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Opinião
08/11/2008 - 06h00
São Francisco não era franciscano
Mario Guerreiro - Parlata
 

Muita gente ainda confunde “conservador” com “atrasado”. Conservador é aquele que tem grande apreço pela história, pela tradição e pelas instituições: ele quer conservar o que é bom, mas mudar o que é ruim.

Por um lado, ele contrasta com o modernoso, que quer mudar pelo simples gosto da mudança, não importando se o que está em jogo é bom ou ruim. Por outro lado, ele contrasta com o atrasado, que não deseja nenhum tipo de mudança, seja a mesma de natureza estrutural e até mesmo de natureza conjuntural caracterizada por imprescindíveis reformas sociais.

Neste contexto, há um provérbio que não só demonstra grande prudência como também aguçado espírito crítico: Be not the first to put the old aside, be not the last by whom the new is tried, ou seja: “Não seja o primeiro a pôr o velho de lado, não seja o último a experimentar o novo”.

Entre outras coisas, devemos fazer isso quando um produto tecnológico novo é lançado. Ao invés de açodadamente adquiri-lo, devemos dar um tempinho e deixar assentar a poeira... Ele pode ter graves defeitos que posteriormente serão detectados e corrigidos. Dizendo tal coisa, eu tinha em mente novos programas de software, porém o crivo do tempo é sempre o melhor teste para qualquer produto ou idéia novos.

Abro o Jornal do Commercio em 20/10/2008 e leio uma pequena, porém altamente significativa notinha:

“Com críticas à transposição do Rio São Francisco e à produção de biocombustíveis, cerca de 500 franciscanos [i.e.: membros da Ordem Franciscana, não habitantes das margens do Rio São Francisco] e religiosos foram recebidos ontem pelo vice-presidente José Alencar [obs. nossa: nenhum parentesco com José de Alencar, um escritor liberal e muito inteligente] no Palácio do Planalto no encerramento das comemorações do oitavo centenário do Carisma Franciscano – data em que seguidores de São Francisco de Assis lembram o início da doutrina em todo o mundo”.

“Os religiosos entregaram ao vice a ’Carta de Brasília’ na qual condenam o ’uso abusivo de biocombustíveis’ [obs. nossa: Fidel Castro e Hugo Chávez também já fizeram idêntica condenação, porque seus países não detêm a tecnologia para a produção desses produtos concorrentes com o petróleo, porém sob a pífia alegação de que a produção de biocombustíveis produziria escassez de grãos e fome] que se tornou uma das principais bandeiras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na defesa da produção de etanol [obs. nossa: coisa esta que correrá o risco de gerar mais um monopólio estatal controlador de preços e cabidão de empregos: a Etanolbras]. No documento, os franciscanos também criticam os ’lucros abusivos do mercado econômico’ e o modelo capitalista neoliberal”. Vade retro, Satanás!

Assim como o comilão compulsivo por mais que coma, nunca está satisfeito, o insensível e ganancioso capitalista não coloca limites para seu exorbitante lucro, tornando-se, assim, um adorador de Mamon, o bezerro de ouro. Quanto ao modelo capitalista neoliberal, dizem que este é concentrador de renda, excluidor e anti-igualitarista e, por isso mesmo, deve ser substituído pelo socialismo em que todos os homens são iguais..., embora uns poucos – privilegiados membros da Nomenklatura - sejam “mais iguais” do que os muitos outros...

Espírito admirável por suas belas virtudes, São Francisco de Assis não era franciscano, nunca fundou a ordem que levou seu nome. Era um seguidor de Cristo e, enquanto tal, que nunca buscou seguidores. Ora, se as pessoas decidiam segui-lo, não seria ele quem as rejeitaria, espírito acolhedor, bondoso e compreensivo que sempre mostrou sobejamente ser.

Quem era franciscano era Leonardo Boff antes de largar a batina em virtude do puxão de orelha dado pelo então cardeal Joseph Ratzinger, Prefeito da Sagrada Congregação da Fé. E os líderes dessa ordem parecem mais seguidores da audácia do Boff e da teologia da libertação, mistura espúria de marxismo e cristianismo.

Além disso, São Francisco de Assis não era modernoso nem atrasado, mas sim um conservador inteligente. A maior prova disto é sua conhecida exortação: “Senhor, dai-me forças para mudar o que deve ser mudado, não tentar mudar o que não pode ser mudado, e saber distinguir a diferença entre ambos” – diferença esta que os franciscanos, se algum dia souberam perceber, hoje já não mais sabem.

Eles começaram como precursores da mentalidade científica moderna, com as notáveis figuras de Roger Bacon (1168-1253) e Robert Grosseteste (1214-1292) e acabaram cultivando o marxismo de batina e água-benta [a expressão é de Roberto Campos] dos corifeus ex-frei Boff e frei Betto, a autêntica e verdadeira vã guarda do atraso!

Como se costumava dizer na década de 60 do século passado, sob a inspiração do nome de famosa peça teatral da época: Greta Garbo, quem diria, acabou no Irajá! (*)

(*) Notinha para os não-iniciados: Greta Garbo era uma charmosa atriz sueca de antanho que faz grande sucesso em Hollywood por seu olhar misterioso. Sem nenhum charme, Irajá é um subúrbio do Rio de Janeiro bastante conhecido por seu cemitério cercado por um casario velho.

Apêndice: Um canal separa dois mundos

Para a maioria das pessoas no nosso tempo, a afirmação de que a doutrina religiosa foi “a parteira do método experimental” soa tão falsa como a de que a raposa foi contratada pelas galinhas para tomar conta do galinheiro.

No entanto, por incrível que pareça, a referida afirmação é historicamente correta. A maioria dos historiadores aponta Roger Bacon e Robert Grosseteste - dois monges franciscanos e professores de Oxford - como os precursores da metodologia da ciência experimental (F. Copleston: History of Philosophy, vol. 2, parte II, pp. 164-182). Como é sabido, S. Francisco de Assis (1182-1226) - ele mesmo um dos precursores da mentalidade renascentista - pregava a humildade e o amor pela natureza vista como uma grandiosa obra de Deus.

No Continente, os monges franciscanos entenderam que não era preciso conhecer a natureza para amá-la, mas na Inglaterra eles entenderam que quanto mais conhecessem suas leis, mais a amariam. Se suas leis foram criadas por Deus, o conhecimento delas era um conhecimento da ação divina no mundo. E como veremos adiante, Moisés Maimônides (1135-1204), autor do Guia para Os Perplexos, afirmava que, se não podemos conhecer Deus pelo conhecimento da sua essência, podemos conhecê-lo pelo conhecimento das suas ações.

Embora tenhamos sérias dúvidas a respeito da idéia de que o conhecimento da natureza possa conduzir ao de Deus, não temos a menor dúvida de que essa atitude desejosa de conhecê-la foi extremamente benéfica para o desenvolvimento da ciência experimental, que, por sua vez, trouxe inegáveis benefícios para a humanidade. [excerto de Mario A. L. Guerreiro: Deus Existe? Uma investigação filosófica. Londrina. Editora UEL. 2000, pp. 5-6].


Nota do Editor: Mario Guerreiro (xerxes39@gmail.com) é Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor Adjunto IV do Depto. de Filosofia da UFRJ. Ex-Pesquisador do CNPq. Ex-Membro do ILTC [Instituto de Lógica, Filosofia e Teoria da Ciência], da SBEC. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Membro Fundador da Sociedade de Economia Personalista. Membro do Instituto Liberal do Rio de Janeiro e da Sociedade de Estudos Filosóficos e Interdisciplinares da UniverCidade. Autor de obras como Problemas de Filosofia da Linguagem (EDUFF, Niterói, 1985); O Dizível e O Indizível (Papirus, Campinas, 1989); Ética Mínima Para Homens Práticos (Instituto Liberal, Rio de Janeiro, 1995). O Problema da Ficção na Filosofia Analítica (Editora UEL, Londrina, 1999). Ceticismo ou Senso Comum? (EDIPUCRS, Porto Alegre, 1999). Deus Existe? Uma Investigação Filosófica. (Editora UEL, Londrina, 2000). Liberdade ou Igualdade (Porto Alegre, EDIOUCRS, 2002).

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