A cada dia, é mais nítida a fragilidade do acuado poder constituído. O crime organizado, antes retraído e preocupado apenas com a renda dos seus ilícitos, nos últimos anos, com toda ousadia, passou a confrontar a autoridade e a caçar implacavelmente os seus agentes. Policiais de todos os segmentos são obrigados a esconder sua identidade profissional para não sofrer represálias e, mesmo quando em atividade, são desafiados e confrontados pelos criminosos, que utilizam veículos, armamento e até logística melhor do que a oferecida pela organização policial. Em pânico, São Paulo viveu no último final de semana uma verdadeira tragédia, com policiais e cidadãos mortos e feridos em confronto da polícia com bandidos que, em outras épocas, se ocupariam apenas de fugir e não em tentar matar e aterrorizar aqueles que os perseguem em nome da lei. E o pior é que as autoridades, com medo, fazem questão de ignorar essa inversão de valores e, hipócritas, ainda arriscam o surrado discurso citando suas "realizações" no setor da segurança pública. Já foi dito inúmeras vezes que "o PCC acabou", mas a facção criminosa continua ativa, dominando a maioria dos presídios e mostrando sua cara desafiadora também fora das grades, onde promove o tráfico de drogas, comanda assaltos e seqüestros, persegue e mata seus desafetos e, até policiais. O Brasil carece de uma política de segurança pública definida e eficiente. Governos, congressistas e a sociedade precisam trabalhar rápida e seriamente em busca do equilíbrio perdido. As organizações policiais têm de receber recursos suficientes para cumprir sua missão, o Judiciário deve ser inflexível na exigência de cumprimento das leis e a própria legislação precisa ser revista nos pontos em que favorece a impunidade. Se o indivíduo tiver a certeza de que, delinqüindo, será efetivamente punido, a tendência é a criminalidade diminuir. Da forma que tem sido tratada pais afora, a segurança pública só poderia entrar em crise. Governos relapsos deixam de cumprir suas obrigações para com a população, especialmente a da periferia, dando margem para o crime organizado assumir o lugar do Estado e, com isso, exercer indevidamente a autoridade. A falta de investimentos operacionais e o arrocho salarial nas polícias leva os policiais ao comprometido bico, à desmotivação e até à greve (como ocorre na Polícia Civil de São Paulo) e, mesmo assim, os governos diante do atual estado de terror imposto pelos marginais permanecem insensíveis, como se a solução não fosse de sua obrigação. Para problematizar ainda mais, o setor ainda sofre nítida interferência política, especialmente nos casos de maior repercussão - como no recente seqüestro de Santo André - onde até supostos interesses eleitorais suplantaram a atividade policial. Pelos impostos que paga, a população tem direito a uma segurança pública eficiente que, infelizmente não vem recebendo. Até quando continuaremos vítimas da politicalha e da ineficiência? Quantos inocentes ainda precisarão morrer para que algo de concreto seja feito para a retomada do elo perdido? Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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