Não sei a razão porque resolvi chamá-lo de Ernestino. Talvez pelo nome lembrar um homem honesto. Seja pelo que for, lembro-me quando ele desfilou com um enorme nariz vermelho, na larga avenida, em um bloco nada carnavalesco que me chamou a atenção. Era uma grave greve. Estavam paralisados os serviços essenciais. O que são serviços essenciais? Aqueles que necessitamos em um determinado momento. Eu naquele momento precisava de um banheiro público, mas estavam fechados naquele dia, por falta de papel higiênico e desinfetante, com o agravamento dos baixos salários dos que ali trabalham. Os serventes estavam envolvidos no justo protesto por melhores condições de trabalho e direitos. Naquele desfile, além da comissão de frente, seguiam diversas alas, incluindo a enorme “Ala dos Professores”, que no carrinho alegórico de mão traziam um computador ultrapassado, uma velha lousa que, de preta, virou cinza, um pedaço de giz, cadernos rasgados e um ventilador quebrado. Ali estavam serventes da educação e cultura, que se não bastasse enfrentarem a falta de educação de alunos e a de cultura dos governantes – mulheres em sua maioria – enfrentavam o pejo de caloteiras, por deverem o armazém, e também as butiques. Afinal, a vaidade é de todos, não só da ex-ministra da Igualdade Racial. É isto. Uma igualdade social entre amarelos, brancos e negros. Todos merecem ter a igualdade de vestir roupa de marca, das melhores butiques e, pelo exemplo dado, até usar, indevidamente, cartões de crédito. O que me chamou a atenção em Ernestino foi o “grito de guerra”, parodiado de uma alegre marchinha de carnaval: “Quanto choro, quanta agonia / Mais de milhões de palhaços na Nação...” Se José Flores de Jesus, o popular compositor “Zé Kétti”, ouvisse Ernestino cantando, não só choraria pela Colombina, como choraria, também, por todos. E nosso personagem, inspirado na emoção e falta de a quem apelar, abriu a boca aos berros, com suor na pele, para ver se passava pelas janelas blindadas pelo ar-condicionado. Pelo menos ao povo, aquele povo, o bloco passava a mensagem. Há motivo: o fingido reajuste de salário mínimo, que é o máximo. Neste ano de 2008, o mínimo será reajustado em R$ 28,00, pouco mais de 7%. E respondam quanto subiu a gasolina desde maio de 2007? O que importa essa estatística? Assalariado vai de moto-táxi, de ônibus ou a pé. Os narizes dos palhaços são vermelhos, da mesma cor. E o corso vai passando, sem os carros, que buzinam no engarrafamento, pedindo passagem. Os motoristas não percebem nos manifestantes os narizes vermelhos e nem ouvem a voz já rouca de Ernestino, que segue repetindo: “Quanto choro, quanta agonia...” “A única oportunidade de pobre ir à frente é quando arranja emprego de motorista de carro de executivo”, lembravam os que os viam passando de nariz empinado, como se patrões fossem. E lá vão eles. E eu, que também ando a pé, no meio da multidão, não consegui o nome certo daquele homem de físico fraco e forte no grito. Fico aqui pensando em um enorme salão, do tamanho de uma nação de palhaços. Ou todos estão satisfeitos? Nota do Editor: Seu Pedro é o jornalista Pedro Diedrichs, DRT-398/BA, editor do jornal Vanguarda, de Guanambi Bahia... É jornalista investigativo, escritor, poeta, e adepto do humor. Também conhecido como “Jornalista do Sertão”. E-mail: seupedro@micks.com.br.
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