09/09/2025  06h20
· Guia 2025     · O Guaruçá     · Cartões-postais     · Webmail     · Ubatuba            · · ·
O Guaruçá - Informação e Cultura
O GUARUÇÁ Índice d'O Guaruçá Colunistas SEÇÕES SERVIÇOS Biorritmo Busca n'O Guaruçá Expediente Home d'O Guaruçá
Acesso ao Sistema
Login
Senha

« Cadastro Gratuito »
SEÇÃO
Opinião
30/05/2008 - 05h35
Lula e Adib Jatene
José Nivaldo Cordeiro - Parlata
 

Ao acabar de escrever o artigo “A idiotia de Lula” posso ter cometido com Lula uma tremenda injustiça, que quero aqui reparar. Não que eu retire qualquer palavra que foi escrita, muito ao contrário. Assusta-me formidavelmente saber que a sociedade brasileira está em ritmo de estouro de rebanho, conduzido por uma rês de chocalho fanho que é o nosso presidente. Minha insatisfação foi ter ligado o seu notório predicado de apedeuta ao descolamento da realidade, sem demonstrar que os doutos brasileiros também estão a sofrer do mesmo mal irremediável. Repito enfaticamente que ignorância não é sinônimo de idiotia.

Quero fazer aqui uma comparação muito procedente, de Lula com o cirurgião Adib Jatene, a fim de reparar a minha falha. Quem não rende homenagens ao cardiologista consagrado? Eu, portador que sou de cardiopatia, entregaria aos seus cuidados, sem hesitação, meu delicado e enfartado coração. Não duvido da sua capacidade de curar, da sua instrução médica exemplar, da sua competência tão sobejamente comprovada e demonstrada. Também não duvido da sua criatividade e inventividade na prática médica, mundialmente aclamada.

Mas, como Lula, Adib Jatene padece também da mesma idiotia do homem-massa. É ele um exemplar acabado deste espécime. Toda a gente vê apenas a biografia do cientista e do médico consagrado quando ele vai à TV defender a CPMF, mas não enxerga o outro lado do Dr. Jatene: um funcionário público desde sempre, formado em escola pública e que professa sem nenhum pudor uma ideologia política muito próxima do Partido Comunista, ou petista, se quisermos atualizar os termos. É um barnabé de alma. Então quando emite opiniões políticas, mais das vezes Dr. Jatene deixa o diploma de medicina de lado e veste a persona do barnabé, um homem que desconhece como funciona a economia de mercado e tem absoluta ojeriza à lei da escassez. É todo direito e nenhum dever ao falar em público. Por isso ele foi o criador e é o mais afamado defensor da CPMF, de triste memória.

Tomemos, por exemplo, as declarações recentes do Dr. Jatene relatadas na Folha de São Paulo:

"A gente vive em um país colonial e imperialista em que os amigos do rei não gostam de pagar imposto", disse Jatene durante a solenidade, no Palácio do Planalto. "O governo fica na contingência de arrecadar muito de quem ganha pouco e arrecadar pouco de quem ganha muito", reiterou. Emocionado e com a voz embargada, Jatene descreveu o trabalho dos profissionais de saúde e criticou as limitações impostas ao setor. "Não aceito as limitações que a área econômica impõe à saúde", disse. "A área econômica está muito perto da riqueza, quando o ministro da Fazenda vai a São Paulo vai à Fiesp, não vai à periferia."

Antes de analisar as declarações do médico famoso, regato aqui a análise poderosa de Ortega y Gasset sobre o homem-massa encarnado no homem de ciência, no especialista. Vejamos (peço desculpas pelas longas e necessárias citações):

Seria de grande interesse, e maior utilidade que a aparente à primeira vista, fazer uma história das ciências físicas e biológicas, mostrando o processo de crescente especialização no trabalho dos investigadores. Isso faria ver como, geração após geração, o homem de ciência tem sido constrangido, encerrado num campo de ocupação intelectual cada vez mais estreito. Mas não é isto o importante que essa história nos ensinaria, mas justamente o inverso: como em cada geração o científico, por ter de reduzir sua órbita de trabalho, ia progressivamente perdendo contato com as demais partes da ciência, com uma interpretação integral do universo, que é o único merecedor dos nomes de ciência, cultura, civilização européia.

O caso é que, fechado na estreiteza de seu campo visual, consegue, com efeito, descobrir novos fatos e fazer avançar sua ciência, que ele apenas conhece, e com ela a enciclopédia do pensamento, que conscienciosamente desconhece. Como foi e é possível coisa semelhante? Porque convém repisar a extravagância deste fato inegável: a ciência experimental progrediu em boa parte mercê do trabalho de homens fabulosamente medíocres, e menos que medíocres. Quer dizer, que a ciência moderna, raiz e símbolo da civilização atual, deu guarida dentro de si ao homem intelectualmente médio e lhe permite operar com bom êxito. A razão disso está no que é, ao mesmo tempo, vantagem maior e perigo máximo da ciência nova e de toda civilização que esta dirige e representa: a mecanização. Uma boa parte das coisas que é preciso fazer em física e em biologia é faina mecânica de pensamento que pode ser executada por qualquer pessoa. Para os efeitos de inúmeras investigações é possível dividir a ciência em pequenos segmentos, encerrar-se em um e desinteressar-se dos demais. A firmeza e exatidão dos métodos permitem esta transitória e prática desarticulação do saber. Trabalha-se com um desses métodos como com uma máquina, e nem sequer é forçoso para obter abundantes resultados possuir idéias rigorosas sobre o sentido e fundamento deles. Assim a maior parte dos científicos propelem o progresso geral da ciência encerrados num nicho de seu laboratório, como a abelha no seu alvéolo.

Por isso cria uma casta de homens sobremodo estranhos. O investigador que descobriu um novo fato da Natureza tem por força de sentir uma impressão de domínio e de segurança em sua pessoa. Com certa aparente justiça se considerará como ‘um homem que sabe’. E, com efeito, nele se dá um pedaço de algo que, junto com outros pedaços não existentes nele, constituem verdadeiramente o saber. Esta é a situação íntima do especialista, que nos primeiros anos deste século chegou à sua mais frenética exageração. O especialista “sabe” muito bem seu mínimo rincão de universo; mas ignora basicamente todo o resto.

Eis aqui um precioso exemplar deste estranho homem novo que eu tentei, por uma e outra de suas vertentes e aspectos, definir. Eu disse que era uma configuração humana sem igual em toda a história. O especialista serve-nos para concretizar energicamente a espécie e fazendo ver todo o radicalismo de sua novidade. Porque outrora os homens podiam dividir-se, simplesmente, em sábios e ignorantes, em mais ou menos sábios e mais ou menos ignorantes. Mas o especialista não pode ser submetido a nenhuma destas duas categorias. Não é um sábio, porque ignora formalmente o que não entra na sua especialidade; mas tampouco é um ignorante, porque é “um homem de ciência” e conhece muito bem sua porciúncula de universo. Devemos dizer que é um sábio ignorante, coisa sobremodo grave, pois significa que é um senhor que se comportará em todas as questões que ignora, não como um ignorante, mas com toda a petulância de quem na sua questão especial é um sábio.

E, com efeito, este é o comportamento do especialista. Em política, em arte, nos usos sociais, nas outras ciências tomará posições de primitivo, e ignorantíssimo; mas as tomará com energia e suficiência, sem admitir – e isto é o paradoxal – especialistas dessas coisas. Ao especializá-lo a civilização o tornou hermético e satisfeito dentro de sua limitação; mas essa mesma sensação íntima de domínio e valia o levará a querer predominar fora de sua especialidade. E a conseqüência é que, ainda neste caso, que representa um maximum de homem qualificado – especialismo – e, portanto, o mais oposto ao homem-massa, o resultado é que se comportará sem qualificação e como homem-massa em quase todas as esferas da vida”. (A REBELIÃO DAS MASSAS, capítulo XII, A barbárie do especialismo)

Como não enxergar o Dr. Jatene dentro deste estereótipo de primitivo e ignorante em matéria de ciência política? Em matéria de ciência econômica? Em matéria de filosofia? No alto de sua especialidade médica ele quer mesmo é abolir a própria lei da escassez, o sonho impossível da comunalha. "Não aceito as limitações que a área econômica impõe à saúde", declarou. Ora, não é a área econômica do governo que impõe limitações à saúde, mas a realidade enquanto tal. Enquanto bem econômico os serviços de saúde são regulados pela lei da escassez, quer o Dr. Adib Jatene saiba disso ou não, quer goste disso ou não. Penso que o médico não tem a dimensão da asneira que falou.

E foi mais longe na arte de falar besteira: "A gente vive em um país colonial e imperialista em que os amigos do rei não gostam de pagar imposto". Claro que não vivemos em um país colonial, que já temos quase duzentos anos de independência política. Sua declaração é um atentado contra os livros de história. E é claro que o Brasil não é um país imperialista, pois não se envolve em guerras territoriais desde o século XIX. É uma besteira monumental o que disse. E, ainda que por suposto fosse o Brasil fosse um país colonial e imperialista, o que isso teria a ver com o fato de os supostos amigos do rei não gostarem de pagar impostos? Nada. Por acaso os não amigos do rei gostam de pagar impostos? Os barnabés, os amigos do rei por definição, gostam de pagar impostos? O sistema legal faz acepção entre amigos do rei e não amigos do rei na hora de cobrar impostos? Estamos diante do samba do turco doido que não sabe o que diz ao justificar a clamorosa injustiça do nosso sistema tributário. Pior, a tentar alargar a enorme injustiça tributária.

Foi mais desastroso quando declarou: "A área econômica está muito perto da riqueza, quando o ministro da Fazenda vai a São Paulo vai à Fiesp, não vai à periferia." Isso é a pregação do marxismo-leninismo, a utopia mais desgraçada que já apareceu na face da terra. É a luta de classes pregada com todas as letras. Ora, a existência de uma classe industrial rica não é causa da pobreza, mas a maneira pela qual a pobreza pode ser minimizada e eliminada. Jatene aqui não passou de um panfletário comunista.

Adib Jatene ignora que a saúde não precisaria de investimentos públicos se a nossa carga tributária estivesse abaixo de 25%. Toda a gente, inclusive a população mais pobre, poderia comprar no mercado seus serviços, a preços justos, sem ter a intermediação estatal. Mas Jatene é um incapaz de ver a realidade como ela é e quer, cada vez mais, tentar molda-la aos seus preconceitos e idiossincrasias. Toda a sua competência médica aqui de nada vale e ao se meter no que não sabe não passa de um homem tolo, um homem-massa, um homem perigoso para o bem-estar da coletividade. E esse monumento à ignorância foi ministro! Criou a CPMF! Como isso foi possível? Ora, com Lula presidente tudo o mais torna-se possível.

Ortega y Gasset foi muito feliz ao sintetizar, talvez imaginando algum Adib Jatene do seu tempo: “E, com efeito, este é o comportamento do especialista. Em política, em arte, nos usos sociais, nas outras ciências tomará posições de primitivo, e ignorantíssimo; mas as tomará com energia e suficiência, sem admitir – e isto é o paradoxal – especialistas dessas coisas”. O perfeito Doutor Sabe-Tudo das farsas. O Dr. Jatene está integralmente descrito nesta citação.

Como você pode ver, meu caro leitor, Lula está em boa companhia. O povo é que não está, conduzido que é feito rebanho de gado por esses vaqueiros do asfalto. Um bando de panacas que não sabe o que diz e o que faz. Que não tem noção das suas limitações, seja um douto ou um apedeuta.


Nota do Editor: José Nivaldo Cordeiro (www.nivaldocordeiro.net) é executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor da ANL – Associação Nacional de Livrarias.

PUBLICIDADE
ÚLTIMAS PUBLICAÇÕES SOBRE "OPINIÃO"Índice das publicações sobre "OPINIÃO"
31/12/2022 - 07h25 Pacificação nacional, o objetivo maior
30/12/2022 - 05h39 A destruição das nações
29/12/2022 - 06h35 A salvação pela mão grande do Estado?
28/12/2022 - 06h41 A guinada na privatização do Porto de Santos
27/12/2022 - 07h38 Tecnologia e o sequestro do livre arbítrio humano
26/12/2022 - 07h46 Tudo passa, mas a Nação continua, sempre...
· FALE CONOSCO · ANUNCIE AQUI · TERMOS DE USO ·
Copyright © 1998-2025, UbaWeb. Direitos Reservados.