Qual a natureza da grande maioria dos homicídios no Brasil?
É fundamental que a mídia e a sociedade questionem informações como as contidas no "Mapa da Violência", recém-divulgado pelo Governo Federal. Afinal, é necessário que as autoridades competentes difundam informações de modo transparente e confiável, em especial no tocante a temas prioritários quanto à preocupação dos cidadãos, como é o caso da segurança pública. Cabe esclarecer se os 46.653 homicídios ocorridos em 2006, segundo os dados divulgados, correspondem à realidade. Estariam mesmo os números subestimados pela prática equivocada de IMLs (Institutos Médicos Legais), peritos e policiais cadastrarem o item "mortes a esclarecer" como "intenção indeterminada"? Haveria o "dolo" político de reduzir na base da "canetada" o número de homicídios, maquiando-se as estatísticas de modo favorável aos governos de plantão? Como demonstrou a mídia, estudiosos consideram aceitável um índice de "intenção indeterminada" para as mortes de causa externa de até 5% do total. No Brasil, essa taxa, desde 1996, jamais foi inferior a 8%. Assim, torna-se difícil aquilatar a precisão dos dados contidos no relatório ("2003 para 2004, houve uma queda de 5,3% no número de homicídios por arma de fogo; de 2004 para 2005, 2,8%; e, em 2006, 1,8%"). Se considerarmos a margem de erro delimitada pelos 8% de "causas indeterminadas", todos os demais números já estariam sob dúvida. Como se vê, estamos em meio a uma discussão tão pertinente quanto complexa. Sem tirar o mérito desse debate, é necessário refletir sobre um aspecto talvez ainda mais relevante do que as estatísticas, curva padrão e margem de erro do Mapa da Violência. É imprescindível conferir maior pragmatismo ao enfrentamento da violência. Isto significa responder de maneira objetiva à seguinte pergunta: qual a natureza da grande maioria dos homicídios no Brasil? A resposta, com certeza, não irá gerar polêmica alguma. Todos dirão: a criminalidade, expressa nos seqüestros, assaltos a bancos, residências e em vias públicas, roubos de carga, guerras entre gangues e quadrilhas de traficantes, "queimas" de arquivo do crime organizado. Desse modo, tivesse o país um sistema mais eficaz de segurança pública, menos impunidade e morosidade no Judiciário e meios mais eficientes de desarmar os criminosos, inclusive coibindo o contrabando e o comércio ilegal de armas, com certeza as estatísticas seriam muito menos preocupantes. Num cenário como esse, certamente não estaríamos discutindo se foram mesmo 46.660 os homicídios em 2006, sendo 74,4% deles praticados com armas de fogo, ou se tal número seria 8% maior ou menor. A verdade é que o Brasil tem tratado essa questão de maneira enviesada. Discutiu-se durante anos uma Lei de Controle de Armas, aprovada no Congresso Nacional, focada exclusivamente nos cidadãos de bem que, por distintas razões, têm necessidade de adquirir legalmente um revólver ou espingarda. Esqueceram, apenas, de informar as normas estabelecidas pela lei aos bandidos, assaltantes, traficantes, contrabandistas e a todos os criminosos que "constroem" as estatísticas dos homicídios com armas ilegais. Aqueles que - por ingenuidade ou inconfessáveis interesses - acreditam e defendem a tese de que é possível reduzir o número de homicídios desarmando os 15 milhões de brasileiros de bem que têm armas legais prestam desserviço muito maior do que um eventual erro estatístico. A resposta a esse equivocado pensamento foi dada com clareza numérica no referendo à Lei de Controle de Armas, no qual mais de 63 milhões de eleitores reiteraram a liberdade de adquirir uma arma, embora poucos tenham usufruído tal prerrogativa. Não satisfeitos, os defensores do insólito argumento buscam anular na prática o resultado do referendo, tornando quase inviável o recadastramento das armas legais, com prazos, preços e procedimentos absurdos. Enquanto isso, as armas ilegais, nas mãos de criminosos, continuam alimentando as estatísticas dos homicídios. Em sã consciência, ninguém pode negar, numa análise isenta e honesta, que os números de assassinatos seriam drasticamente menores no País se tivéssemos maior capacidade de desarmar e prender bandidos e menor preocupação com pessoas corretas que apenas precisam defender-se em situações extremas ou simplesmente treinar tiro ao alvo, como a equipe brasileira da modalidade que nos representará este ano na Olimpíada de Pequim. Nota do Editor: Bene Barbosa é bacharel em direito, especialista em armas e munições, presidente do Movimento Viva Brasil e um dos coordenadores da "Frente do NÃO" no referendo de 2005.
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