09/09/2025  12h27
· Guia 2025     · O Guaruçá     · Cartões-postais     · Webmail     · Ubatuba            · · ·
O Guaruçá - Informação e Cultura
O GUARUÇÁ Índice d'O Guaruçá Colunistas SEÇÕES SERVIÇOS Biorritmo Busca n'O Guaruçá Expediente Home d'O Guaruçá
Acesso ao Sistema
Login
Senha

« Cadastro Gratuito »
SEÇÃO
Crônicas
06/04/2008 - 17h20
O Campeonato Paulista de cada um
André Falavigna
 

Sim, senhores. Estamos perto do final e pouca coisa está clara, ainda. Só se sabe que Guaratinguetá e Palmeiras estão classificados, que o Santos, dos grandes, é o único que já está fora (sei, a Portuguesa também) e que nenhum grande cairá (inclusive a Portuguesa, tá bom?). É muito pouca coisa. É impossível dizer, inclusive, em que posição as equipes que se classificarão irão terminar: as três primeiras podem, todas elas, acabar desde na liderança até na penúltima ou, no caso do São Paulo, última vaga. A Ponte Preta dos Literários Bondaczuk e Manjaterra, que briga pela quarta vaga, tem chances reais de abocanhar a terceira. Trata-se de uma zorra.

Por outro lado, nada disso me interessa, nesta crônica. É verdade que tudo isso é mais interessante do que o que me interessa, inclusive para mim, mas dane-se. Tenho ganas (andava louco para falar "tenho ganas") de fazê-los reparar em outra coisa.

Existem muitos campeonatos paulistas, e essa constatação chega a ser lugar-comum. Há o Campeonato Paulista dos pequenos clubes, equipes de aluguel encampadas por empresários. São times que vivem somente para esta época. Há o dos grandes carentes de vitória recentes. São os que mais lhe emprestam valor. Há o dos grandes em fase vitoriosa, que estão na Libertadores, mas que dele não conseguem abrir mão, inclusive, porque sem ele não conseguem se preparar para a Libertadores. E, sobretudo, porque o torneio acaba sempre por atirá-los em questões de honra. Há o Campeonato Paulista das rádios do interior que entram em festa para recebê-lo e o das rádios da Capital, divididas entre as que o aproveitam e as que são obrigadas, pela dura realidade da vida, a aturá-lo.

Opa.

Estamos chegando lá, não é mesmo? Porque o que torna essas rádios da Capital diferentes uma das outras é exatamente o campeonato paulista que cada uma resolve transmitir, e essa divisão é idêntica àquela que corta a crônica paulista em duas fatias primordiais: a dos panacas consumados e a dos sujeitos dos quais ainda se espera algo. Isso, isso mesmo. Eles, os panacas, são o nosso brinquedinho. De novo.

Há quem aposte todas as fichas numa idéia de "Um Outro Mundo Possível". Não, não estou satisfeito com o mundo como ele está, só não tenho pretensões de reformá-lo completamente antes mesmo de compreendê-lo minimamente. O que é o de menos. O de mais é a atitude sistemática, irrefletida, diante de cada detalhe da vida real como se a idéia geral que fazemos dela pudesse abarcá-la inteira, em cada detalhe que se oferece à nossa experiência. Funciona assim:

Alguém nos diz: olha, sou contra os campeonatos regionais, acho-os ultrapassados e deficitários, penso que são parte de uma estrutura que inibe a inserção dos grandes clubes brasileiros no cenário próspero e globalizado do futebol atual, pleno de possibilidades muito mais compensadoras, sob todos os ângulos, do que estas pelas quais temos teimosamente optado.

Muito bem. Está aí uma proposição que pode ser discutida, assimilada ou rejeitada total ou parcialmente; uma idéia sobre a qual se pode entrar numa discussão de meses, discussão cujo resultado deve render toda sorte de frutos, bons ou maus, conforme as escolhas que fizermos. Essa, digamos, posição diante da vida se refletirá, é inevitável, em todas as análises que seu adepto fizer e que demandem referências à estrutura sob as quais os fatos que se analisa venham a se acomodar.

Tudo isso está muito bem. O que não está nada bem é confundir as bolas, tentar enfiar o universo conhecido na medida de um sonho discutível. Muita gente pode se espantar com que vou dizer, mas pessoas das quais discordamos e pela quais sintamos aversão, inclusive sob o aspecto moral, são não raro capazes de fazer o trabalho delas muito melhor do que nós mesmos fazemos o nosso. Essa situação é tão mais comum, afora sua perfeita normalidade, quanto nosso trabalho consistir, ao menos em parte, em criticar a atividade daquelas pessoas. Desse modo, gostaria de dizer às Suas Eminências Reverendíssimas do jornalismo esportivo que Luxemburgo certamente sonegou impostos, participou de uma farsa quanto à própria idade e talvez seja mesmo cafona e meio prestidigitador, quiçá dado a negociações senão ilegais, quem sabe ilegítimas, mas isso não poderá, por nada neste mundo, transformá-lo em menos do que um excepcional treinador. Não importa quantas vezes vocês vilipendiem a gramática, a lógica e o bom senso estético tentando nos provar tamanha asneira, Luxemburgo já é parte de nossa história futebolística, e há muitas coisas ali das quais ninguém se envergonharia.

E tem mais: Muricy pode destratá-los quantas vezes lhe vier à veneta; se o faz injusta ou justamente, são outros quinhentos; o que importa é que nos primeiros quinhentos, aqueles que interessam, ele vai continuar entendendo mais de futebol do que todo o Conselho dos Altíssimos Indignados, reunido em plenário e fazendo a maior fuzarca. Leão, confusos o quanto sejam seus discursos e limitados o quantos sejam seus recursos, ainda se sai melhor dirigindo suas equipes, que é o fim do trabalho dele, do que boa parte de vocês acentuado as palavras, que é o começo do de vocês.

Espera lá, não acabou: não faço a menor idéia acerca de se Milton Neves tem contra si qualquer acusação séria sob o ponto de vista legal, não conheço suas amizades e delas nada posso dizer, não o conheço pessoalmente e nem sei se, de repente, o camarada tem mau hálito, zôo-pedofiliza animais silvestres sob proteção do IBAMA ou tira caca do nariz e depois a enfia na boca. E, querem saber? Dane-se, não é problema meu. Nem que se opte, um dia, por proibir a atividade de garoto-propaganda simultaneamente à de jornalista esportivo, bandeira levantada sempre com tanta timidez por seus melhores partidários que dela resta apenas a sensação de que não deve ser coisa muito urgente; nem assim Milton Neves perderia a voz, o tirocínio, o magnetismo de radialista que embala algo que já caminha para duas gerações; nem assim vocês seriam mais capazes de nos entreter contando boas histórias, nem assim vocês poderiam ser mais oportunamente, desprendidamente engraçados. Até para cafajestices ele se sai melhor do que seus críticos habituais, e uma única transmissão comandada por Neves, narrada por Silvério e comentada por Betting vale vinte, trinta, cem anos de tecnicismos vazios, paranóias gaguejadas e redação colegial.

Todos estes camaradas acima citados são sujeitos às críticas, é evidente. O que não é evidente é porque o técnico Luxemburgo deva ser decadente porque não pagou impostos, Muricy incompetente porque não tenha paciência com perguntas idiotas formuladas por gente que toma cafezinhos e come biscoitinhos enquanto ele se mata para treinar a equipe, que Leão seja perfeitamente inútil porque é grosso, ou seco, ou direto demais com gente falsa, oleosa ou indireta demais, ou devamos trocar Milton Neves por qualquer grajéia oleosa, molenga e nauseabunda só porque aquele venda fios e cabos elétricos, argamassa e cerveja sem nos obrigar a nada e esta nos venda a si mesma, jurando-nos que é pura como os santos da Santa Igreja e exigindo-nos subsunção muda.

Tal tom boboca nos enche há tempos, isso lá é. Mas, neste ano, certos setores de nossa cobertura futebolística têm atingindo os mais altos píncaros na arte de nos fazer perder tempo com esse curioso sibilo tartamudeado, com essa ladainha que tudo critica, tudo inveja, tudo aponta e nada vê. Trata-se dum pessoal que acredita que o mundo é dividido entre a Patota do Bem e a Gangue do Mal. Eventuais permutas nas escalações podem ser admitidas; quem ontem era bom hoje deve ser mau, o que antes parecia certo, agora se verifica errado desde a fundação dos tempos. Qualquer estranheza, não estranhe: somos imaculados, sempre nos enganam, vejam como os outros são maus e piores ficam diante de nossa pudicícia.

Reparem bem na idéia: quanto mais vezes você tiver passado por idiota, mais apto estará para meter o bedelho nas Disposições Gerais do Universo. Se fizer mal feito, melhor ainda. É a piada infernal. É a ditadura da demeritocracia. É mesmo o caso de mudar de assunto, para não se deixar contaminar pela morbidez dessa canalha.

Eu acho que dá Palmeiras, Guaratinguetá, São Paulo e Ponte Preta, nessa ordem.

E vocês?


Nota do Editor: André Falavigna é escritor, tendo publicado dezenas de contos e crônicas (sobretudo futebolísticas) na Web. Possui um blog pessoal, ofalavigna.blog.uol.com.br, no qual lança, periodicamente, capítulos de um romance. Colabora com diversas publicações eletrônicas.

PUBLICIDADE
ÚLTIMAS PUBLICAÇÕES SOBRE "CRÔNICAS"Índice das publicações sobre "CRÔNICAS"
31/12/2022 - 07h23 Enfim, `Arteado´!
30/12/2022 - 05h37 É pracabá
29/12/2022 - 06h33 Onde nascem os meus monstros
28/12/2022 - 06h39 Um Natal adulto
27/12/2022 - 07h36 Holy Night
26/12/2022 - 07h44 A vitória da Argentina
· FALE CONOSCO · ANUNCIE AQUI · TERMOS DE USO ·
Copyright © 1998-2025, UbaWeb. Direitos Reservados.