É lugar-comum pensar que tudo era melhor antes. O passado é sempre melhor do que o presente, porque agora você sabe mais ou menos como é o futuro dele. E o presente oferece constantemente a perspectiva aterradora de um futuro que jamais será conhecido e que você só conhecerá quando for tarde demais. Mas tento pensar nisso de uma forma mais serena, ponderando se de fato havia coisas melhores, por exemplo, 20 anos atrás. Havia. Hoje, por exemplo, lembrei do Jornal da Tosse, o antigo Record em Notícias, telejornal que ficou famoso pela idade avançada de sua equipe de comentaristas (daí o apelido). Eu raramente o via; ele era transmitido por volta do meio-dia, horário em que eu saía para a escola ou assistia a algum programa mais apropriado para minha idade. Mesmo com o horário e mesmo que você o visse antes de almoçar, o Jornal da Tosse dava muito sono. O tom de voz grave e monótono e a ausência de desentendimentos entre os comentaristas faziam pensar numa refeição fria e sem sal. Passados vinte anos, começo a perceber que havia valor na monotonia e na falta de tempero daquele noticiário, tanto que hoje ligo a TV na esperança de não ter surpresas nem sobressaltos. Na verdade o que cansa é a sensação de perseguir o destino. Ser pego de surpresa e ter sobressaltos significa que o destino está escapando pelas suas mãos. Nestes momentos você pode vê-lo correndo muitos metros adiante. * A melhor frase que conheço é "Não tenho novidades". É um sinal de que as coisas vão bem, de que você conduz sua rotina como melhor lhe convém. É possível planejar nessas circunstâncias, subir um degrau de cada vez, perceber que hoje você está um passo à frente de onde estava ontem, exatamente porque sabe onde estava ontem - conhecimento que só vêm com uma rotina livre de sustos. No fundo, o que se quer é isso: viver sem sustos. O Jornal da Tosse me deixa alguma saudade por isso. Havia nele a tranqüilidade que busco hoje. Que isso estivesse ligado à minha condição na época - criança raramente se preocupa com algo -, não reduz o valor que dou às coisas que dizem que o tempo na verdade passa mais devagar do que imaginamos e que os acontecimentos importantes não estão na TV.
Nota do Editor: Christian Rocha vive em Ilhabela, é arquiteto por formação, aikidoka por paixão e escritor por vocação. Seu "saite" é o Christian Rocha.
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