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Opinião
08/06/2008 - 05h44
A baderna estudantil de maio de 1968 (Revisitada)
Mario Guerreiro - Parlata
 

Não se pode negar a irrelevância da interpretação ao menos no que diz respeito ao que é claro como um cristal, como já rezava o antigo e sábio adágio: In claris cessat intrepretatio. Mesmo assim, os videntes têm se servido, desde longa data, de uma bola de cristal para “ver” tudo aquilo que os simples “vedores” - ou seja: percipientes visuais – não conseguem ver.

Mas se há uma exceção ao que afirmamos acima, esta é o fato histórico em que tudo depende sempre do modo como ele é interpretado. O fato em questão é o que ocorreu em Paris - e com repercussões menos contundentes em Berkeley (CA) e até mesmo no Rio de Janeiro (RJ) – no mês das noivas, maio de 1968. Para uns, uma gloriosa revolta das esquerdas estudantis; para outros, no entanto...

“É velha tradição na França a baderna política. Versalhes afinal foi transformada de um valhacouto de caça em Corte, porque os irrequietos parisienses amolavam a vida da cidade. Depois vieram 1830, 1848, 1871, 1879, desordens compenetradas. A resistência civil ao “poujadismo”, nos anos 50. Em 1968, os estudantes puxando meia brincadeira de revolução, meio cordão de carnaval. E agora uma bruta turbulência reivindicatória de oposição aos planos de austeridade dos gastos públicos e de reforma da Previdência do primeiro-ministro Alain Juppé. (Roberto Campos, “Pas d’argent”, em O Globo, 17 /12/95).

Desse modo, o mesmo fato histórico que é digno de lamentação para uns, é digno de comemoração para outros. O que pertence ao passado, aos erros da juventude e ao amargo arrependimento de uns – “Nós que amávamos tanto a revolução” – pertence também ao presente e é digno de festejos ao se tornar menos moço do que uma balzaquiana, pois completou 40 anos sob o slogan: “Nós que amamos tanto a revolução”. Quem ama o feio, belo lhe parece. E o que é antigo não é necessariamente velho... E afinal de contas, como todo mundo sabe, panela velha é que faz comida boa...

Assim, como não poderia deixar de ser, sem contrariar a prata da casa: uma velha tradição esquerdista caquética e carcomida, entre os dias 12 e 15 de maio do presente ano, a UFRJ fez uma série de conferências em que foi abordada “a importância dos eventos de 1968 na França que influenciaram todo o mundo” [Jornal dos Do(c)entes da UFRJ, ano X, n° 580, maio de 2008]. Para abrilhantar o evento, realizado no auditório do Palácio Gustavo Capanema, foi convidado o professor do CEFET-SP, Valério Arcary, para discursar quando da abertura do portentoso evento.

O referido mestre começou fazendo uma imprecação contra a imprensa burguesa que, segundo pensa, “tenta diminuir a dimensão político-social de 1968, em favor da dimensão sociocultural”. E pelo que vejo o companheiro consegue ver a baderna de maio como bidimensional - enquanto em minha ótica de não-companheiro - ela não passou de unidimensional: um caso de polícia, pois, entre outras estripulias, tropelias e porralouquices, os baderneiros aboletaram-se num prédio público, a Sorbonne, e se recusaram a cumprir um mandado judicial de reintegração de posse. Fizeram até mesmo barricadas, como se fosse o caso da vetusta e insaudosa Comuna de Paris tão amada e idolatrada por Carlos Henrique Marx (como é chamado o gajo em Portugal).

Neste caso, que fazer? Não há outro recurso senão o emprego do braço armado da lei, para que o Poder Judiciário não se transforme numa moral das vovozinhas, pois como reza o antigo e sábio provérbio chinês “Quando as avós entram pela porta a disciplina das crianças sai pela janela”. Sabedoria milenar!

But whatsoever happens the show must go on, costuma dizer a turma da Broadway e por em prática as esquerdas festivas. Contestando sempre a imprensa burguesa, disse o douto mestre Valério Arcary: “Para mim, 68 foi início de uma onda revolucionária, a última que atingiu o centro do capitalismo”. De fato, atingiu-o como um fortíssimo abalo sísmico da ordem de 0,1 na Escala Richter [que vai de 0 a 9].

No Brasil, os então crescentes assaltos, seqüestros, atentados terroristas e outros graves abalos da ordem constituída, levados a cabo pela companheira Estella (Dilma Rousseff) e pelo companheiro Jair (Carlos Minc Baumfeld), entre outros ainda vivos e já mortos membros do VAR-Palmares, compeliram o governo militar a baixar o AI-5, uma medida amarga para uma situação azeda.

Mas prossegue o douto mestre dizendo que as tendências revolucionárias eram insignificantes na política: “Foi uma surpresa para mim o protagonismo dos estudantes”. Bem se vê que o companheiro não leu o artigo de Roberto Campos publicado em O Globo em 17/12/95 e ao que tudo indica não leu também o excelente livro de J. R. Martins Filho sobre Maio de 1968 em que, entre outras coisas, diz o autor:

“Depois de 1958, o estilo francês de autoridade – centralizador, hierárquico, autoritário, elitista, fortemente impregnado de valores e preconceitos aristocráticos - foi não somente preservado como agravado. Com a acentuada redução do papel dos partidos e sindicatos, o regime se assemelha a um sistema elétrico sem fusíveis, onde um curto-circuito pode colocar em pane todo o aparelho estatal. Os dois grandes pólos políticos da França da Quinta República – o gaullismo e o comunismo – criaram ao redor de si imenso vazio político e ideológico. Não é de espantar, assim, o poder de difusão que teve o movimento estudantil de maio”. [Martins Filho: A Rebelião Estudantil. Campinas. Mercado das Letras. 1996. p.33].

E assim como em priscas eras a revolução francesa teve ao menos o mérito de despertar a Prússia (Não existia a Alemanha na época) de sua sonolência política, a baderna estudantil de Maio de 1968 teve ao menos o mérito de espicaçar o autoritarismo e o extremo conservadorismo da Quinta República de De Gaulle e da oposição: os insossos e inexpressivos membros do Partido Comunista Francês.

O grande problema é que – tal como no Brasil – eles não estavam lutando contra uma ditadura de direita em prol de uma democracia pluralista, mas sim em prol de uma ditadura de esquerda como a de Cuba e a da URSS. Queriam apenas virar o lado do mesmo disco ou a face da mesma moeda.

Quando eu ainda era estudante, em maio 1968, não existia coisa mais detestada pelas esquerdas carnívoras do que a tal da “democracia burguesa”. E se hoje, 40 anos depois, passou a ser aceita pelas mesmas esquerdas é unicamente como mero meio para atingir um fim: a “ditadura democrática”. Uma gritante contradictio in adjectio? Não, não, apenas o modo como o camarada Mao-Tsê-Tung denominava o regime chinês de sua insaudosa época.

Apêndice I: Os slogans da baderna

Determinados slogans são mais eloqüentes do que tratados de retórica inteiros. Para compreender o que foi Maio de 1968 em Paris sob a inspiração das ideologias anarco-comunistas de Herbert Marcuse, Daniel Cohn-Bendit et caterva: “A luta por Eros é a luta pela civilização”, “O imaginário no Poder”, “É proibido proibir”, usw. Com tais slogans anárquico-erótico-juvenis, a coisa só poderia desembocar chez Mère Jeanne, i.e. na Casa da Mãe Joana.

Apêndice II: Sarkozy: um sóbrio entre os ébrios gauleses

“O Maio de 68 impôs o relativismo moral e intelectual a todos nós. Impôs a idéia de que não existia mais qualquer diferença entre bom e mau, verdade e falsidade, beleza e feiúra. Sua herança introduziu o cinismo na sociedade e na política, ajudando a enfraquecer a moralidade do capitalismo, a preparar o terreno para o inescrupuloso capitalismo das regalias e das proteções para executivos velhacos.” (Sarkozy).

Eis um francês que pensa como uma inglesa: minha querida Baronesa Thatcher.

Apêndice III: Façam o que digo mas não façam o que faço

Lulla declarou: “Encomendar navios fora do Brasil é imbecilidade.” [Jornal do Commercio, 25/5/2008]. Não menor imbecilidade ele mesmo encomendar o Aerolulla fora do Brasil quando a EMBRAER produz aviões de qualidade internacionalmente reconhecida.


Nota do Editor: Mario Guerreiro (xerxes39@gmail.com) é Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor Adjunto IV do Depto. de Filosofia da UFRJ. Ex-Pesquisador do CNPq. Ex-Membro do ILTC [Instituto de Lógica, Filosofia e Teoria da Ciência], da SBEC. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Membro Fundador da Sociedade de Economia Personalista. Membro do Instituto Liberal do Rio de Janeiro e da Sociedade de Estudos Filosóficos e Interdisciplinares da UniverCidade. Autor de obras como Problemas de Filosofia da Linguagem (EDUFF, Niterói, 1985); O Dizível e O Indizível (Papirus, Campinas, 1989); Ética Mínima Para Homens Práticos (Instituto Liberal, Rio de Janeiro, 1995). O Problema da Ficção na Filosofia Analítica (Editora UEL, Londrina, 1999). Ceticismo ou Senso Comum? (EDIPUCRS, Porto Alegre, 1999). Deus Existe? Uma Investigação Filosófica. (Editora UEL, Londrina, 2000). Liberdade ou Igualdade (Porto Alegre, EDIOUCRS, 2002).

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