícia Militar e seu público, a população. De acordo com a primeira tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo Tânia Pinc, os graus de força mais utilizados nesses encontros são a ação de presença e a comunicação verbal. Tânia, que foi professora na Academia de Polícia Militar do Barro Branco durante seis anos, notou a importância de se consolidar pesquisas sobre as atividades policiais de rotina. Ela apresentou sua dissertação de mestrado sobre o tema na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Ao ingressar no mestrado, seu professor orientador, Leandro Piquet Carneiro, constatou a carência de estudos sobre atividades cotidianas da PM, ou seja, aquelas que ocorrem durante o patrulhamento das ruas. A abordagem policial foi o encontro selecionado para o estudo. Por meio da observação direta, foram registradas em vídeo 90 abordagens realizadas no ano de 2006 em uma localidade do município de São Paulo. A pesquisadora aplicou uma técnica inédita no Brasil na observação do desempenho operacional do policial militar, a Observação Social Sistemática (OSS), testada pela primeira vez em Boston (Estados Unidos) na década de 1970, para pesquisar o trabalho policial, e em Chicago, também nos Estados Unidos, em 1995, para averiguar o crime. "Técnicas de OSS têm sido empregadas internacionalmente com o objetivo de observar o policial em suas atividades de rotina, sem que ele saiba que está sendo observado", relata Tânia. Durante as abordagens observadas, os policiais pararam 26 carros e 64 motos, ocasião em que os veículos e seus ocupantes foram revistados. As abordagens ocorreram durante ações policiais realizadas em locais com alto índice de criminalidade. Não houve nenhum flagrante. “Esses encontros ocorrem com muita freqüência. De acordo com os dados da Secretaria de Segurança Pública, em média, o flagrante de um fato delituoso tem probabilidade de um em 100 de ocorrer”, afirma a policial. Outro fato que contraria o senso comum é a distribuição em termos raciais das abordagens. De 115 pessoas, 60% eram brancos, 30,5% negros e 9,5% de outras raças ou impossíveis de serem identificados na observação, por conta do uso do capacete em alguns motociclistas. “O que importa é o comportamento gerador de uma ‘atitude suspeita’”, diz Tânia, o que direciona a uma grande problemática da abordagem policial, identificar uma “atitude suspeita”, a justificação do policial para efetuar a ação. “Não há estereótipo do criminoso”, completa a pesquisadora. Tânia afirma que a abordagem policial não é uma situação agradável. "Trata-se de uma ação interventora que causa impacto na vida dos abordados, mas o alto grau de violência faz com que o policial tenha uma atitude permanente de desconfiança”, diz. "Mas ele não esquece que a abordagem é uma ação com amparo legal. É dele a decisão de fazê-la", explica. Comportamento policial O conjunto de ações que compõem a abordagem policial, porém, não é desenvolvido ao acaso. A Polícia Militar de São Paulo criou o Procedimento Operacional Padrão (POP) para padronizar a conduta policial e pensá-la previamente, já que “a decisão da abordagem se dá em fração de segundos e há necessidade de condicionamento”. De acordo com a policial, “os comandantes são responsáveis pelo treinamento, mas é difícil constatar a homogeneidade da ação. Grande parte dos policiais não utiliza algumas condutas seguras, o que aumenta a própria exposição ao risco”, conforme demonstrado em sua pesquisa. Ela exemplifica que, normalmente, em uma abordagem, dois policiais se ocupam de uma pessoa, sendo que um faz a revista e outro dá cobertura para preservar a segurança do primeiro. “Se o policial que estiver fazendo a segurança se posicionar incorretamente, corre o risco de atingir o parceiro, caso tenha que fazer uso da arma de fogo. Ainda, se o policial que estiver fazendo a busca pessoal não abotoar o coldre durante a revista, o abordado tem maior possibilidade de tomar sua arma”. Uma postura que saia dos padrões recomendados pelos procedimentos, portanto, causa mais insegurança à própria atividade policial que vantagens de qualquer tipo. Mais informações: (0**11) 9908-9850, com Tânia; e-mail taniapinc@uol.com.br. Pesquisa orientada por Leandro Piquet Carneiro.
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