Os tropeços dessa delicada relação
Pais de diferentes gerações são assaltados por dúvidas clássicas e muito procedentes... O andador favorece ou prejudica o bebê? Qual é o calçado mais indicado para as crianças? Serei taxativo na resposta para a questão do andador. O andador não é indicado, pois compromete o desenvolvimento psicomotor da criança. Para entender melhor o que isso significa, basta pensar que durante o processo de crescimento, o bebê passa por etapas fundamentais para o desenvolvimento motor e neurológico. Ao engatinhar e explorar o ambiente, a criança está desenvolvendo todo um conjunto de músculos e vivenciando sensações importantes para o seu crescimento. O andador elimina todas essas etapas e ainda faz com que a criança “caminhe” na ponta dos pés, correndo o risco de deformar a estrutura óssea da perna. Não é apenas isso! Os acidentes causados por andadores podem causar lesões sérias, especialmente na cabeça. Como último argumento, cito a falsa liberdade concedida à criança pelo andador, que deixa os pais apartados do delicioso processo de segurar o bebê, ser literalmente o seu guia nos primeiros passos da vida. No que se refere aos calçados mais indicados, recentemente li uma matéria sobre os sapatos “Heelarious” – junção de heel (salto) e hilarious (hilário) – empresa norte-americana que criou uma série de modelos de sapatos de salto alto para bebês de até seis meses. Comercializados pela internet para os Estados Unidos, Canadá e Suíça, esses calçados custam em média US$ 35. É claro que não são adequados para o uso e funcionam como “enfeites”, mas tornaram-se uma alegoria do equívoco e da falta de informação sobre o assunto. Milhares de pessoas compram sapatos para crianças de todas as idades com base na beleza, no charme da peça. Poucos sabem que cada idade – e fase do crescimento infantil – pede um modelo adequado de calçado. Os bebês, por exemplo, não precisam de sapatos. As meias são suficientes para manter os pés protegidos. A estrutura dos pés dos bebês, normalmente sem arcos, é muito frágil; apenas pequenas partes do esqueleto do pé e do tornozelo possuem ossos, ou seja, a maior parte é formada por cartilagens e os ligamentos são elásticos. Essa delicadeza requer cuidado com sapatos pouco flexíveis. O sapato começa a ganhar o status de fundamental na vida da criança no primeiro ano de vida, momento a partir do qual a troca deve ser realizada a cada três meses. Nessa fase, o ideal é optar por sapatos de couro ou tecido macio, que deixem os pés ventilados e que não saiam dos pés com facilidade. Os pais devem valorizar um solado que não derrape, pois até os dois anos, os tendões são muito flexíveis e a musculatura não está firme. Os pais também vão observar que a partir dos dois anos, o arco do pé começa a aparecer. Dos quatro aos sete anos, a opinião das crianças começa a contar. É nesse momento que os pais devem ser firmes e procurar combinar beleza e saúde na hora de escolher um modelo. Mais uma vez, priorize os modelos fabricados com materiais flexíveis, anatômicos e com espaço suficiente para acomodar os pés sem limitar a flexibilidade. A numeração deve ser adequada! Usar um sapato apertado ou largo demais prejudica o crescimento do pé, pode causar problemas de postura e comprometer a coluna. Sabemos que os pés das crianças crescem rápido e que muitos pais optam por comprar modelos maiores para aumentar a vida útil do calçado. Esse é o tipo de economia que deve ser evitada! O ideal é comprar, no máximo, dois pares de qualidade e tamanho adequados. No caso das meninas – cujos pés crescem mais rápido do que o dos meninos –, muita atenção com os modelos com saltinhos, que são totalmente inadequados para a fase de crescimento e para o estilo de vida infantil, já que as crianças correm e pulam o tempo todo. Na hora de comprar os sapatos para as crianças, valem as dicas básicas que devem ser adotadas em qualquer idade: - escolha um modelo confortável e anatômico; - dê atenção para o tamanho, que não pode ser justo nem grande demais; - não force os pés da criança para calçar os sapatos; - priorize modelos com parte interna reforçada no solado para evitar impactos desnecessários com o solo; - não ceda ao apelo infantil de trocar o conforto pela beleza. Nota do Editor: Dr. Fabio Ravaglia é médico ortopedista graduado pela Escola Paulista de Medicina (Unifesp) com residência médica no Hospital do Servidor Público Estadual, especialização em coluna vertebral Instituto Arnaldo Vieira de Carvalho (Santa Casa de Misericórdia de São Paulo) e mestre em cirurgia pela Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.
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