“É de fundamental importância procurar analisar uma política intervencionista por suas conseqüências como um todo; não apenas por seus efeitos no curto prazo, mas também no longo prazo.” (Mises) O terremoto financeiro segue causando destruição mundo afora, enquanto o governo americano tenta de tudo para salvar os mercados. Ele já injetou bastante liquidez, nacionalizou empresas em dificuldades, socorreu bancos, mas nada parece surtir o efeito desejável. A questão crucial é: será que o governo não é justamente parte do problema, e não da solução? Em momentos de crise grave como a atual, a busca por bodes expiatórios é muito comum. Os alvos de sempre acabam levando a culpa: os “especuladores” e o “livre mercado”. Mas a verdade é que podemos encontrar as impressões digitais do governo em todos os locais da cena do crime. Como diz o provérbio africano, “não olhe para onde você caiu, mas sim onde você escorregou”. Parte das causas dessa crise financeira pode ser localizada nas medidas do Federal Reserve (Fed) em 1998. Enquanto o mundo enfrentava as crises da Ásia e da Rússia, o banco central americano participou de uma operação de salvamento do Long Term Capital Managment. A idéia por trás do resgate era a mesma de sempre: o fundo era “grande demais para quebrar”. Quando o governo garante o capital daqueles que arriscaram demais e erraram, ele funciona como uma espécie de rede de segurança de um circo. Ora, parece evidente que os trapezistas irão ousar mais sabendo que em qualquer erro há uma rede para protegê-los. Era a chamada “garantia Greenspan”. Além disso, Alan Greenspan, o então presidente do Fed, partiu para um agressivo programa de corte de juros. A taxa básica chegou ao patamar de 1% ao ano. A expansão monetária inundou o mundo de dólares. A injeção de liquidez é análoga ao bêbado que consome mais bebida para evitar a necessária ressaca. No longo prazo, ele acaba com uma cirrose. Eis o que os economistas chamam de “moral hazard”, um tipo de convite à irresponsabilidade, como um pai que sempre está lá para livrar o filho de seus erros. O filho nunca irá aprender, e a tendência é abusar ainda mais da sorte. A drástica redução da taxa de juros criou um incentivo à busca por mais risco pelos investidores. Como a criatividade dos mercados financeiros é enorme, e inteligência não falta, vários produtos “exóticos” foram criados. Pessoas que não tinham condições de comprar casas antes passaram a desfrutar de veículos facilitadores para obter hipotecas de alto risco. Além disso, a garantia estatal por trás das gigantes imobiliárias Fannie Mae e Freddie Mac, fez com que estas empresas assumissem um grau de alavancagem absurdo, que seria inviável sem o respaldo do governo. Essas empresas foram criadas pelo governo, e já funcionavam como semi-estatais. As agências de risco, com graves conflitos de interesse, já que tinham que avaliar o risco de seus próprios clientes, foram bastante negligentes em sua tarefa. As principais emoções que determinam os rumos dos mercados são medo e ganância. Com a rede de segurança criada pelo governo, o medo foi reduzido. E com a injeção de liquidez e baixos juros, a ganância foi estimulada. O resultado disso tudo foi uma redução significativa da aversão geral ao risco. O crédito foi subindo de forma irresponsável, com o estímulo dado pelo próprio governo americano. Existem vários outros fatores, sem dúvida, pois se trata de um fenômeno complexo. Mas o resumo da história é aproximadamente este. Alguns apontam o dedo para a falta de regulação estatal, e pedem muito mais regulação como solução. Estas pessoas ignoram duas coisas básicas: em primeiro lugar, o epicentro da crise estava justamente em locais mais regulados, como as gigantes hipotecárias e os bancos de investimento, enquanto os hedge funds se saíram razoavelmente bem; em segundo lugar, burocratas são seres humanos imperfeitos também, que reagem às mesmas emoções de medo e ganância, e buscam interesses particulares. Para piorar, os melhores cérebros quase sempre estão no setor privado, por causa do seu mecanismo de remuneração mais agressivo. Parece ingenuidade demais contar com uma suposta clarividência dessa gente para antecipar e, pior ainda, consertar todas as falhas da “exuberância irracional” dos investidores. Ora, vimos que as ações de Greenspan ajudaram a criar essa crise! Depositar nos agentes do governo um poder arbitrário para “tomar conta” do mercado pode ser o caminho da desgraça total. Mas, diante da situação caótica atual, em parte plantada pelo governo, todos voltam a atenção para o eterno “messias salvador”: o próprio governo. Investidores demandam medidas urgentes para resgatar bancos em dificuldades, exigem mais liquidez, enfim, cobram o uso efetivo da rede de segurança que foram levados a acreditar que estaria lá numa crise. Vários excessos foram cometidos, mas ninguém quer pagar a conta. Como já foi dito, é o socialismo dos ricos, onde os lucros são privados, mas os prejuízos acabam socializados. O pagador de impostos é chamado para honrar a fatura da festa dos outros. Os argumentos de antes são novamente utilizados: as empresas são grandes demais para falir, o mercado não pode se auto-regular e necessita da ajuda estatal. Por trás desta demanda está a crença falaciosa de que o governo cria riqueza do nada, que pode produzir recursos num piscar de olhos. Não pode. Tudo o que o governo pode fazer é tirar de alguns e dar para outros. Será que é mesmo necessário – sem falar justo – tirar dinheiro dos indivíduos poupadores para limpar a sujeira dos excessos cometidos em Wall Street e estimulados pelo governo? Nota do Editor: Rodrigo Constantino é economista formado pela PUC-RJ, com MBA de Finanças no IBMEC, trabalha no mercado financeiro desde 1997, como analista de empresas e depois administrador de portfólio. Autor de dois livros: Prisioneiros da Liberdade, e Estrela Cadente: As Contradições e Trapalhadas do PT, pela editora Soler. Está lançando o terceiro livro sobre as idéias de Ayn Rand, pela Documenta Histórica Editora. Membro fundador do Instituto Millenium. Articulista nos sites Diego Casagrande e Ratio pro Libertas, assim como para os Institutos Millenium e Liberal. Escreve para a Revista Voto-RS também. Possui um blog (rodrigoconstantino.blogspot.com) para a divulgação de seus artigos.
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