Existem várias maneiras de explicar o que não se entende. Uma delas é dizer que entendeu. Andava confuso com as atitudes de Mariana. Ela me dizia não saber ao certo o que queria de sua vida. E, não bastasse, ela agia como quem realmente não sabia. Mas, às vezes, eu tinha dúvidas sobre essa confusão de pensamentos e sentimentos demonstrados por Mariana. Talvez ela soubesse muito bem o que queria e eu ao lado dela, definitivamente, não era. - Você não pode fumar aqui. - Documentos? - Não, porra! Estou dizendo que você não pode ficar aqui, parado, fumando, rapaz! Circulando, se não eu te levo em cana! - Sim, senhor policial. Eu já estou indo. - É bom mesmo! Olhei no relógio da praça e eram 4h25. Eu havia bebido muito naquela noite, mas, por vários motivos, mesmo cansado, não sentia vontade de ir para casa. Lembrava das frases de amor que Mariana me dissera tantas vezes. Foram cinco anos, sete meses, e treze dias de namoro. Estávamos noivos havia um ano, cinco meses e nove dias. Mas agora estava tudo acabado. - Procurando diversão, gato? - Não. Obrigado. - Eu gostei de você. Vou fazer tudo que você quiser. - Eu já disse que não. Me deixe sozinho. - Vem aqui, gato. Eu vou deixar você louquinho na cama. - Eu já disse que não, porra! Sai daqui sua puta! - Seu viado! Broxa! Idiota! Eu só queria ficar sozinho essa noite. Não pensar em mais nada, além de Mariana. Fechar os olhos, sentado na calçada, e esvaziar minha cabeça bem devagar. Adormecer e demorar uma eternidade para acordar de novo. Sonhar com dias melhores. Viver tranqüilamente um novo tempo, com novos amores, e ser alguém diferente. Ter uma vida calma e previsível. - Acorda aí, malandro! Vou abrir a loja! Desinfeta daqui! - Oi?! Que?! Desculpa..., acho que dormi...! - Vai saindo! Vai saindo! - Sim. Desculpa. Por favor, só uma coisa, que horas são? - Já são 8h00. Hora de trabalhador se mexer, meu amigo! - Ah, obrigado. Caminhei em direção ao metrô. Já era de manhã e eu precisava descansar. Ajeitei o cabelo com as mãos, embora soubesse que minha aparência não melhoraria nada com aquele cuidado. Passei as catracas e virei à direita e desci a escada. Fui degrau por degrau vendo as pessoas se desviarem de mim como quem despreza um resto de comida depois de uma refeição farta. Deixei o trem que estava na estação sair e esperei o outro por rápidos instantes. Quando senti o vento do trem que se aproximava e a excitação das pessoas atrasadas para o trabalho, não tive dúvidas e dei dois passos à frente. Ainda tive tempo de ouvir uma gritaria seguida de total silêncio. Existem várias maneiras de explicar o que não se entende. Uma delas é dizer que entendeu. Nota do Editor: Fábio de Lima é jornalista e escritor, ou “contador de histórias”, como prefere ser chamado. Está escrevendo seu primeiro romance, DOCE DESESPERO, com publicação (ainda!) em data incerta.
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