Existe, há algum tempo, um filão na literatura brasileira. Descobriu-se que biografias de famosos proporcionam ótimo retorno financeiro para seus autores. Não estou aqui me referindo às autobiografias ou as biografias feitas para familiares e amigos, mas àquelas encomendadas por pessoas públicas que estão no imaginário coletivo dos que lêem livros no Brasil. Há, no momento, dois biógrafos em moda: Ruy Castro e Fernando Morais. Eles trabalham como em linhas de montagem, tais como os autores de best-sellers internacionais. Explico: formam equipe e designam jovens talentos ou estagiários para coletar dados sobre cidades, fatos e costumes de época, fotos, escritos, idiossincrasias e pesquisar relações de parentesco e amizade da pessoa biografada. A partir de todo o material coletado passam a acompanhar a pessoa, se viva, em seu habitat natural. Fazem viagens juntos, decodificam seus hábitos e gravam centenas de horas de conversa. Um bom exemplo é o citado Fernando Morais. Agora mesmo, acaba de lançar o livro "O Mago", a biografia de Paulo Coelho, esse polêmico escritor que, integrante da Academia Brasileira de Letras, vendeu milhões de exemplares em todo o mundo e enriqueceu, apesar de não ser aceito pela maioria dos intelectuais brasileiros que o vêem como plagiário. Isso é outra história. Não vou comentar aqui a biografia, apenas observar que a linha de montagem de Morais precisa ser melhor cuidada. Fico apenas em um detalhe: no intuito de procurar ancestrais nobres de Coelho, descobre o cearense João Araripe Júnior, seu avô materno. Daí para frente começa o delírio de Morais. Diz que "pelo cipoal dos Araripe Alencar, sobrenome da mãe, poderia se fartar, sem arredar pé da própria família, com o manancial de personagens perfeitamente adequados a seus livros - heróis ou vilões, à escolha do autor". Logo abaixo, enumera "parentes" de Paulo Coelho. Vejam alguns: Bárbara de Alencar, José de Alencar, Rachel de Queiroz, Humberto Castelo Branco e Miguel Arraes. Do delírio passa ao cochilo: fala em Araripe Alencar e, em seguida, trata a mesma família de Alencar Araripe. Resumo da ópera: O Coelho e o Morais, biografado e biógrafo, estão no mesmo rumo. Nota do Editor: João Soares Neto é escritor.
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