- Vou me casar, Silva.
- Você fala isso há 10 anos, Flávio.
- É! Mas agora é sério!
- Das outras vezes também.
- Mas agora é sério de verdade. Vou me casar com a Rosália.
- Com a Rosa?!
- O nome dela é Rosália, Silva.
- Peraí, Flávio, a Rosa é puta!
- Era, Silva! Escutou? Era! Agora vai ser minha mulher! E eu quero respeito com ela, entendeu?
- Flávio, você está de brincadeira, né?

Flávio estava com mais de 30 anos e nunca havia conhecido um bordel, uma boate ou um puteiro – dê o leitor o nome que quiser para um lugar do tipo. Então, escutando alguns amigos do trabalho, que visitavam com freqüência essas casas de diversão masculina, resolveu ir pela primeira vez. Lá sentou numa mesa, tomou algumas caipirinhas e achou aquele o lugar mais gostoso que já conheceu na vida.

As garotas eram bonitas e desinibidas. Ele, até então, achava que só pelo fato delas serem prostitutas eram mulheres incultas – amebas em forma de gente. Mas qual não foi sua surpresa ao perceber que eram mulheres, em grande parte, com formação universitária. Até aí nada demais, porque tem pessoas com nível universitário que mal sabem escrever o nome. Mas as meninas eram inteligentes, simpáticas, divertidas, perspicazes e irônicas. Flávio passou a ir ao puteiro três vezes na semana, pelo menos.

Um dia Flávio experimentou uma garota nova na casa. Ela era experiente de profissão, mas que acabava de chegar ao Girl Bar. Uma nova contratada do lugar. Tratava-se de Rosália, 27 anos e mais de 10 de profissão. Ela era formada em jornalismo e se expressava muito bem, embora seu apartamento e carros (tinha 2) – não tivessem sido comprados com muitas palavras, mas sim com muitos gemidos. Ela ganhava a vida na horizontal e não tinha vergonha nenhuma em dizer isso.

Com o passar de algumas semanas Flávio só ia para a cama com Rosália. Ele pedia desculpas para as outras garotas, mas esperava quanto tempo fosse preciso para fazer sexo com Rosália. Até aí nada demais, porque num puteiro isso acontece sempre. É muito comum um cliente se apaixonar por uma prostituta. Mas o estranho é que depois de algum tempo Rosália também fazia questão de ir para cama com Flávio. Ela até dispensava clientes quando a hora de Flávio chegar ao Girl Bar se aproximava.

No começo todo mundo achou aquilo engraçado. Depois todos viram se tratar de algo sério, com sentimento verdadeiro. As amigas de Rosália apoiaram o romance. Os amigos de Flávio acharam uma loucura aquilo, mas silenciaram sobre o que estava acontecendo. E, depois de nove meses com essa história, Rosália se demitiu do Girl Bar. Muita gente achou que ela havia ido trabalhar em outra casa. Ela mesma deu essa desculpa na hora que foi embora.

- Eu não estou de brincadeira não, Silva.
- Mas que doideira, Flávio. Você é um cara tão careta. Você combina as cores das roupas que usa. Você fala o português todo certinho, sem abreviações ou gírias. Você é o único cara no mundo que me chama pelo sobrenome. Meu nome é Jairo, porra! E vai se casar com uma puta?!
- Puta que pariu, eu já não falei para você não chamá-la assim?
- Olha aí – até palavrão você está falando agora, porra! A Rosa virou sua cabeça mesmo!
- É Rosália, já falei!
- Uma puta!
- Ela não é mais.
- Ex-puta? Porra, vá tomar no cu – Flávio! Era só o que me faltava!

Rosália virou dona de casa. Passava o dia arrumando a casa e nas horas vagas pintava quadros de paisagens mortas. Mostrava-se uma artista talentosa. À noite preparava o jantar para ela e Flávio. Eles conversavam sobre tudo, davam risadas, mais tarde faziam amor e dormiam felizes. Eram amigos, amantes e namorados. Ambos estavam felizes como nunca estiveram durante suas vidas.

- Eu pensei que você ia me entender, Silva. Você é o meu melhor amigo. Mas se nem você me entende, ninguém vai entender nada mesmo.
- Porra, cara. Eu não te entendo mesmo. Estou sendo sincero. Você é um cara bem-sucedido, culto pra caralho, bem-apessoado...!
- Silva, eu estou muito feliz.
- Poxa, você tem certeza?
- Tenho.
- Então, tá! Eu ainda acho que você está fazendo merda, mas se você está feliz, porra, fico feliz também! Você é meu amigo pra caralho, Flavinho! Espero que a Rosa..., Rosália, Rosália eu disse! Bem, espero que ela te faça feliz sempre.

No dia 27 de janeiro de 2008, às 17h00, Flávio e Rosália se casaram na Igreja Nossa Senhora da Lapa, uma igreja do começo do século XX, na Zona Oeste de São Paulo. Agora, em novembro, Rosália completou cinco meses de gravidez. O casal preferiu não saber o sexo do bebê, mas já decidiu que se for menino se chamará Flávio Jr. e se for menina se chamara Ana Beatriz. Os amigos e familiares não se cansam de repetir nunca terem visto um casal tão feliz.

Nota do Editor: Fábio de Lima é jornalista e escritor, ou “contador de histórias”, como prefere ser chamado. Está escrevendo seu primeiro romance, DOCE DESESPERO, com publicação (ainda!) em data incerta.