Essa é uma pergunta que faço quando me debruço sobre a legislação que rege o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza, que a Constituição Federal trata em seu artigo 156, III, dando competência aos Municípios para a arrecadação do referido tributo. Antes de qualquer outra discussão é preciso definir o que é prestação de serviço, uma vez que é este o fato gerador desse imposto. Para isso destaco o ensinamento do professor Aires Barreto que afirma que o serviço tributável pelo ISS é aquele decorrente "do esforço de pessoas desenvolvido em favor de outrem, com conteúdo econômico, sob regime de direito privado, em caráter negocial, tendente a produzir uma utilidade material ou imaterial". Fica claro, então, que a prestação de serviços tem por objeto uma obrigação de fazer, como sendo um esforço humano dirigido a outrem, que tem como contrapartida a prestação pecuniária por esse esforço. Outro ponto importante para a verificação da incidência tributária do ISS é a análise da atividade que está sendo desempenhada, o que pode ser difícil quando a obtenção do fim almejado implica a execução de diversos atos, alternando-se em obrigações de dar e fazer. Para estabelecer essa diferenciação, o primeiro divisor de águas é o contrato. É a partir dele que se define qual a atividade-fim contratada. Somente assim pode-se identificar se a empresa se enquadra ou não como prestadora de serviço. No ramo hoteleiro, não há dúvida de que o fim almejado é o aluguel de suítes, permissão de uso, portanto. Porém, para se alcançar esse fim, é necessária a execução de diversos outros atos que se constituem em obrigações de fazer. Ou seja, as prestações de serviços incluídas no contrato de locação de suítes em hotéis e assemelhados agregam valor à diária, não sendo uma atividade-fim. Nada se cobra por esses serviços, apenas é cobrada a diária, que nada mais é que a remuneração obtida em contraprestação da permissão de uso daquela suíte por tempo determinado. Tendo em vista que a prestação de serviços envolve um esforço humano em benefício da outra parte, ou melhor, que para haver prestação de serviço se torna necessária a presença de uma pessoa, prestadora da realização de um bem material ou imaterial, e outra pessoa, tomadora de serviços, temos que a característica principal de uma empresa de prestação de serviços, em regra, é ter como seu maior custo a folha de pagamento, já que precisa de funcionários realizando atividades. Conclui-se, então, que a atividade exercida pela hotelaria tem como prestação-fim uma obrigação de dar, locar suítes, e como prestação-meio, obrigações de fazer, como a higienização de quartos e serviço de café da manhã, entre outros. Por este motivo, não deve incidir sobre esta atividade o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza. Apesar de algumas correntes defenderem que a hotelaria se enquadra na hipótese de incidência tributária do ISS em razão dos serviços prestados juntamente com a locação, e alegarem que não se pode restringir a atribuição do imposto apenas à natureza da obrigação praticada para a análise da constitucionalidade de tal cobrança, esses fundamentos e outros não me convencem. Entendo como ponto mais importante de uma espécie tributária o seu critério material, fato gerador, já que a falta da realização deste impossibilita a exigência do tributo. Os tribunais já vêm dando decisões favoráveis em casos bastante similares, como a locação de flat ou de automóvel que, embora bem móvel, envolve uma cessão de direito de uso cumulada com prestação de serviços em caráter de atividade meio, como a lavagem, o abastecimento do tanque de combustível etc. Nota do Editor: Natália Ribeiro do Valle, do Ribeiro do Valle Advogados Associados, especialista em Direito Tributário pela PUC/SP.
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