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SEÇÃO
Crônicas
10/11/2008 - 15h04
A dor que não sai no jornal
Urariano Mota
 

Há uma revolta silenciosa, há uma surda vingança dos excluídos no Brasil. Nada patológica, nada absurda, nada que espante, ainda que choquem e causem repulsa os efeitos dos monstros criados. Quando houve uma intoxicação geral do Blue Tree Park, em Pernambuco, ninguém perguntou por que os empregados do Hotel não foram também intoxicados. Era e é natural. Se eu, empregado, nado com fome em meio ao filé, por que dele também não retiro um pedaço? Mas não, não se soube de vítimas entre cozinheiros e garçons. Por quê? A hipótese mais provável é que do cardápio servido não comeram para matar a fome. Com a minha experiência, digo que certamente provaram, furtaram pequenos, muito pequenos nacos, tão pequenos quanto as suas pessoas. Mas comer, comer e se envenenar à farta, não. Isto ficou para os Doutores.

Temos visto em restaurantes como as pessoas da nossa classe média tratam a pessoa pequena – gentinha - que lhes serve. Que desprezo! O cidadão de direitos não olha para o empregado que existe sem qualquer garantia. Dirige-lhe, melhor dizendo, rosna, vocifera o prato escolhido e se mantém raivoso, hostil, perigoso e áspero a qualquer aproximação. Pelas carnes gordas e carantonha tais Pessoas – de P maiúsculo – nos lembram sempre um buldogue, sem coleira sentado em frente à mesa de um circo. Imaginamos sempre a mágoa que fica num homem tratado assim por um cão, que é machucado em uma sociedade de classes.

Menos que imaginamos, às vezes vemos, percebemos, sentimos. Quando vamos comprar frios, queijos, sentimos. E aqui a nossa experiência particular deve ter algo de universal. É flagrante a má-vontade com que um empregado ou empregada nos atende, é acintosa a indiferença e dificuldades que opõe a qualquer consideração sobre tipo ou maciez do queijo escolhido. “Só tem este.... Tem não... Acabou”, diz-nos, a custo. É grande a pena, a mesquinhez com que corta fatias que, sobrepostas, muito demoram a atingir o peso dos frios que pedimos. Isto em lugar de causar alguma raiva, muito nos envergonha. Porque sabemos que o empregado nos serve o que não poderá comer. A não ser por furtos, por pequenos e miseráveis furtos, como se fosse um mísero e pequeno roedor.

A face do empregado que declara, “Tem não... Acabou... Só tem este”, guarda um ar de vitória. Esta é a sua melhor hora. Uma feliz compensação do desabastecimento.


Nota do Editor: Urariano Mota é pernambucano. Escritor, jornalista, publicou o romance Os Corações Futuristas, cuja paisagem é a ditadura Médici.

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