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Crônicas
12/05/2008 - 12h04
Notícias extremamente noticiosas
André Falavigna
 

Não sei por que cargas d’água as práticas erótico-fenomenais de Ronaldo possam parecer, sob qualquer ângulo, interessantes para as pessoas normais. Compreendo que haja interesse jornalístico na coisa, uma vez que há muita demanda pelas minúcias intramuros da vida de personalidades de todos os matizes. Isso, não sou daqueles que acreditam que a mídia idiotize o público. Por outro lado, também não pertenço ao grupo daqueles que acreditam que o público seja composto exclusivamente por idiotas prontos e acabados que, por seu turno, exigem (e recebem) somente cretinice no lugar de notícia. O que acho é que há mais do que apenas imbecis a requisitar informações, mas que com freqüência patológica nossos veículos preferem atender apenas àquelas parcelas compostas, no bojo, por gente desprovida de qualquer sentido com o qual preencher a própria vida.

É sobre essas pessoas de que quero falar. Há algo errado com um mundo onde tanta gente queira saber se Fulano gosta de fulanas, de outros fulanos ou, ainda, de fulanos com fulanas, todos juntos na maior fulanagem, com ou sem a intervenção dos animais de estimação, dos serviçais, dos entregadores de pizza, dos bonsais e dos utensílios domésticos. A marca do gel fica à escolha do freguês.

Não se enganem. Não estou falando só do público, que pouco pode fazer a não ser trocar de canal, ignorar a revista, mudar de assunto no táxi. Estou falando, sobretudo, dos profissionais de criatividade, de comunicação. Não há, ao menos imediatamente, má-intenção de nossos comunicadores, jornalistas ou formadores de opinião, ainda que se possa dizer que sim, boa parte da responsabilidade é mesmo deles. Só o que acontece é que a turma não é tão diferente de seu próprio público, ao menos não tanto quanto gostaria. É por isso que ouvimos tanta gente, no próprio meio da notícia, justificando a bandalheira assim: "Ah, mas é que todo mundo quer saber quem dá pra quem" ou, ainda, sob a porca alegação de que, no fundo, mas lá no fundo mesmo, essa coisa toda é natural e todo mundo precisa mesmo chafurdar nos fluidos mais - como direi? - seminais das celebridades.

Ora, isso é tolo e desnecessário: não há nada de mau na existência de programas de fofoca, publicações fundadas na fofoca e até mesmo profissionais da fofoca inseridos num verdadeiro e próspero mercado da fofoca. Há retardados por aí, e eles têm suas necessidades. É legítimo atender às necessidades dos retardados mesmo quando elas não passam de pequenos luxos, desde que alguém possa pagar pelo serviço e de que o atendimento de tais necessidades não implique crime. Ponto.

O que espanta é a pergunta: há mesmo tantos homens, mulheres e crianças tomados pela ânsia de descobrir, por exemplo, qual a posição preferida que este ou aquele cantor de gosto duvidoso julga a mais prazerosa quando o submetem a um tratamento que se possa chamar de, sei lá, heterodoxo? Há tudo isso de leitores para revistas que se dedicam a desvendar qual a droga preferida do galã da vez, qual o nome do poodle da modelo que sempre é pega com o nariz na botija ou qual a marca de agulha preferida e recomendada pelo DJ Panaca (existe um, não existe?)? Ora, se a procura por batom na cueca fosse tão desvairada, esses programas não viveriam trocando de emissora, não haveria pasquins abrindo e fechando as portas como se fossem barraquinhas de cachorro-quente e a Globo, aquela malvada, dedicaria ainda mais tempo do que já dedica a essa sorte de porcaria.

O caso é que a coisa anda passando da conta. Eu sei, muita gente pode mesmo se intrigar pelo fato de Xuxa ter se envolvido emocionalmente com o reprodutor de sua filha dez anos após a cruza (numa trama, aliás, tocante e digna de Xerazade), mas duvido que sejam muitos os interessados nas opiniões de Andrea, o travesti artilheiro, acerca dos fundos de pensão ou, ainda, da pensão, na pensão ou pela pensão afora.

E, aos graciosos: não se animem. Não estou tão bem-informado que alguém possa utilizar-me como exemplo do quão natural é a perversão de vocês, adicionando à calúnia a infâmia do cabotinismo. Não é o caso de dizer algo como "olha, é tanto lixo que a gente acaba vendo alguma coisa", nem de justificar-me vestindo a fantasia do interesse sociológico ou profissional. É que há coisas aí que estão tentando nos fazer descer goela abaixo, na maior sem-cerimônia, apelando para o volume. Não devo ser o único a notar que, por tudo quanto é sagrado, é favor dar aquela maneirada.

Eu sei que pode lhes parecer estranho, mas há milhões, milhões senhores, que não querem saber quem ofereceu a bunda para quem, sob efeito de qual droga e sob os auspícios de quais socialites. Se a cantorinha apetitosa ainda é virgem e isso lhes interessa, penso que seria o caso de proceder, por via das dúvidas, ao exame proctológico da moça; afinal de contas, vai que a safadinha esteja nos enganando esse tempo todo, né mesmo? Sim, porque dependendo do artifício, é fácil manter-se virgem, né não? O que acharam dessa especulação? É jornalismo investigativo?

Hein?

Compreendam onde quero chegar: se a madame apaixona-se pelo segurança e casa-se com ele para, mais tarde, apaixonar-se pelo pintor, abandonar o segurança e casar-se, por confusão, com o jardineiro, se os bombeiros possuem mangueiras prodigiosas (droga, queria tanto falar "Escada Magirus", adoro falar "Escada Magirus", mas não pude encaixar um "Escada Magirus" aqui, é pena), se o ponta-de-lança do Itumbiara anda se lambuzando nas fartas nádegas da dançarina da banda Chamego Roxo, Oferecido e Melecado e se, com mil demônios, isso tudo lhes parece coisa cuja importância recomende a ampla divulgação dos fatos e se, portanto, o prurido for forte demais, façam-nos um grande favor antes de começar a nos infernizar: lembrem-se de que ainda há gente ocupada em trabalhar, estudar, que se diverte de forma saudável; lembrem-se de que seu público-alvo é, muitas vezes, alguém como você - mentecapto - e que, de alguma forma, deve haver meios de poupar todo o mundaréu sadio de tamanho azougue.

Tenham a santa paciência.


Nota do Editor: André Falavigna é escritor, tendo publicado dezenas de contos e crônicas (sobretudo futebolísticas) na Web. Possui um blog pessoal, ofalavigna.blog.uol.com.br, no qual lança, periodicamente, capítulos de um romance. Colabora com diversas publicações eletrônicas.

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