Dos acontecimentos potencialmente ruins, que acertam em cheio a identidade, ninguém está imune. Manchetes e notícias desta semana sobre a Mattel, marca global de brinquedos, são exemplos de que não há vacina. O alerta: milhões de crianças tinham nas mãos brinquedos Mattel cuja tinta tem excesso de chumbo e ou risco de uma peça, um imã, se desprender do brinquedo. É chumbo quente para qualquer imagem e reputação: criancinhas, direta e potencialmente, afetadas por uma marca, que terceiriza sua produção na China, que se mostrou ilimitadamente gananciosa e sem o mínimo controle de qualidade. É chumbo grosso, mesmo para a dona da célebre e versátil boneca Barbie e seus acessórios profissionais e sentimentais, a mais vendida do mundo. Calcula-se que, enquanto você leu estas linhas, mais de 60 barbies foram vendidas em todo o mundo, numa estimativa citada por Frédéric Beigbeder em seu livro Barbie. Juntar a voracidade pelo lucro a péssimos fornecedores "Made in China" é certeza de uma crise com a opinião pública e a vigilância, necessária, dos consumidores, organizações não-governamentais, principalmente as de defesa dos consumidores, pela imprensa mundial, por autoridades de dezenas de países, nos quais produtos Mattel são distribuídos. No Brasil, os produtos da empresa, entre eles Barbie, Polly, Batman e Superman, estão sendo recolhidos pela empresa e a Mattel foi proibida pelo governo, desde o dia 17 de agosto, de importar brinquedos. A empresa por um problema no âmbito de sua competência - no mínimo fazer seus produtos dentro das regras de segurança e saúde pública - perdeu a sua legalidade e foi impedida temporariamente de operar no Brasil. Mas, potencialmente, pode perder a legitimidade e o respeito do público e da sociedade. Legitimidade é uma conquista cotidiana junto ao mercado por uma organização que trabalha sua cultura e sua identidade. Uma empresa umbilicalmente pertencente ao universo infantil deve ser como uma mãe: protetora, detalhista, cuidadosa no universo do lar. Além disso, deve estar simbolicamente inserida na casa, na qual nem seus moradores têm permissão de entrar com os pés sujos. Os brasileiros fazem uma distinção muito clara entre a rua e a casa, como destaca o antropólogo Roberto DaMatta. Na casa japonesa, não se entra sem tirar os sapatos. Em resumo, a empresa rompeu com os atributos de sua identidade. E, com isso, arrebentou com a confiança de seus consumidores. Fica a pergunta-chave: hoje, você daria de presente um brinquedo Mattel? Nota do Editor: Paulo Nassar é professor da Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Diretor-presidente da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (ABERJE). Autor de inúmeros livros, entre eles O que é Comunicação Empresarial, A Comunicação da Pequena Empresa, e Tudo é Comunicação.
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