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Crônicas
25/12/2007 - 14h14
Afinal, é Natal!
Tito Moreira
 

Como era de praxe, semanas antes do Natal, Ana sempre dava uma geral nos armários da casa. Nessa manhã chuvosa, começou pelo guarda-roupas tão precisado de arrumação. Antes, colocou no aparelho de som um CD de música natalina pra entrar no clima. Sobre o criado-mudo, uma xícara de café fumegante pra bebericar o líquido pra não perder a concentração.

Enquanto retirava peças de roupas das prateleiras, ia pensando por que nunca usou determinada blusa. Com certeza foi comprada num daqueles impulsos femininos.

De repente, seus olhos param diante de um lenço branco quase que escondido no fundo da prateleira. Quase cai do banquinho que completava sua altura para atingir as prateleiras mais altas. Suas mãos, indecisas, parecem temer tocar a peça. Pra que reviver o passado, mas como num filme, todo um cenário vem à tona.

Lembrou-se do passado com tanta exatidão que seu corpo sentia todo o calor daquele verão senegalês de um ano atrás. Foi quando ela, e o namorado Marcos, faziam compras de Natal no centro do Rio. Ele, impaciente, como todos os homens arredios nessas horas, reclamava que estava suando feito um animal. Realmente o calor estava demais, até pra ela. Sem contar na multidão que disputava presentes de última hora, e na correria das vendedoras se desdobrando em várias para garantir boas comissões. Além disso, os ambulantes produziam uma gritaria, fazendo das calçadas seu lugar legítimo. Afinal, era Natal! Ana pediu para Marcos esperar um pouquinho. Ele relutou, mas ela lascou um beijo cinematográfico, ali, no meio da multidão e sumiu.

Voltou em minutos com um pequeno embrulho nas mãos, oferecendo-lhe. Surpreso, perguntou o que era.
- Um presentinho antecipado pra você manter a paciência. Afinal, é Natal, meu querido!
- Abra logo, disse ela jovialmente.

Marcos desatou o nó da fita azul e dentro da caixinha da mesma cor encontrou um lenço branco. A delicadeza do gesto da namorada tocou fundo o coração do moço. Sentiu vergonha de ter reclamado o tempo todo de tudo. Desde a falta de lugar pra estacionar o carro, a multidão irritante, e, claro, do calor insuportável. Achou que tinha agido como um menino mimado. Ana percebeu o momento e abraçou o homem ternamente, no que foi correspondida.
- Obrigado - sussurrou nos ouvidos de Ana. Ela sentiu que o suor dele deslizou sobre o ombro direito dela.

Mas quando se puseram frente a frente, viu que Marcos estava chorando. Não um choro compulsivo, apenas lágrimas de contentamento deslizavam pela face dele.
- O que foi? - perguntou com ternura.
- Nada, não. Vi o quanto você se preocupa comigo e eu sempre tão ranzinza.
- Ora, comprei o lenço pra você enxugar o suor, foi só isso.
- Não, que se dane o suor. Esse lenço me foi dado pra enxugar lágrimas de felicidade, como as desse momento. Você me faz muito feliz, nos pequenos e grandes gestos. E eu a amo!

Naquele momento, ambos sentiram que de fato foram feitos um pro outro. Já não sentiam o calor. Iam de loja em loja, rindo, tagarelando, como crianças em busca do presente perfeito. E quem reparava no amor daquele casal sentia uma pontinha de inveja.

O CD natalino chega ao final despertando a moça das lembranças. O café, intocado, esfria. Ana desce do banquinho, senta-se aos pés da cama ainda segurando o lenço branco, e chora. Um choro que vai passando de lento para culminar em soluços. Chora toda dor dos corações despedaçados pela traição. Pelo amor que foi embora sem um adeus. Chora por ter pensado que a ferida já havia se cicatrizado. Leva o lenço branco ao rosto, que outrora enxugou lágrimas de felicidade, e agora não mais.

Lá fora a chuva continua. Reinicia a música natalina, afinal é Natal!


Nota do Editor: Tito Moreira é jornalista.

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