A arte de esquecer
“Cada um de nós é quem é porque tem suas próprias memórias” (Ivan Izquierdo) É do médico e neurocientista Ivan Izquierdo, conhecido e respeitado internacionalmente por seus estudos sobre memória, a idéia: “...esquecemos para poder pensar, e esquecemos para não ficar loucos; esquecemos para poder conviver e para poder sobreviver.” (A Arte de Esquecer, pg. 22). A inauguração do Memorial Ciccillo Matarazzo tem um mérito: a de contribuir para a afirmação da memória coletiva referente a um período recente da história de Ubatuba, que não está isolada do que ocorria no país e no mundo. A partir de 1946, é intensa a mudança da conjuntura nacional. Fim do Estado Novo, eleições e nova Constituição. Após o mandato do marechal Dutra, novamente Getúlio. Suicídio. Em seguida, após o período JK, novas crises, renúncia de Jânio, deposição de Jango, e por fim o período que se iniciou em 1964. Enquanto isto, a indústria na sua fase atual se instala no país. Volta Redonda, a indústria automobilística. Novas estradas. Novas usinas. Angra, Terminal da Petrobrás, Rio-Santos. O Brasil não é mais rural. As cidades incham. Ubatuba é de novo descoberta e se integra nessa nova realidade. Algumas pessoas com interesse em Ubatuba, como o ex-prefeito de São Paulo, Wlademir de Toledo Piza convencem Ciccillo Matarazzo a se candidatar a Prefeito de Ubatuba. O tempo era de mudança. Alta a temperatura da política. O Brasil todo sentiu o choque de 64. Grandes e pequenos embates. Ficaram marcas. Algumas estão no esquecimento. A fila andou e a sociedade se transformou. A Nação mudou. E Ubatuba também. Tanto na memória coletiva, como na individual, o esquecimento pode ser fruto da repressão voluntária ou involuntária do meio social e de alguns de seus agentes. Mas, para a construção do futuro, é importante lançar luz sobre o esquecimento e clarear os fatos. O Prefeito Ciccillo prestará mais um grande serviço a Ubatuba. Prefeito num momento crítico para a história do país, conhecido nacional e internacionalmente, certamente teria muito mais o que nos relatar neste memorial. Esta tarefa ele deixou para as futuras gerações para que, de forma científica, tornem viva a memória de Ubatuba. Este memorial certamente servirá de incentivo ao conhecimento do passado, não podendo se constituir em obra de arte para o esquecimento de fatos que às vezes incomodam os que estiveram no plantão do Poder. Tenho a convicção que a maior obra de Ciccillo será a de motivar as futuras gerações a guardar a memória de Ubatuba “com tudo que ela tem”. José Nélio de Carvalho Advogado e ex-prefeito de Ubatuba jn.carvalho@uol.com.br
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