O futebol de final de semana é praticamente uma instituição no Brasil. Aliás, é tão institucionalizado que movimenta um lucrativo mercado. Há no País um número considerável de locais nos quais campeonatos de futebol de campo ou de salão amadores são formados por grupos de amigos. Nada mais normal. O que há de mal em eliminar o estresse de uma semana inteira com uma partida - ou para os que preferirem, a famosa "pelada" - no domingão? Quando organizado com os amigos do trabalho então, o jogo do horário de folga acaba virando assunto do expediente e ajuda até a melhorar o relacionamento na equipe. Visto por esse ângulo o futebol cumpre uma função de suma importância em nossa comunidade. Além de melhorar as relações sociais, contribui com o desempenho físico de seus praticantes por se tratar de um esporte saudável e muito cultuado. Porém, há de se observar dois importantes aspectos que, quando ignorados, tendem a transformar o lazer em dor de cabeça. O primeiro deles tem a ver diretamente com a preparação física. Não raro, muitos dos praticantes vão ao trabalho de carro ou transporte coletivo durante a semana, passam o tempo inteiro sentados e realizam pouca ou nenhuma atividade física nos dias úteis. Quando chega o final de semana, querem "tirar o atraso". Com isso, "forçam" os músculos a suportar uma carga de atividade para a qual não estão preparados. Aí acontecem lesões que podem tirar o atleta de vez dos campos ou quadras. Outro aspecto é que, em muitas dessas reuniões, o futebol vem seguido do churrasco e da cerveja. O grande problema é que muitos, quando entram para jogar, já ingeriram certa quantidade de bebida alcoólica. E isso é muito grave. O álcool prejudica em muito a percepção espacial e os reflexos das pessoas. Assim como na direção de automóveis, as conseqüências da relação do álcool com o esporte podem ser extremamente desagradáveis. Ainda mais quando entre os participantes há aquele sujeito que, embora amigo de todos, sempre entra em campo como se disputasse uma final de copa do mundo no Maracanã (imagine quanta gente está antecipando a Copa de 2014 nesse momento!). Esse tende a ser um dos mais "perigosos" adversários. Ele não vai pensar duas vezes em usar os populares artifícios das "botinadas" e "encontrões" para impedir um gol. Sua filosofia no futebol geralmente é de que "se a bola passar, o jogador não passa!". E se o jogador estiver sob o efeito do álcool, coitado dele! Só para se ter uma idéia, um estudo da Universidade de Minnesota (Minneapolis, E.U.A) realizado com jogadores de futebol profissionais federados à National Collegiate Athletic Association (NCAA) indicou que o contato entre os atletas - o famoso "encontrão", citado à pouco - representa o principal mecanismo de lesão durante o jogo. O mesmo levantamento apontou que mais de dois terços das lesões no futebol masculino ocorrem nos membros inferiores, principalmente tornozelo e joelhos. Há também uma série de estudos científicos realizados por centros de referência em diversos países que comprovam que a incidência de lesões no futebol pode ser reduzida por meio de programas de prevenção. Até a própria Federação Internacional de Futebol (FIFA) lançou o seu. Batizado como "Os 11" e desenvolvido pelo centro médico da instituição, o F-MARC, em cooperação com especialistas internacionais, o programa compreende dez exercícios práticos e um que promove a boa prática esportiva, o famoso "fair play". O programa é de fácil memorização e deve ser realizado sempre após aquecimento e alongamento. Os exercícios visam o fortalecimento de vários grupos musculares, melhora da coordenação, equilíbrio e técnica e potência de salto. Para quem tiver curiosidade, o material está disponibilizado para download. Vale considerar, porém que, embora contribua muito, o programa não é a resposta para todos os males. Ele foi desenvolvido para jogadores profissionais que contam com o suporte técnico dos times para os quais jogam. Toda atividade física deve ser feita sob a orientação de profissionais especializados e precedidos de uma avaliação física minuciosa. Para quem não tem muito tempo para exercícios durante a semana, fica a dica de "separar" 15 ou 20 minutos diários para seções de aquecimento e alongamento. Essa prática já contribui muito para que, no final de semana, seus músculos não sintam excesso pela carga de atividade que lhes será imposta e não lhe cobrem com a dor resultante disto. Também vale considerar que é muito relevante fazer com que cada participante do jogo - sobretudo o amigo "artilheiro" que citamos - tome conhecimento do 11º item do programa da FIFA, indicado "...para o bem do jogo e saúde dos atletas". Afinal, como diz o próprio documento: "a maioria das lesões no futebol é causada por faltas, tanto que a observância às Regras do Jogo e, especialmente, o Jogo Limpo ("Fair Play") é essencial para prevenir lesões". Nota do Editor: Ari Zekcer (www.arizekcer.com.br) é especialista em medicina desportiva e cirurgia de joelho pela EPM - UNIFESP, diretor da Zekcer Sports Medicine, coordenador da equipe de ortopedia do Hospital São Luiz (SP), membro efetivo de entidades como Sociedade Brasileira de Cirurgia de Joelho (SBCJ), Sociedade Paulista de Medicina Desportiva (SPAMDE) e International Society of Atrhroscopy, Knee Surgery and Orthopaedic Sports Medicine (ISAKOS).
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