Ao que tudo indica – tendo em vista as notícias veiculadas na imprensa - só se fez até o momento especular, em cima do possível volume de petróleo estimado pela Petrobras para a descoberta do Campo de Tupi na Bacia de Santos, e nada mais. Esse volume possível de hidrocarboneto é gigante quando comparado aos volumes possíveis estimados para outros nossos campos anteriormente descobertos, mas o que precisamos são respostas aos seguintes questionamentos: quanto efetivamente foi encontrado de hidrocarboneto recuperável e qual é a reserva com a tecnologia hoje disponível? E, no futuro próximo ou remoto, com a nova tecnologia a ser desenvolvida, o custo de produção permitirá a sua extração? Não temos ainda as respostas e vamos levar ainda algum tempo para obtê-las. Por isso, toda essa celeuma criada a partir da divulgação precipitada pela Agência Nacional de Petróleo – ANP da descoberta do Campo de Tupi e de seus desdobramentos (roubo de laptops, oscilação das ações na bolsa, criação da Petrosal etc.) é muito mais que uma simples especulação de mercado. Muito antes da descoberta de petróleo no Pré-sal... O super continente Gondwana (um único continente; uma única placa), formado há 520 milhões de anos A.P., permaneceu unido por cerca de 300 milhões de anos, quando começou a se quebrar nos blocos que formam os continentes atuais, segundo a Teoria da Tectônica de Placas. Uma dessas fissuras de blocos ocorreu no Período Cretáceo, há 135 milhões de anos, com o processo de abertura do Oceano Atlântico Sul e separação dos continentes africano e sul-americano, originando às bacias sedimentares da costa leste brasileira. Da fissura (rift) inicial, formada pela distensão da crosta continental, se formou um golfo que evoluiu para um oceano estreito, o qual foi se alargando, do sul para o norte, até o rompimento total da placa e o surgimento do oceano aberto. As bacias sedimentares (depressões na superfície da Terra preenchidas por sedimentos transportados por água ou pelo vento ou formados por precipitados químicos, resultantes do intemperismo e erosão de rochas pré-existentes) constituem o “habitat” natural do petróleo, daí a importância econômica do seu estudo geológico. Portanto, a origem da Bacia de Santos, como as demais bacias sedimentares da costa leste brasileira, está diretamente associada à separação dos continentes, e apresenta uma coluna estratigráfica, da base para o topo, formada por: I) Sedimentos de origem tipicamente continental depositados nas depressões iniciadas com a formação dos “rifts valleys” em bacias do tipo cratônica (no interior do continente) nas fases “pré- rift” e “rift”; II) Sedimentos da fase denominada de transição quando o mar começou a ingressar na fissura proto-oceânica (oceano estreito) com a deposição de pacotes espessos de sais (evaporitos); e, III) Sedimentos tipicamente marinhos já na fase de oceano aberto. Deste modo, os sedimentos abaixo do sal onde se encontram os reservatórios descobertos com petróleo na Bacia de Santos podem ter sido depositados no ambiente continental ou de transição, mas não no marinho franco. E quanto à origem do óleo: continental ou marinho? Se de origem marinha gerada em sedimentos acima das camadas de sal (Pós-sal) e ocorrendo em sedimentos continentais depositados abaixo das camadas do sal (Pré-Sal), o óleo migrou de onde, por onde e de que distância? Se de origem continental o volume possível estimado é plausível existir para esse tipo de bacia? Fatores que controlam a ocorrência de petróleo... Para a existência de uma acumulação de petróleo numa bacia sedimentar - descartada a hipótese do petróleo ser de origem inorgânica ou meteórica - se faz necessário a presença dos chamados “fatores que controlam a ocorrência de petróleo”, ou seja: I) Que sedimentos com matéria orgânica sejam soterrados a uma profundidade tal que a pressão e temperatura sejam apenas suficientes para transformar essa matéria prima em hidrocarboneto sem destruí-lo em seguida (presença de rochas geradoras de petróleo dentro da janela de maturação); II) Que haja um local para armazenar o hidrocarboneto gerado (presença de rochas reservatórios); III) Que o petróleo seja expulso da rocha geradora e migre para a rocha reservatório (associação adequada rocha geradora / rocha reservatório); IV) Que o hidrocarboneto fique aprisionando na rocha reservatório (existência de uma armadilha do tipo estrutural ou estratigráfica ou mista); V) Que o petróleo não continue a mover-se até a superfície onde seria degradado e destruído (presença de rochas selantes capeando as rochas reservatórios); VI) Que esses fatores ocorram numa dada ordem (relação temporal adequada entre armadilha/migração). Satisfeitas as exigências acima, resta quantificar o volume de hidrocarboneto existente na acumulação descoberta (cubar a jazida em termos de volumes possível, provável, recuperável e de reserva) e se a sua explotação (lavra) é economicamente viável ou não, com a tecnologia atualmente disponível. Para isso se faz necessário analisar detalhadamente cada um desses fatores e verificar como eles se inter-relacionam. Por exemplo: Qual é o tipo de rocha reservatório na qual se encontra o hidrocarboneto? A que profundidade se encontra o reservatório? O reservatório possui pressão anormal para esta profundidade? A porosidade encontrada na rocha reservatório é primária ou secundária? De quanto é essa porosidade? E quanto à permeabilidade/transmissibilidade no reservatório? Qual é a extensão da acumulação? Qual é a coluna ou espessura de rocha reservatório com hidrocarboneto. Qual é o tipo de mecanismo de produção do reservatório, ou seja, como o reservatório produzirá? Qual é o tamanho do campo? Encontra-se totalmente delimitado pelos poços pioneiros adjacentes perfurados a redor do poço pioneiro descobridor? E muitos outros questionamentos mais, necessitam ser feitos e respondidos antes de se divulgar a descoberta de um campo gigante ou não, tratando-se de uma empresa com papéis negociados em bolsa de valores. Referências CAMPOS, C. W. M. Fatores que controlam a ocorrência de petróleo. Rio de Janeiro: PETROBRÁS; Brasília: UNB, 1976. Notas de aula de encerramento do Curso de Geologia do Petróleo oferecido pela Universidade de Brasília – UNB em 1976. CHANG, H. K; KOWSMANN, R. O. e FIGUEREDO, A. M. A. Novos conceitos sobre o desenvolvimento das bacias marginais do leste brasileiro. p. 269-290, Rio de Janeiro: Gávea, 1990. In: GABAGLIA, G. P. R. e MILANI, J. E. (Orgs.). Origem e evolução de bacias sedimentares. Rio de Janeiro: PETROBRAS, 1990. OJEDA, H. A. O. Estrutura, estratigrafia e evolução das bacias marginais brasileiras. In: XLIII Reunião técnica da ARPEL: Novos critérios e métodos na exploração petrolífera. Rio de Janeiro: ARPEL, 1981. Nota do Edito: Ivo Lúcio S. M. da Silva é geólogo de petróleo.
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