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Opinião
04/08/2008 - 09h05
Filhotes de Nostradamus
Rodrigo Constantino - Parlata
 

Você não pode ver o futuro através de um espelho retrovisor.” (Peter Lynch)

O mercado financeiro felizmente tem atraído muita gente nova, principalmente os mais jovens. Isso é muito positivo para o desenvolvimento do mercado de capitais no país, ajudando a derrubar o mito de que bolsa de valores é como um cassino. Nada mais falso. É justamente através deste veículo que empresas podem obter financiamento para crescer ou mesmo nascer, como vimos no incrível caso da OGX, do empresário Eike Batista, que levantou bilhões antes mesmo de iniciar as operações. Até os especuladores mais focados no curto prazo exercem importante função, ao explorarem as oportunidades de arbitragem, contribuindo para reduzir as ineficiências eventuais do mercado. Eles garantem maior liquidez e servem para a busca de hedge por parte de várias empresas. Logo, o crescimento do número de investidores, incluindo pessoas físicas, é algo que deve ser comemorado. O perigo é o oportunismo de alguns filhotes de Nostradamus.

Como muitos jovens chegam sedentos ao mercado, ainda com o sonho de rápido enriquecimento, oportunistas de plantão exploram essa demanda, oferecendo soluções “mágicas”. Passam a idéia de que descobriram os segredos da alquimia, e conquistam leigos despreparados. Essas vítimas nem param para pensar que se esses traders realmente tivessem descoberto o caminho do sucesso, estariam mega-milionários, em vez de precisar vender programas, cursos, livros ou palestras sobre o tema, cobrando migalhas dos seus clientes. Falta um pingo de ceticismo nesses jovens, ofuscados com o sonho de ganhar milhões em pouco tempo, sem muito esforço. Eles escutam uma ou outra história de sucesso, ignoram a quantidade infinitamente maior de fracassos, e partem para o “jogo” de forma absurdamente superficial.

Normalmente usam instrumentos técnicos, como análise gráfica, embalados com complexa matemática, como se o futuro fosse previsível com base no passado. Os nomes bonitos, como a teoria dos fractais, e os modelos econométricos complicados, encantam os jovens. Eles tentam transportar os conhecimentos da ciência natural para a ciência humana, como se o comportamento dos indivíduos fosse previsível da mesma forma que a lei da gravidade.

Como disse Max Gunther, autor de Os Axiomas de Zurique, o “caos não é perigoso até ele começar a parecer ordenado”. O mesmo autor lembra que o comportamento humano não pode ser previsto de forma acurada. O risco se encontra à nossa frente, não no passado. Aquilo que não sabemos pode ser fatal. O passado raramente revela quando algo radical ocorrerá no futuro. Vários especuladores profissionais, com décadas de experiência nos mercados, descobriram na prática essas verdades constatadas por alguns pensadores também, entre eles o prêmio Nobel Hayek. As estatísticas, por mais complexas que sejam, tratam de eventos passados. Elas não podem descrever precisamente eventos não ocorridos ainda. Levar os planos rígidos de longo prazo muito a sério, como se o futuro estivesse sob controle, pode ser uma das formas mais prováveis de encontrar o fracasso. A necessidade de crença em um futuro conhecido e amplamente previsível deve ser tratada num divã, mas é extremamente arriscada no mercado financeiro.

Raros são os investidores que conseguem superar a performance média do mercado de forma sustentável. Milhares de fundos e especuladores, com vários profissionais experientes e dedicados, tentam diariamente gerar um retorno acima da média. Poucos conseguem. O cemitério está repleto de evidências silenciosas sobre a dificuldade de superar os índices de benchmark. O survival bias, a mania da mente humana em focar apenas nos casos de sucesso, cria a impressão de que é mais fácil vencer do que é na realidade. O mercado exige muita humildade. Quem adota uma postura arrogante, de que pode sistematicamente antecipar os eventos e obter um retorno extraordinário por longo período, costuma receber uma dura lição do mercado. Claro que alguns vão conseguir. Mas a maioria vai nadar, nadar, e depois morrer na praia. Ficar milionário especulando de casa não é nada fácil, tampouco provável. Possível até é, sem dúvida. Assim como é possível ganhar na mega-sena. Mas contar com isso para pagar as contas é uma aventura que beira à irresponsabilidade.

Um investidor-filósofo que tem muito a ensinar para essa turma jovem, que acredita no poder de previsão dos modelos vendidos pela internet, é Nassim Taleb, autor de Fooled by Randomness e The Black Swan. Eu recomendo fortemente ambas as leituras. Taleb lembra que não importa a freqüência com que algo funciona, se o fracasso, quando chega, tem um custo insuportável. Ele lembra ainda que não faz sentido algum procurar padrões estatísticos que estão disponíveis para qualquer um com uma conta em corretora, pois uma vez detectado, o padrão logo perde a relevância. Séries aleatórias, para piorar, sempre apresentam algum padrão detectável. Os especuladores podem achar que estão com a resposta para o futuro nas mãos, através da descoberta de algum padrão que vem funcionando bem, apenas para descobrir depois que o “padrão” deixou de funcionar. O mundo é bem mais complexo do que alguns gostariam. Modelos matemáticos que olham pelos ombros não podem adivinhar o que seres humanos irão fazer no futuro.

Espero ter deixado claro que o mercado financeiro exerce um papel fundamental para o desenvolvimento econômico de uma sociedade, mas que não deve ser encarado como uma roleta, tampouco como um meio fácil de ficar rico rapidamente. Ele pode entregar recompensas maravilhosas para muitos investidores e especuladores, mas pode também apresentar uma fatura elevada para muitos, especialmente os arrogantes que juram ter o poder de prever o futuro com precisão. Eles não têm. Ninguém tem! Muito menos alguém que precisa vender livros e modelos por valores irrisórios. Por que alguém que tem em mãos um modelo capaz de torná-lo multimilionário iria vendê-lo pela bagatela de cinco mil reais? Um pouco mais de ceticismo faria muito bem a esses jovens, vítimas fáceis dos filhotes modernos de Nostradamus, que não passam de embusteiros. Além disso, fica o apelo por mais humildade também, já que competir no mercado financeiro é tarefa árdua, com milhões de pessoas extremamente inteligentes e esforçadas tentando vencer no mundo todo. Como dizia meu antigo chefe, um respeitado especulador brasileiro, “pato novo não mergulha fundo”.


Nota do Editor: Rodrigo Constantino é economista formado pela PUC-RJ, com MBA de Finanças no IBMEC, trabalha no mercado financeiro desde 1997, como analista de empresas e depois administrador de portfólio. Autor de dois livros: Prisioneiros da Liberdade, e Estrela Cadente: As Contradições e Trapalhadas do PT, pela editora Soler. Está lançando o terceiro livro sobre as idéias de Ayn Rand, pela Documenta Histórica Editora. Membro fundador do Instituto Millenium. Articulista nos sites Diego Casagrande e Ratio pro Libertas, assim como para os Institutos Millenium e Liberal. Escreve para a Revista Voto-RS também. Possui um blog (rodrigoconstantino.blogspot.com) para a divulgação de seus artigos.

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