Quanto mais se globaliza o mundo, mas se interiorizam no lar as emoções que dantes eram buscadas nas praças. É o medo não-percebido por alguns, das diversas situações que o tempo presente apresenta em cada poste, já nem é mais em cada esquina. E não são o assaltante ou a violência do trânsito, apenas. É o pedinte que já não pede, mas nos obriga a ter a esmola que muitas das vezes não temos. É o vendedor de bugigangas, coisas inúteis em casa, que nos assedia, de forma chata, perturbadora. São as propagandas irritantes em panfletos, placas e carros de som. Enfim, é a cara feia dos que circulam, tão sisuda quanto a nossa. Ir à praça deixou de ser um lazer agradável, em que no percurso encontrávamos pessoas sorridentes, olhos que brilhavam por um papo gostoso. Era o lugar onde soltávamos as crianças para que ali queimassem as suas energias. Onde se podia ler um jornal sem a interrupção de chatos vendedores de picolé, pipoca, algodão doce, bom-bom caseiro, biscoitinho, brinquedo inflável, chaveirinhos e bolsinhas de Rebeldes paraguaias. Não que as pessoas não possam procurar uma atividade alternativa para ganhar o pão. Mas parece que os ambulantes se multiplicam que nem coelhos! Por tantas razões, quase tudo se faz dentro de casa. Até viajar pelo mundo se faz, agora, a partir de um computador provido de Internet. As pipocas já não mando buscá-la naquele simpático velhinho, que perguntava, sorridente e voz tranqüila: "com manteiga ou se manteiga?" Ele morreu. Em seu lugar, há outro pipoqueiro, que assim se expressa: "Fala Bicho!". Se bem que sou bicho homem. Mas o tratamento já não é poético. E quem vai à praça quer poesia, não quer estresse. Corri o risco. Fui à praça com as crianças. Que bom, havia um palhaço de rua, de nariz vermelho, roupa toda colorida, um apito na boca e que contava piadas. Enfim, teria encontrado um pouco de poesia na praça moderna? Aproximei-me com as crianças e ficamos a prestar atenção no que dizia. Afinal, a grande graça dos palhaços está em suas falas desconexas, e nas perguntas e respostas estapafúrdias. A praça novamente me machucou. As piadas que o palhaço contava eu as ouvia nas rodas de bar, sem a presença das crianças. Há falta de bom-senso, das pessoas, dos ambulantes, e até dos palhaços, que já não são puros como era o "Arrelia" e como ainda é o "Carequinha". Até os palhaços do circo não são mais os mesmos. Querem o riso da platéia à custa de piadas obscenas e gestos não condizentes com a platéia infantil. E depois fazem campanhas: "não deixe o circo morrer". O que está matando o circo é má qualidade do espetáculo. E, por esta razão, sempre com um largo sorriso, a minha caçulinha tem a rotina de me pedir: "pai, faz uma palhaçada para gente rir". Declino da posição de jornalista, de homem sério, visto velhas roupas largas, pinto, com batom vermelho, meu nariz, calço aquele velho sapato furado e, com voz nasal de palhaço, apresento o espetáculo: "senhooooras e senhooores, chegou o Gran-circo...". E o coro doméstico acompanha: "E o papai o que é? É o palhaço do lar... E o papai o que é? É o palhaço do lar..." Nota do Editor: Seu Pedro é o jornalista Pedro Diedrichs, 59 anos, editor do jornal Vanguarda, Guanambi (Bahia), poeta, escritor, contista, e humorista, tem o título de "Jornalista do Sertão".
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