Alberto olhou pela janela, não sabia onde estava, quem eram as pessoas a sua volta. Estava confuso. Não entendia porque nos jornais saíam notícias com o seu nome, algumas manchetes diziam "o famoso escritor perdeu o dom e ninguém sabe explicar". Com seus 55 anos, cabelos grisalhos e olhos azuis, em casa olhava a rua através do vidro e tentava pensar no passado. Era o começo do mês de maio, Alberto resolveu passar férias com a família, fazia muito tempo que não tinha férias, foi conhecer a China. Vivia o auge de sua carreira e tinha um dom inexplicável: o de transcrever fatos. Não era apenas contar histórias, mas ele investigava, estudava e mostrava-se indispensável para seu meio. Dotado de uma inquietação, resolveu passear pela cidade sozinho. Entusiasmado, andava pela nova cidade e olhava com minúcias cada detalhe das ruas, comércio, pessoas, vestimentas, arquitetura, observava a cultura daquele povo e movimentava-se como um relógio, querendo passar por cada canto daquela cidade desconhecida. Percebeu que algo estranho acontecia, suas pernas tremiam. Olhou para os lados, viu as pessoas correndo todas na mesma direção. Como era curioso, resolveu correr no sentido contrário. Tentava andar, mas a multidão o empurrava para o lado oposto, foi pelo canto da calçada e com passos rápidos. Quando se aproximou do local, se espantou. Enxergou ruínas, mortes, devastação, sofrimento, dor. Era um terremoto que acabou com a vida daquele país. Ele tentou ajudar, correu para perto de algumas pessoas, ajudou alguns feridos, mas sem se dar conta caiu em um buraco. Alberto não conseguia sair dali, gritava, chorava, lembrava dos familiares. Seu celular não tinha sinal. Alberto parou, olhou para cima e o que via era apenas uma pontinha amarela do sol, que cada vez ficava mais distante. Gritou tanto que perdeu a voz, ficou cansado, parou. Lembrou-se do Brasil, lembrou-se da família, das pessoas que ele tanto amava, e os dias foram passando. Estava fraco, com fome, frio e sabia que não poderia desistir. De repente acordou, estava numa cama branca, parecia um hospital. Alguém falava com ele: "troca de roupa". Obedeceu. Chegaram algumas pessoas, o levaram para um carro, preocupado, não sabia para onde ia. Chegou numa casa, o chamavam de escritor e não entendia nada. Ao olhar para uma tela em branco, o escritor se deu conta de que não tinha mais nada a dizer, havia perdido a memória. Foi quando olhou para a janela e tentava se lembrar do passado. Nota do Editor: Tatiany Cavalcante é repórter e mantém o blog Jornalismo Literário.
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