O Terceiro Setor se comunica? Diante do crescimento exponencial do Terceiro Setor, há alguns questionamentos a serem feitos: tem ele se comunicado com a mesma proporção com que cresce? Como a grande imprensa pauta o Terceiro Setor? Alguns desses questionamentos foram abordados no livro “O quinto Poder – consciência social de uma nação”, da jornalista Lilian Dreyer, que traz entre outros assuntos, a comunicação e sua relação com as organizações do Terceiro Setor. Segundo a autora, as entidades do Terceiro Setor nem sempre são corretamente percebidas pela população brasileira, e é neste sentido que ela enfatiza a importância da imprensa. A maioria das instituições ligadas ao Terceiro Setor aponta um aumento no espaço que a mídia dedica à sua cobertura, principalmente sobre os temas relacionados à responsabilidade social e ambiental, porém ressalta que esta cobertura necessita de mais qualificação. Dreyer lembra que se o Brasil quer ser um país movido por cidadãos capazes de zelar pela boa gestão de seus recursos e de produzir estruturas que consigam acolher toda a população, sem exclusões, terá de empenhar-se pela abertura dos processos de comunicação. E para isto terá de superar uma defasagem histórica. Existe falta de clareza quanto à própria conceituação do Terceiro Setor, o que segundo a autora pode estar na origem de muitas incompreensões que se mostram nas coberturas da imprensa. No Brasil, a designação genérica Terceiro Setor se configurou a partir dos anos 90, em adição ao Primeiro Setor, que é o governo, e ao Segundo Setor, que é o mercado. O termo ONG – Organização não-governamental popularizou-se, porém não define a origem dessas instituições e em termos jurídicos não existe. Segundo a Abong – Associação Nacional do setor, as ONGs aparecem no formato de fundações ou de associações, podendo ser OSFL – Organizações Sem Fins Lucrativos, OSC, Organizações da Sociedade Civil ou OSCIP – Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público. Contudo, a própria Abong esclarece que essas nomenclaturas são apenas regulações e o sentido de atuação das ONGs se dá através dos temas e objetivos que mobilizam, bem como através de suas práticas e dos compromissos que cada entidade possui. Neste cenário, onde existem diferenças marcantes entre as instituições que participam do Terceiro Setor, a imprensa continua a exercer um papel de suma importância, pois é através dela que suas atividades podem ser mostradas e alguns conceitos esclarecidos. Mas estará o Terceiro Setor fazendo sua parte? Segundo André Trigueiro, um dos jornalistas entrevistados por Lilian Dreyer, há um desafio para a mídia e outro para o Terceiro Setor. O da mídia é a contextualização. É necessário entender em que contexto o assunto se envolve, do contrário qualquer um fala o que quiser e assim apenas se reproduz o que está sendo dito há muito tempo. Trigueiro explica que o comportamento da mídia em tratar os temas sem contextualização se dá pelo modelo de “jornalismo apressado” e utiliza a expressão “mares do imediatismo” para elucidar que o profissional da mídia tem dificuldade em aprofundar seus próprios conhecimentos. “O Brasil é um país que tem inúmeras limitações ao conhecimento mais sofisticado”, considera Trigueiro, e é por isso mesmo, segundo ele, que o valor do mesmo é enorme para a sociedade. O acesso à informação não é mais problema, já está disponibilizado inclusive para a população de baixa renda, o problema atual, para o jornalista, é o da contextualização, e nesse quesito tantos os veículos de comunicação como seus profissionais terão de mudar sua forma de produzir notícia. Um acontecimento apresentado como se ele existisse por si só, de forma isolada, não está bem apresentado. Temos que entender em que contexto o acontecimento se envolve. Já o desafio do Terceiro Setor é saber jogar. Para Trigueiro a mídia brasileira possui uma tendência em seguir utilizando as mesmas linhas editoriais, bem como as mesmas formas de cobrir diferentes assuntos, numa espécie de automação, como que se todos os assuntos pudessem ser encaixados numa única fôrma. Por um outro lado, há um movimento em sentido contrário, de profissionais que já estão percebendo a importância de repensar modelos do que é notícia. Um dos motivos para essa abertura, segundo o jornalista, é a constatação de que as pessoas já estão saturadas de consumir a mídia que deprime. Os jornalistas não são preparados para entender a dimensão emocional da notícia, afirma Trigueiro. Ele cita um movimento chamado Imagens e Vozes da Esperança que busca refletir sobre a responsabilidade não apenas de informar, mas de fomentar sentimentos, tanto positivos como negativos, dos profissionais de mídia. Neste sentido, o jornalista Ricardo Azeredo, professor da disciplina de Comunicação Comunitária, da ULBRA – Universidade Luterana do Brasil adverte que as organizações do Terceiro Setor que buscam atrair a mídia pelo apelo emocional negativo estão equivocadas. Segundo ele, existe uma tendência das entidades em se colocarem como “miseráveis”, o que pode até render algum espaço, mas o que a imprensa busca são as iniciativas consistentes, que mostram credibilidade, profissionalismo e sabem valorizar suas ações. Movimentos que prezam por ordenar sua gestão, com metas e processos bem definidos, conseguem ter potencial para mudar a sociedade e isso vira notícia. Outro ponto importante abordado por André Trigueiro é o fato da organização se predispor a ser interessante para a imprensa e tentar entender como o jornalista pensa. Ele ressalta que surgem situações que podem ser visualizadas para geração de notícia, como por exemplo, se está ocorrendo a São Paulo Fashion Week, é o momento da associação das costureiras do morro mostrar seu trabalho e promover um desfile, o que poderá vir a ser pauta em algum telejornal. “Se o jogo é esse, é precisa saber jogar”. Referências: DREYER, Lílian. O quinto poder: consciência social de uma nação. Porto Alegre: L&PM, 2008. Nota do Editor: Thiana Orth é jornalista, mestranda em Comunicação Social, na PUCRS.
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