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Opinião
02/09/2008 - 11h12
Penso, logo anulo
Dartagnan da Silva Zanela
 

"Os grandes só parecem grandes porque estamos ajoelhados". - (Pierre Joseph Proudhon)

Por que eu devo sentir-me obrigado a dar um voto de confiança para alguém que não é digno deste gesto? Por que eu devo confiar em alguém que não inspira a menor confiança? Julgamos que essas duas perguntas apontadas nas linhas iniciais deste modesto libelo são indagações que de modo algum devem ser caladas na (depre)cívica alma do povo brasileiro neste ano de 2008 da Graça de Nosso Senhor.

Fazer essas duas perguntas seria a atitude que toda pessoa decente deveria necessariamente fazer, pois votar, nada mais é do que atribuir a outrem um gesto de confiança de que este fulano irá dirigir a coisa pública de modo que venha a refletir os valores que você julga serem os corretos, os mais elevados.

Votar, neste sentido, não é apenas um ato de escolher de uma pessoa, ou de apoiar uma legenda partidária, não mesmo. Votar, antes de tudo, é um gesto de escolha de valores, um ato axiológico por excelência.

Isso mesmo, meu amigo. Os candidatos, cínicos ou não, os partidos políticos, putrefazes ou não, são apenas símbolos que representam os valores que nós, simiescos cidadãos brasileiros, escolhemos para refletir o que há de mais semelhante com a nossa fingida existência. Podemos dizer que em um processo eleitoral, temos a presença de inúmeros espelhos que nos são apresentados para que escolhamos em qual nós desejamos ver a nossa imagem refletida, nada mais e nada menos que isso.

Não? Ora meu caro amigo leitor, não seja hipócrita, ainda mais no obsequioso silêncio desta solitária leitura desta medíocre missiva. É praticamente impossível que no atual contexto a nossa classe política possa ser melhor do que a que se apresenta, visto que, nós, enquanto sociedade, somos tão torpes quanto eles. Se não é assim, então me diga por que não temos uma quantidade de políticos decentes proporcional ao número de brasileiros que se auto-declaram respeitáveis? Simplesmente porque, realmente, a quantidade é totalmente proporcional.

Nós, enquanto sociedade, fingimos uma decência da mesma forma que fingimos levar a sério tudo o mais em nossas vidas. Somos tão sérios no trato das coisas que merecem a nossa atenção que tratamos a democracia como se fosse uma grande festa, carnavalizando o pleito e transformando nossas escolhas em uma grande brincadeira de pessoas que cresceram apenas biologicamente e, por isso, julgam que tal avanço é o suficiente para se tomar decisões, mesmo que adotemos por prática sistemática a desinformação contínua como sinônimo de auto-consciência.

Por essa razão toda manifestação da sociedade civil (des)organizada contra a corrupção e demais bandalheiras sempre soa de maneira inócua junto a classe política de nosso país, visto que, eles conhecem muito bem a clientela deles. Aliás, eles nos conhecem muitíssimo melhor do que nós a nós mesmos.

Eles sabem muito bem do que é feito a alma do brasileiro médio, sabem muito bem que a palavra dignidade foi há muito tempo arrancada de nosso dicionário e se nós teimosamente insistirmos em fingir ser o que não somos continuaremos a ser muito bem representados, pois, nós, brasileiros, somos exatamente isso: uma sociedade de fingidos, de comediantes que encenam de tempos em tempos uma palhaçada eleitoreira em um palco com um dramático fundo civilizacional e decadente pensando que estamos realizando um grande épico. Tal qual nossa classe dirigente.

Por essas e outras que considero o voto nulo não um simples gesto de repúdio ou de protesto. Anular o voto, na atual conjuntura política é um gesto de auto-afirmação da própria dignidade enquanto valor que nos diferencia enquanto o que somos: seres dotados de razão. Obviamente que apenas anular o voto nada significa. Este gesto deve refletir o contrário da situação reinante e, tal reflexo deve necessariamente se dar em nossa conduta cotidiana. Do contrário, será apenas mais uma macaqueação do que se apresenta em meio à fauna política brasileira: mais um anão moral fingido ser um gigante ético.

Campanha de moralização deve iniciar em nossa morada íntima, em nossa própria consciência. O primeiro voto nulo que devemos sufragar é contra nós mesmos, para que realmente possamos com esse gesto irradiar algo de autêntico em nossa sociedade. Caso contrário, continuaremos a ser o que somos: apenas mais um fingido em meio a uma multidão de dissimulados.


Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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