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Crônicas
25/09/2008 - 07h03
Lima e os livros
Galeno Amorim
 

Nascido menino pobre no Desemboque, no interior de Minas, Ariclenes sonhava com a cidade grande. Queria trabalhar no rádio e conhecer as cantoras famosas, que eram os grandes ícones da vida nacional.

Só que Ari vivia num lugarejo longe de tudo e de todos, num mundo completamente oposto àquele que imaginava para si. Mas não conseguia vislumbrar a chave que mudaria a sua vida. E enquanto a sorte grande não chegava, ajudava o pai na lida do gado e vendia fotografias da mãe, uma atriz de circo.

Até que certo dia subiu num caminhão rumo a São Paulo decidido a botar o pé na estrada, como tantos ali já tinham feito. Haveria de ter um lugar ao sol para ele.

Aos 16 anos, Ari apeou em Ribeirão Preto, na metade do caminho. Ficaria uns tempos por lá até que chegasse a hora de ir de vez para a Capital. Foi viver em pensão e arrumou emprego de carregador numa loja de materiais de construção.

Os novos ricos que aos poucos assumiam o lugar dos barões do café impunham um novo surto de progresso. Erguiam casas e faziam surgir uma nova cidade, com suas primeiras fábricas e um agronegócio latente.

E, sendo assim, toma mais mercadoria nas costas do garoto.

Por isso, foi uma verdadeira benção aquele santo dia em que os livros despencaram na vida dele. Tudo começou com a idéia fixa de fugir um pouco do sol extenuante que parecia tornar ainda mais pesada a carga que trazia no ombro.

De repente, empacou diante do belo casarão da praça XV, botou no chão a privada que levava nos braços e espiou para se certificar que ninguém olhava.

Precisava descansar e tomar fôlego antes de seguir adiante.

De costas para o Theatro Pedro II, a majestosa casa de ópera do país dos coronéis, tomou a decisão mais sábia da sua vida: entrou! Lá dentro, porém, levou um susto: o velho solar dos Junqueira agora era uma biblioteca.

No meio daquela gente estranha – poetas e alunos do Ginásio do Estado, ele pensou – achou que devia ao menos disfarçar e fazer de conta que estava lendo. Afinal, não seria tão pior do que o que esperava por ele lá fora...

Dito e feito. Tomou o primeiro livro à mão e leu o título, em letras garrafais: Grandes Esperanças, de Charles Dickens. Folheou algumas páginas e teve vontade de espiar melhor. Gostou do que viu. Leu mais umas. Quando deu por si, havia lido muitas delas. Já não conseguia parar. Daquele dia em diante, os livros nunca mais saíram da sua vida.

Era, afinal, a chave que tanto procurara.

No primeiro teste para locutor, tropeçou no sotaque caipira. Mas não desanimou. Logo arrumou emprego de office-boy na Rádio Difusora de São Paulo e, em seguida, seria promovido para operador de som e sonoplasta. Os livros eram a sua companhia constante. Um dia surgiu a chance de fazer ponta numa radionovela e ele a agarrou.

Meio século depois, e ainda um leitor voraz, Lima Duarte (afinal, Ariclenes Venâncio, seu nome de batismo, não era lá, como ele próprio dizia, nome de artista que se prezasse) não tem nenhuma dúvida. Do alto da glória justamente conquistada, o ator diz que os livros foram a sua tábua de salvação.

- Eu era só um analfa... – diverte-se ele, enquanto procura na estante um novo livro para ler.


Nota do Editor: Galeno Amorim (www.blogdogaleno.com.br) é jornalista e escritor.

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