Faltou o que, afinal? Uma cervejinha a mais - responde quem sempre me criticou a contenção. Ou um galanteio mais ousado àquela que se casou, enfim, com outro. Por que refrear os ímpetos, se era potro e vivia os verdes anos? - me perguntam. E considero, porque faltou algo, de fato. Faltaram, talvez, dieta, ginástica e roupas de finas etiquetas para fazer bela figura nos salões. Uma silhueta como a dos fortões da revista. Ou férias em Ibiza, quem sabe, embora sempre me parecesse estúpido ir de avião à praia. O que tenha sido, faltou algo. Sei disso, por sentir. Depois dos 50, me quiseram com aparência de 30, 35. Ah, e espírito jovem! Quiseram demais o tempo todo. E eu dando ouvidos. Mas agora que a idade compromete a audição, ouço a voz do meu próprio espírito já sereno, que responde: "O que te faltou foi ouvir a ti mesmo". Nota do Editor: Daniel Santos é jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de O Estado de S. Paulo e da Folha de S. Paulo, no Rio de Janeiro, além de O Globo. Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.
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