Certos órgãos públicos serviriam muito melhor ao público se, simplesmente, fossem extintos! A Lei nº 11.502, de 11 de julho de 2007, modifica as competências e a estrutura organizacional da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação. Para o ministro da área, o instrumento legal cria uma “Nova Capes”, que subsidiará o MEC “na formulação de políticas e no desenvolvimento de atividades de suporte à formação de profissionais de magistério para a educação básica e superior e para o desenvolvimento científico e tecnológico do país”. O que Sua Excelência omite é que, para exercer as “novas” funções, que conferem ainda mais poder aos burocratas, a “nova” Capes recebe de presente, na bandeja das nomeações, mais 410 cargos de assistentes e analistas “em Ciência e Tecnologia”, além de 52 cargos adicionais em comissão (DAS), que não exigem concurso para preenchimento. É o estilo PT de gerir, segundo o qual “mais sempre é preferível a menos, quando se trata de preencher cargos públicos com companheiros”, não importando o bolso do contribuinte e nem preceitos morais e éticos. Segundo apregoam, a presente inchação destina-se a “induzir e fomentar a formação inicial e continuada de profissionais de magistério”. Ora, a própria Secretaria de Educação Superior do MEC, responsável pela regulação, supervisão e avaliação das 2.460 IES do sistema, com mais de 4 milhões e meio de alunos, dispõe de apenas 72 DAS e nenhum assistente ou analista com formação específica para a supervisão do ensino de graduação. Portanto, é injustificável que a Capes, que supervisiona 2.452 programas de mestrado e doutorado, com cerca de 130 mil alunos, mesmo com a ampliação absurda de suas funções, infle mais ainda a sua estrutura. O Brasil ocupa desonroso lugar nos índices de realização tecnológica computados pela ONU, atrás de países que, em termos de capacidade instalada para a produção científico-tecnológica, são claramente inferiores. A má colocação brasileira reflete diversos vícios, como a falta de integração dos órgãos de fomento à pesquisa, a ineficácia dos incentivos à pesquisa e desenvolvimento, o baixo investimento nas áreas de inovação e, obviamente, a própria Capes - por si só, um hino aos controles burocráticos e ao desperdício. Nessa débâcle, a fundação responsável por mais da metade das bolsas de pós-graduação no país e pela avaliação da pós-graduação stricto sensu, vem servindo mais, na esbórnia a que se dá o nome de “governo do PT”, como um instrumento de aprofundamento de nosso vergonhoso atraso. A política que aplica nas avaliações dos cursos é centralizadora, ultrapassada, ineficaz, mecânica e desprovida de inteligência e induz os pesquisadores de nossas universidades a preocuparem-se mais em publicar seus artigos “acadêmicos” – que nem sempre são de fato acadêmicos -, para que a sua instituição alcance uma boa nota na avaliação trienal, do que em produzir ciência e tecnologia com resultados positivos para o país. É um erro crasso prestigiar mais os papers acadêmicos - que, muitas vezes, são publicados em revistas “científicas” irrelevantes -, do que pesquisas que possam resultar em inovações tecnológicas, patentes industriais e geração de riqueza material e intelectual para o Brasil. É a política do paper acadêmico pelo paper acadêmico, sem qualquer preocupação quanto à eficácia dos resultados, em que o artigo publicado não é mera conseqüência, mas o fim próprio da pesquisa: não é o cavalo que sacode o rabo, mas o rabo que balança o cavalo... O objetivo, adulterado, passa a ser o de publicar a qualquer custo, inclusive ao imenso custo do esbanjamento de recursos escassos, em um país pobre. Os “sábios” selecionados pela Capes, que avaliam o pesquisador, interessam-se somente em anotar em que publicação os resultados das pretensas pesquisas foram divulgados; nem cogitam entrar no mérito da qualidade nem avaliar a relevância da mesma para a economia do país. Nas áreas das ciências exatas, por exemplo, na matemática, na física e outras, um dos principais e legítimos objetivos do pesquisador é ver a sua teoria, teorema, fórmula ou equação ser reconhecida no meio científico-acadêmico, o que conseguirá se a sua teoria for aceita para publicação em uma revista ou periódico científico comprovadamente reconhecido na área. É assim que a ciência costuma avançar. Porém, a política desastrosa atualmente aplicada pela Capes está, aos poucos, transformando inexoravelmente os docentes desses cursos de pós-graduação em multidões de teóricos sem compromissos práticos, absolutamente desligados do mundo real. De que vale para o país um pesquisador universitário diplomado em engenharia e com doutorado no exterior – pago com recursos públicos -, se a sua principal preocupação como docente e pesquisador é basicamente quanto à cobrança que lhe será feita em termos do número de artigos acadêmicos publicados? Como nas áreas tecnológicas, dependendo da qualidade da revista, a publicação internacional costuma ser muito difícil e demorada, a “saída” encontrada pelos pesquisadores tupiniquins foi criar um montão de revistas nacionais, muitas delas com nomes em inglês - Brazilian Journal of Qualquer Coisa -, sem qualquer tradição e financiadas com dinheiro público, para onde enviam suas “contribuições para o avanço da ciência”. Quem entrar na Internet e observar os comitês editoriais de muitas dessas publicações que a Capes reputa como “científicas” perceberá que, com honrosas exceções, em sua grande parte são integrados por burocratas congênitos, irrelevantes no contexto científico-acadêmico da sua própria área de atuação, mas politicamente “engajados”. Muitos deles são docentes “pesquisadores” que poucas aulas ministram em suas universidades, o que lhes dá bastante tempo para participar de longas reuniões em Brasília, onde, como consultores da Capes, além de aumentarem os proventos, ajudam a formular, votar e pôr em prática a sua nefasta política de avaliação dos cursos de pós-graduação. Países que obtiveram êxito na educação, como a Coréia, o Japão e outros, para não citarmos os europeus, os Estados Unidos e – perdoai-me, esquerdistas, o Chile! - também exigem de seus físicos e engenheiros pesquisadores universitários contribuições intelectuais teóricas, divulgadas por meio de artigos científicos publicados em revistas e periódicos realmente consagrados, mas valorizam o compromisso desses profissionais com o mundo real. A pesquisa que resultou em uma patente industrial, ou em um novo processo industrial, ou que ajudou a resolver um problema prático de uma empresa privada ou pública, vale tantos ou mais pontos do que o artigo acadêmico publicado que simplesmente divulga uma idéia. Em alguns desses países, o governo não gasta tanto em educação quanto o Brasil e o pesquisador não tem emprego vitalício como em nossas instituições federais de ensino superior. Ele tem que produzir, não somente artigos acadêmicos, mas resultados práticos que financiem as pesquisas e, muitas vezes, seus próprios salários. A Capes – e, por extensão, o Ministério da Educação, as 27 secretarias estaduais e as mais de 5.560 municipais - se não existissem, fariam mais bem à educação “deste país”. Apesar do viés pretensamente acadêmico de suas políticas, o leitor pode, em sã consciência, arriscar-se a dizer quando um brasileiro ganhará o prêmio Nobel na área tecnológica? O problema de nosso sistema educacional não é de falta de verbas, mas de excesso de verbos por parte do exército de pedagogos de gabinete, muitos dos quais jamais puseram os pés em uma sala de aula como docentes e cujos discursos podem enganar a quem não está habituado a pensar, mas que ocultam uma visão equivocada da arte de educar: centralizadora, intervencionista, burocrática e ideologicamente enviesada. Nota do Editor: Ubiratan Iorio (www.ubirataniorio.org) é Doutor em Economia pela EPGE/FGV. Diretor da Faculdade de Ciências Econômicas da UERJ (2000/2003), Vice-Diretor da FCE/UERJ (1996/1999), Professor Adjunto do Departamento de Análise Econômica da FCE/UERJ, Professor do Mestrado da Faculdade de Economia e Finanças do IBMEC, Professor dos Cursos Especiais (MBA) da Fundação Getulio Vargas e da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Coordenador da Faculdade de Economia e Finanças do IBMEC (1995/1998), Pesquisador do IBMEC (1982/1994), Economista do IBRE/FGV (1973/1982). Presidente-Executivo do Centro Interdisciplinar de Ética e Economia Personalista (CIEEP). Diretor-Presidente da ITC - IORIO TREINAMENTO E CONSULTORIA.
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