O tema é recorrente, mas volto a ele por ser um assunto da maior importância. Uma política acertada nessa área pode melhorar e muito a vida de quem mora nas grandes capitais e cidades de médio porte. Outro dia, uma colega repórter fez uma matéria excelente sobre o assunto. Belo Horizonte foi o lugar onde a Simone Pio conversou com vários deles. Das sonoras (foi uma reportagem para TV) surgiram verdades incômodas, como o preconceito: "Não gosto do modo como as pessoas olham para mim quando estou fazendo a comida. É numa lata, e elas quando passam fazem cara de nojo". Necessário registrar que esse mendigo "mora" no bairro Lagoinha - que fica próximo ao centro e tem fama de zona boêmia decadente. A prefeitura tem programas de recuperação em andamento, mas o rapaz e outros pedintes costumam dormir debaixo da marquise de um galpão vazio em frente ao Departamento de Investigações da Polícia Civil. Não é competência da Polícia Civil resolver, mas convenhamos que é muito desagradável e, de certa forma, expõe a inoperância do poder público diante da miséria. Bom, voltando à reportagem da Simone, logo depois ela pára algumas pessoas na calçada e faz a todas a mesma pergunta: se elas têm medo da população de rua. A maioria disse sim, que tem medo, mas sem saber explicar claramente por quê. Detalhe a acrescentar: nunca presenciei, e sei que não costumam acontecer muitos casos de agressões, assaltos e outros pequenos delitos praticados por moradores de rua. Não falo de pivetes. Mas de homens, mulheres e crianças que todos os dias chegam às grandes cidades em busca de oportunidades ou simplesmente por desespero. Na mesma reportagem, uma assistente social diz que a maioria absoluta das pessoas que vai para os albergues de BH vem de cidades próximas, inclusive da região metropolitana. É muito comum no Brasil estimular essas famílias a voltar para o lugar de origem. Acho que se a pessoa quiser, tudo bem, mas se o sujeito faz uma viagem dessas justamente porque não conseguiu trabalho no interior, quem garante que agora ele vai arranjar? E depois, mandar o pessoal de volta não deixa de ser uma forma de transferir o problema. Não seria melhor criar frentes de trabalho nas cidades de destino? Além de resolver a necessidade imediata, seria possível melhorar a vida do sujeito a médio e longo prazo com a capacitação profissional de nível técnico. Parte dessa mão-de-obra poderia ser usada em obras públicas. E se houvesse parceiros da iniciativa privada, ainda mais vagas seriam criadas. As mulheres também poderiam aprender uma profissão. E as crianças iriam para a escola, naturalmente. Em vez de albergues, erguer-se-iam conjuntos habitacionais. E em vez de comer e dormir na rua, eles poderiam ir para casa. Longe da violência a que eles, sim, estão expostos. É mais comum do que se pensa. Quase todo dia aparece morador de rua agredido na ronda policial. Quem não se lembra do índio queimado em Brasília? Nota do Editor: Marcos Alves é jornalista.
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