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Crônicas
19/10/2007 - 11h01
Os heróis da resistência
Gabriela Cuzzuol
 

Ela era matemática. Bacharel. Fez aquela faculdade difícil, pela qual ninguém passa sem sofrer. Cálculos, estatísticas, experimentos de docentes que vivem para comprovar algo. E este algo nem sempre interessa assim, tanto.

Na época da faculdade, secou, era comum que a víssemos abatida, o cansaço a saltar-lhe os olhos.

Aí passou. A formatura, paga em várias vezes, a realização da mãe, a admiração da família do namorado. E veio o aumento. Agora seriam novecentos reais. E ainda havia o vale transporte. Refeição não, afinal em cada escola o turno era apenas de seis horas. Na hora de preencher o cadastro, não colocou que eram três as escolas. Pra que? Não dariam mesmo o vale-transporte. Isso é responsabilidade de cada instituição. Talvez cada uma pudesse entrar com trinta por cento dos vales, ou dez por mês. Nem pensou sobre o assunto, já sabia como funcionava. Trabalhava no ensino público desde o tempo de estudante.

Nunca reclamou. Nunca deu um suspiro. Continuou a tomar dois ônibus pra ir, dois pra voltar, em três turnos.

Fez pós-graduação em economia. Agora já poderia enviar currículos aos bancos. Teve vontade, passar com novecentos contos estava cada vez mais duro. Se inscreveu.

Foi morar com o namorado, já que a grana não dava pra casar. No momento, não era assim tão importante. Agora era aluguel, água, luz, mas enfim havia o vale-refeição, que ajudava. Depois da pós, passou a ganhar mil e cento e quarenta e três reais e setenta e dois centavos, com os descontos. Ao todo, lhe sobravam mil. Até que no contexto, deu uma ajuda.

Além de matemática, bacharel e pós-graduada, era uma bela moça. De grandes olhos azuis e rosto de quem decididamente não vivia com novecentos reais. A aparência contribuiria para a vaga no banco, afinal bancos costumam pedir boa aparência.

Saiu o edital. Ela se inscreveu, fez os testes, passou. O namorado ficou feliz, jantaram juntos, ele a convidou para ir a um restaurante caro. O primeiro degrau de uma escada, que enfim começavam a subir; o começo da vida melhor que eles tanto mereciam.

No dia de se despedir de seus alunos, falhou. Pela primeira, constatou que a sala de aula era sua única possibilidade de realização. Ali transformava o mundo em um lugar infinitamente melhor. E para ela, aquilo bastava.

“Um país que desrespeita seus professores nunca saberá o país que é.”


Nota do Editor: Gabriela Cuzzuol é jornalista, professora de literatura e pós-graduanda em Jornalismo Cultural pela PUC-SP.

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