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Crônicas
28/03/2008 - 06h18
São Paulo
Fábio de Lima
 

Chegou o outono, estação das frutas. Aqui em São Paulo nem bom observador consegue perceber a diferença. Esta cidade só nos oferece cinza por onde a gente olha. O perfume do ar é fumaça. Frutas só nas feiras-livres e nos sacolões. Recentemente fui entrevistar um diretor de uma tradicional indústria alimentícia no bairro da Vila Carrão, Zona Leste da cidade. Ele me contou que nos anos 40 - época da fundação da empresa - tudo era terra e sossego na região. Vi uma foto da época e parecia uma cidade do interior do Brasil mesmo. Mas as coisas mudaram.

Outro dia sai do trabalho, no bairro do Alto da Lapa, Zona Oeste da cidade, para ir à casa de uma amiga no bairro do Sacomã, Zona Sul. Era final de tarde e chovia muito. Eu demorei 2h20 para chegar ao meu destino. Deu vontade de parar o carro e ir a pé tomando chuva mesmo. Não o fiz - até porque a cidade é muito violenta e o paulistano nunca sabe se é mais seguro andar de carro ou a pé. Na dúvida - continuei da forma que estava.

Um tempo atrás eu estava chegando em casa - na minha própria rua mesmo - e três moleques, aparentando terem uns 16 anos cada, me abordaram perguntando coisas desconexas e me ameaçando. Naquele momento pensei até que pudesse morrer sem entender absolutamente nada do que estava acontecendo. São Paulo é assim mesmo - boa parte das vezes a gente não entende esta cidade, apenas sobrevive nela.

Eu moro longe do trabalho e atravesso a cidade todos os dias. Vou através do trajeto observando as pessoas que andam pelas ruas e vejo poucos sorrisos nos rostos delas. Não estou dizendo que as pessoas não sorriem. Seria hipócrita da minha parte dizer isso - mas as pessoas estão mais carrancudas. O brasileiro está deixando de ser alegre como era antes. Bem, não quero ser leviano, o brasileiro não sei ao certo - mas o paulistano posso afirmar com toda a certeza. Os paulistanos estão frios como nunca estiveram.

Uns meses atrás eu estava sentado na mesa de um bar com um grupo de sete mineiros. Todos eles falavam que conheciam pessoas muito legais de São Paulo - mas também eram unânimes em dizer que em viagens à cidade depararam com uma frieza incomum das pessoas pelas ruas. Um brincava que jamais conseguiu pedir uma informação para alguém numa rua de São Paulo. Dizia que todos passavam por ele dizendo que estavam atrasados ou fazendo um sinal de não com o dedo. Ele dizia que não sabia o que aquele "não" queria dizer, já que ele não havia perguntado nada ainda.

Sabe, a cidade de São Paulo gostou do rótulo da cidade que não pára. Ela tem orgulho de ser uma das maiores do mundo. Eu penso que seria legal ser grande sim - desde que isso não a impedisse de ser organizada, mas as coisas aqui não são assim. Eu vivo numa cidade onde nada - absolutamente nada (nada mesmo) funciona corretamente. Em São Paulo os corações das pessoas já batem tão apressados que falta tempo para sentirem qualquer coisa.

Eu, às vezes, penso em ir embora daqui. Já pensei em ir para outra cidade - outro Estado e até outro País. Mas, ao mesmo tempo, na hora H, vou ficando por aqui mesmo. Não sei o motivo exato. Talvez ache que as pessoas que amo estejam em São Paulo e que não valeria a pena deixar essas pessoas para ir, sozinho, morar em outro lugar. Talvez não seja nada disso e apenas eu tenha receio do desconhecido. Até hoje não tenho a devida resposta e não sei se um dia a terei.

Para ser sincero com tudo e todos, não sei se amo São Paulo. Também não sei se odeio São Paulo. Amor e ódio sempre foram sentimentos muito próximos um do outro, para todo mundo. Eu só sei que vou enfrentando as Marginais congestionadas, diariamente. Eu só sei que vou caminhando pela Paulista, nas noites de semana. Eu só sei que gosto de ouvir o som dos pássaros, no Parque do Ibirapuera, aos domingos pela manhã. Eu só sei que minhas dúvidas e minhas certezas estiveram sempre nessa cidade e, talvez, por isso, eu nunca fui embora daqui.


Nota do Editor: Fábio de Lima é jornalista e escritor, ou "contador de histórias", como prefere ser chamado. Está escrevendo seu primeiro romance, DOCE DESESPERO, com publicação (ainda!) em data incerta.

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