Cheguei de Istambul, Turquia, na terça-feira. E só penso naquilo, ou seja, como voltar para lá. Na verdade, no final de 15 dias de viagem, pulando de hotel em hotel, avião em avião, ônibus, balão, vans e restaurantes, arrumando e desarrumando malas com as roupas cada dia mais sujas, achava minha casa o melhor lugar do mundo. Até foi, por uns dois dias. Mas as contas a pagar, o ralo da pia entupido, um rato que cisma em fazer cocô no quintal, os telefonemas e recados sem resposta e outros choques da dura realidade estão me fazendo mudar de idéia. E o outro lado do mundo me parece cada vez mais maravilhoso.

A cidade é linda, cortada pelo Mar Bósforo, um mar de verdade, enquanto as outras do mundo mal e mal tem um rio mixuruca pelo meio, que se tiverem sorte, não está poluído. É imensa, caótica, confusa, o trânsito dá vontade de chorar, enfim, qualquer brasileiro habitué de uma grande metrópole não vai estranhar nada. Por outro lado é uma paz total, com os minaretes chamando os fiéis para rezar várias vezes ao dia - e sendo atendidos - a lua em cima do mar e as mesquitas com as silhuetas recortadas contra o horizonte infinito.

As pessoas são adoráveis, gentilíssimas, as mulheres de véu não olham de cara feia nem com ares moralistas para as que estão de cabeça descoberta. Uma informação pode ser conseguida em turco, a língua é turco, não árabe, claro que a gente não entende nada, mas o informante pode chegar a levá-la até o ponto de ônibus ou ao lugar onde você quer ir. Os moços são uns amores, paqueradores sem serem ofensivos nem preguentos, ninguém incomoda ninguém que não queira ser incomodado. E as meninas de véu umas gracinhas, apesar de não ser adereço obrigatório, tem também as tatuadas de cabelos cor-de-rosa que não gastaram aquela grana toda no telhado para não poder exibi-lo aos olhares mais curiosos.

A comida é o máximo, o drinque nacional é o ayran, um yogurte salgado muito do bom que casa direitinho com o carneiro, que para eles é carne de vaca. O som também é variado, apesar de se escutar aquela musiquinha dolente em todo canto, que segundo meu amigo Daniel parece ser coisa de quem prendeu o dedo na porta, tem rock, balada, o diabo. Vi uma apresentação de uma banda maravilhosa, dancei de me esbaldar. Quem quiser conferir pode tentar baixar na internet, o nome deles, pelo que pude me informar, é Gamil Katkos, seja lá o que isso queira dizer.

Aos que estiverem interessados em outro tipo de viagem, aconselho a tirar o cavalo, ou melhor, o pito da chuva. Aqueles narguilés que eles fumam nos bares têm é tabaco comum. Segundo me explicaram dois atores famosos do cenário nacional, que ficaram meus amigos no dia da apresentação da banda, haxixe é produto de exportação, o povo, mesmo a moçada, é bem careta, melhor não perguntar pelo artigo, pega mal. Eles quase não bebem, até se vêem bêbados no meio da rua, mas raríssimos. Em compensação fumam feito loucos, inclusive em lugares impensáveis como McDonald´s - ah, pela primeira vez comi um gostoso na vida, até o McTurco é bom. Se até a outra semana eu não consegui voltar para Istambul, continuo o assunto aqui, nessas mal-traçadas linhas.

Nota do Editor: Maria Ruth de Moraes e Barros, formada em Jornalismo pela UFMG, começou carreira em Paris, em 1983, como correspondente do Estado de Minas, enquanto estudava Literatura Francesa. De volta ao Brasil trabalhou em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes e Jornal da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela revista Flash, com o pseudônimo de Anabel Serranegra. É autora do livro "Os florais perversos de Madame de Sade" (Editora Rocco).