Estás agora entre teus humanos pares, toda a raia miúda que te circundou a vida inteira. E a bem da verdade nada diferes deles, nada mesmo. Por isso, talvez, estiveram sempre de acordo, coniventes... E a conivência, por excluir contradições, assemelha-se à solidariedade, não é? Confundiste os dois conceitos. Quiseste um dia acreditar que uns estendem a mão a outros, não é? Na certa, visavas ao conforto. E agora pagas o preço dessa ilusãozinha à toa que não resiste à mínima prova – um preço que te endivida até a penúria e que te arrasta humilhado ao tribunal. Vês? Não há como pagar a dívida, se já rapas o fundo do cofre e até tua filha, de todas a mais querida, rebola-se desavergonhada no colo dos credores para negociar a amortização! Estás sozinho e perplexo em pleno salão dos julgamentos. Pretendes a absolvição, eu sei. Mas quem te absolverá? Nota do Editor: Daniel Santos é jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de O Estado de S. Paulo e da Folha de S. Paulo, no Rio de Janeiro, além de O Globo. Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.
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