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26/11/2008 - 10h34
O que está por trás do discurso de Eunice Durham
Rui Alves Grilo
 

O texto de Eunice Durham publicado dia 23/11 no blog Ubatuba Víbora, longe de qualquer objetividade, é um exemplo da disputa de propostas educacionais entre o PT e o PSDB que, em alguns momentos foi tão acirrada, que durante o governo do Sr. Mario Covas, nas bibliografias de concursos e de cursos de formação de professores era vetada qualquer obra de Paulo Freire, ligado à tendência progressista libertária. Alegava-se que essa proposta não se preocupava com os conteúdos a serem transmitidos pela escola. A secretária de Educação era Guiomar Namo de Melo, uma das principais formuladoras das propostas tucanas e que participa da equipe do atual governo estadual.

Rebatendo essa crítica, Paulo Freire escreveu o livro “A Importância do Ato de Ler” e inúmeras obras onde afirma que o conhecimento e a ciência não são neutros. E quando a pesquisa se dá com seres humanos, ninguém deve ser encarado como objeto e nem poderá haver objetividade total porque sempre haverá as motivações e valores do pesquisador e do pesquisado e em algum momento haverá a interação entre ambos. Além disso, não podemos esquecer que, quase sempre, a prioridade do que se vai pesquisar depende muito de quem vai financiar a pesquisa e o retorno monetário que vai dar.

Quando se elabora um currículo, por trás está a idéia do homem e da sociedade que se quer formar. A sociedade e seus educadores não podem abrir mão do direito de escolher e definir os conteúdos a serem trabalhados e os conteúdos a serem atingidos. E de nada vale a escola se não for para transformar a sociedade.

Para Paulo Freire, não adianta a escola ensinar a ler e a escrever, se o educando não conseguir “ler e interpretar” a realidade que o cerca, percebendo o seu lugar e as forças que limitam a sua liberdade e a sua ação. A educação deve ser um instrumento para desvelar e revelar a realidade para que haja a transformação rumo a uma sociedade mais justa e mais humana. Para ele, não existe pessoa sem cultura porque a cultura e o conhecimento são construídos nas relações entre os homens e entre os homens e o mundo. O homem é o único ser que dá sentido e significado para as coisas. Quando o homem pega um pedaço de pau para aumentar a sua força e tirar uma pedra do caminho, o pedaço de pau ganha outro sentido, transformando-se em alavanca.

Para Paulo Freire, o conhecimento era uma construção social, que não está separada do método. Se uma escola tiver uma organização autoritária dificilmente formará cidadãos democráticos porque a vivência de valores democráticos é que permitirão a formação e introjeção desses valores. A obediência por medo de castigos não forma cidadãos autônomos. Tanto na Alemanha quanto na América Latina vimos os responsáveis pelo assassinato de milhares de pessoas alegarem que estavam cumprindo ordens. Será que é esse tipo de cidadão que queremos formar?

A entrevista de Eunice Durham, faz parte dessa disputa ideológica entre o PSDB e o PT. Se existe objetividade em seus textos, neste ela ficou no mesmo nível daqueles que ela ataca como chavões, repetição das críticas que se vêem nos jornais, sem qualquer profundidade. Ela afirma que a “bibliografia adotada nesses cursos (de Pedagogia), (está) circunscrita a autores da esquerda pedagógica. Eles confundem pensamento crítico com falar mal do governo ou do capitalismo. Não passam de manuais com uma visão simplificada, e por vezes preconceituosa, do mundo.” Nos vestibulares, é considerado um dos erros mais graves nas dissertações, a generalização, que é exatamente o que ela faz no texto. Qual é essa objetividade?

A Veja, tornou-se a principal porta-voz dos tucanos, veiculando uma série de críticas à escola pública, atacando principalmente os professores, seus sindicatos e as propostas educacionais baseadas em Paulo Freire.

Eunice Durham afirma que a causa do fracasso da escola é a má formação dos professores porque os cursos de pedagogia supervalorizam a teoria e não dão valor à prática. Quando Paulo Freire diz que “a leitura do mundo precede a leitura da palavra” ele diz justamente isso: que o conhecimento prático vem antes da teoria. Mas ele completa, que a teoria vai contribuir para avaliar e aperfeiçoar a prática. Embora Paulo Freire seja o educador mais conhecido e valorizado no exterior, aqui no Brasil foi boicotado e ridicularizado pela Folha e por um grupo significativo de intelectuais tucanos.

Ela diz que muitos professores novatos não sabem como executar as tarefas mais básicas da educação e, o pior: não reconhecem que estão despreparados para as funções. Também diz que eles sempre jogam a culpa no governo.

No entanto, é sabido que grande parte dos professores da rede pública são formados em escolas particulares e aqueles que tem melhor formação não permanecem na rede pública devido aos baixos salários.

Perguntamos: de quem é a responsabilidade pela abertura de faculdades sem condições? Quando ela participou do MEC, o que ela fez para mudar essa situação? Como o governo coloca para trabalhar alguém que não tem condições? Por que não se prevê um treinamento inicial antes de iniciar o trabalho? Quando um funcionário começa um serviço, recebe todos os instrumentos necessários: macacão, óculos de proteção ou outro instrumento necessário. Em várias escolas onde trabalhei, nem uma lousa decente e giz de cor necessário para ressaltar um detalhe do texto existia.

Após doze anos de governo do PSDB em São Paulo ainda vemos situações como a da Escola Amadeu Amaral. Para o professor Sérgio Kodato, coordenador do Observatório da Violência e Práticas Exemplares da USP de Ribeirão Preto, casos como esse decorrem da fragilidade do sistema pedagógico. "Grande parte dos alunos não vê sentido na escola. Para esses, a escola virou um grande clube, um local para amigos e paquera. Além da degradação da infra-estrutura das escolas públicas, houve também uma perda da autoridade da figura do professor e do diretor. Você pode ver que os alunos confrontam, batem nos professores e não se intimidam. Percebemos que hoje não há só atos de vandalismo. São atos organizados, planejados, aquilo que na época de movimento estudantil chamávamos de união e organização. A maior vítima das escolas é o processo pedagógico. Perdendo ele, boa parte dos alunos se perde também”.

Pesquisa realizada pela Udemo (Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São Paulo) em abril de 2008 revela que 86% de um total de 683 escolas estaduais entrevistadas relataram algum tipo de violência ocorrida em 2007. Portanto, o caso da Escola Amadeu Amaral não é um exceção mas a regra.

Em outro trecho ela critica alguns pontos centrais da pedagogia freiriana: a dialogicidade, a dialética e a participação. A postura autoritária dela é característica da administração tucana, que tem contribuído para destruição da auto-estima dos professores, expondo-os ao ridículo.

Segundo as ONGs Ação Educativa e Artigo 19, acumulam-se os casos de assédio moral usando os termos da Lei 10.621 como instrumento de pressão. Os relatos são corroborados por depoimentos de jornalistas que descrevem as dificuldades que encontram para entrevistar as professoras e professores, o que traz conseqüências, inclusive, para a própria formação do senso crítico do docente. Veja o depoimento abaixo:

“Eu queria dizer que nós aqui, a Rede Globo tentamos várias vezes gravar entrevista com professores da rede estadual. Mas o Estatuto dos Servidores Públicos do Estado, que é de 1968, portanto, da época da ditadura, proíbe que eles se manifestem pela imprensa sobre seus superiores e também sobre os atos da administração.”

Carla Vilhena, apresentadora do telejornal SPTV 1ª edição, TV Globo.

Hoje, o que se percebe como grande proposta do governo tucano é a unificação do material didático (apostilas e livros). No entanto, nem isso tem sido em número suficiente. O professor tem sido reduzido a mero aplicador de conteúdos decididos por outros.

E transformado em bode expiatório de todos os males do ensino.

(Fonte: Fala Educador! Fala Educadora.)

Rui Alves Grilo
ragrilo@terra.com.br


Nota do Editor: Rui Alves Grilo é professor em Ubatuba (SP).
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