Três da manhã. Acordou bem rápido, com medo de tomar friagem. Importou-se em até colocar luvas, mesmo não podendo. Aqueceu-se com um gole pelando de café preto, duas torradas frias e um abraço de mãe. Foi-se já tarde, como de costume. Foi-se com olhar diferente. Algo prometia, o que era percebido no ar. Passos rápidos, olhos vermelhos de medo e de frio, a escuridão a cortava bem devagar, em pele fina e branca. O vento lhe causava susto, ao passo em cima de passo. Dor na alma. Era constante o amargo do café ao subir toda vez que soluçava, numa mistura de gemido e solidão. Por minutos recordava os seus momentos de afeto. Por completa, imaginou-se pássaro, rosa, criança, amor eterno. Tudo isso em um segundo. Quieta, deixava pingar, bem gelado no chão, os risquinhos de papel em forma de lágrimas. Perdera na imaginação o número de vezes que escreveu os infinitos nomes dos seus sonhos, mesmo cabendo-os dentro de um só. Já era tarde. Não pensava mais agora. No momento de transe, se entregou à escuridão de sempre, apostando friamente nisso, de forma eterna. Simplesmente parou ao lado de um muro branco, de palavras rabiscadas e pôs fim ao seu olhar vertical. Não queria mais ser flores para os seus arranjos. Mergulhada em sangue, deitada no sujo chão, arregalava bem os olhos para saber quem a esperava na escuridão. Diziam ser caminho branco, calmo. Não lembrava disso de tanto arrependimento. Por que não antes? Nota do Editor: Rafael Silvestre é jornalista e professor voluntário, atualmente cursando o último ano de Letras.
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