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Opinião
10/12/2007 - 05h29
O Judiciário e um desafio para 2008
Leonel Martins Bispo
 

O Poder Judiciário é um dos pilares do Estado contemporâneo. Várias são as razões capazes de demonstrar isto. De fato, a sociedade atual é composta por indivíduos possuidores de diferentes concepções de mundo, o que acarreta a eleição de distintos projetos de vida. Daí, mostra-se natural que estas pessoas, ao buscarem escrever seus destinos, apresentem anseios não harmônicos entre si. Em muitas oportunidades, o que se constata são autênticos conflitos de interesses que, para não inviabilizarem a convivência em sociedade, precisam ser equacionados. Ao Poder Judiciário compete esta missão tão especial que, não por acaso, colabora sensivelmente para a construção da chamada paz social.

Por outro lado, ao desfazer um conflito, o Judiciário vai além da pacificação de uma contenda específica, envolvendo partes identificadas. Assim o é porque, ao decidir, a Justiça examina os argumentos expostos e defendidos pelas partes interessadas e empresta às normas jurídicas a interpretação que entende ser a correta. Com a reiteração das decisões num dado sentido, indivíduos, empresas e o próprio Estado passam a ter como caminho a ser trilhado aquele apontado pelos pronunciamentos judiciais. Para tanto, não é imprescindível que se faça parte dos processos nos quais foram proferidas as decisões reiteradas, bastando o enquadramento na situação em relação a qual aconteceram as manifestações judiciais.

Acima de debates quanto à precisão ou não das direções apontadas, fato é que devem ser consideradas quando da adoção, pelos particulares e pelo Estado, de suas condutas, de suas ações. Neste sentido, no contexto da sociedade e do Estado, a função do Judiciário, uma vez exercida, influencia decisivamente no planejamento dos agentes particulares e públicos.

Entretanto, a partir do instante em que os mesmos Tribunais que há pouco decidiam num sentido passam a apontar uma direção oposta (e algumas vezes sem maiores explicações para a alteração de rota), tem-se que se enfraquece muito ou até mesmo desaparece o relevante aspecto orientador daquelas manifestações oficiais, cedendo espaço à instabilidade no seio social. E mais, quando as modificações de entendimento ocorrem com efeitos retroativos, alcançando, pois, aquelas condutas lastreadas na interpretação anterior (e recém alterada), constata-se a quebra da confiança na capacidade das decisões judiciais de resguardarem condutas que a elas se ajustem.

Este delicado contexto tem sido pontuado por vários casos com repercussões concretas para a sociedade. Para que se comprove o afirmado, pode-se analisar as relações tributárias, que se mostram um dos campos mais férteis quando se trata do presente assunto. Como ilustração, lembra-se que, em 2002, o Supremo Tribunal Federal decidira que as empresas possuíam direito à manutenção dos créditos de IPI, decorrentes das aquisições tributadas por este imposto, mesmo em face de saídas (vendas) tributadas à alíquota zero (algo que, em termos práticos, importa no não pagamento deste tributo nas operações de venda). A mais Alta Corte do País enfim se pronunciara sobre o tema, circunstância que incutiu no espírito das empresas que, se agissem de acordo com aquela decisão, estariam respaldadas. Todavia, cerca de dois anos depois, esta interpretação foi alterada por aquele ilustre Tribunal. Assim, os tantos contribuintes de boa-fé, que pautaram suas condutas na confiança depositada na decisão de 2002, foram surpreendidos e se encontram em situação delicada. Mais exemplos poderiam ser pinçados de decisões proferidas por outros importantes Tribunais, porém, como ao Supremo Tribunal Federal foi atribuída a missão de, em derradeira instância, interpretar o direito pátrio, fica-se, por todos, com o caso citado.

Oportuno mencionar que esta instabilidade lança seus efeitos nos mais variados terrenos. Realmente, a título de exemplo, pode ser anotado que um dos aspectos avaliados por investidores estrangeiros ao decidirem estrategicamente em que mercados aportarão seus recursos é justamente a estabilidade jurídica oferecida pelos Estados. Em Países nos quais não existe tal estabilidade, são mais escassos os investimentos de longo prazo, já que, por serem os que exigem maior tempo de maturação para se transformarem em retorno, ficam mais sujeitos a sofrerem os impactos da insegurança jurídica.

Por justiça, não se pode deixar de reconhecer que vozes, inclusive de membros do Poder Judiciário, têm se levantado com o intuito de se viabilizar uma discussão mais ampla sobre este tema, cuja relevância não se pode contestar. O próprio Supremo Tribunal Federal já examinou, quanto ao referido caso do IPI alíquota zero, a possibilidade de modulação de efeitos de sua alteração de entendimento. Contudo, não se construiu uma diretriz que se possa utilizar como parâmetro tranqüilizador para a sociedade, considerando a probabilidade de repetição de situações como esta, ensejadas por mudanças de interpretação. Há de se ter em mente que, como mencionado acima, não é preciso que um indivíduo tenha um processo (seu) julgado pelo Supremo para sustentar suas ações naquilo que a Corte Máxima manifesta. Daí, revela-se de todo adequado existir certo grau de previsibilidade quanto ao que possa acontecer na hipótese de alteração da interpretação pelo Tribunal.

O assunto, enfim, é demasiado complexo, mas é chegada a hora de se refletir detida e corajosamente a seu respeito. No próximo ano, o Supremo Tribunal Federal, decerto, terá oportunidades para se pronunciar de maneira mais profunda sobre este estado de coisas, pois se encontram aguardando apreciação temas já examinados no passado, mas que foram novamente conduzidos àquele Tribunal. Caso se evolua concretamente no que tange à preservação do viés orientador das decisões judiciais, tendo em vista sua relevância estruturante para a ordem jurídica, o ano de 2008 já será marcado por um considerável, aguardado e necessário avanço no sistema jurídico brasileiro.


Nota do Editor: Leonel Martins Bispo é sócio/advogado da Pactum Consultoria Empresarial.

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