A democratização das oportunidades de formação superior para incontáveis contingentes de jovens antes privados de tê-las, sem o perecimento da qualidade de ensino, é o desafio maior que se apresenta à universidade contemporânea. E a pergunta que fica é: como vai poder a instituição, nascida para atendimento cultural das elites, reciclar-se a ponto de popularizar sua matrícula, bem como deixar as lições do saber pelo saber, antes transmitidas pela semântica cifrada e codificada da linguagem científica, para aderir ao novo saber pragmático, quase pontual e tecnocêntrico, exigido pelo exercício profissional dos integrantes desta nossa sociedade industrial e de serviços? Com o fenômeno da afluência das massas às benesses da civilização, bem como a velocidade das mudanças políticas havidas no século 20, as escolas de todos os graus de ensino foram literalmente invadidas por multidões de alunos de diferentes origens sociais e capacidades intelectuais. E, em vez de terem reis e papas como mantenedores, passaram as universidades a ser sustentadas por orçamento público e recursos da bolsa dos usuários. Daí que se obrigaram a participar do dia-a-dia do mundo e a serem exigidas como centros de fornecimento de recursos humanos qualificados, necessários ao pluralismo laboral dos mercados de trabalho. A ciência e a tecnologia estão se sobrepondo às humanidades, e a velocidade das mudanças assusta a todos, visto não dar mais tempo para a maturação das novidades que se multiplicam de hora em hora. A dificuldade maior para os planejadores está em aproveitar a experiência secular do passado, sem, no entanto, desconhecer as exigências dos tempos presentes. A competição dos que se diplomam no ensino superior tende a ser crescente, sendo que sairá vitorioso o mais criativo, o mais culto e o mais apto a reciclar-se rapidamente, ante as exigências da mutação permanente do conhecimento nesta era de incertezas. Como já dizia Bacon a seu tempo: “conhecimento é poder”. Mas, de que conhecimento se está falando: o dos sábios do passado ou o dos especialistas do presente? Será que a solução para esse enigma não poderia estar na divisão da competência formativa de uma universidade voltada para um bacharelado que explore em profundidade as bases do conhecimento humano, ficando o preparo e o credenciamento profissional com atores outros, como centros de prática e pesquisa ligados às mais diversas profissões, como hospitais, tribunais, empresas, centro de arte e cousas que tais? E no caso dos cursos superiores profissionalizantes não seria melhor que as universidades, por si próprias ou em parceria com outras organizações não acadêmicas, atuassem no sentido de formar empreendedores, abandonando a tradição de formar profissionais para serem empregados, segundo modelos superados e insuficientes para os reclamos do mercado de trabalho em sua dinâmica atual? Diante das referidas ambigüidades e da impossibilidade de praticar-se uma futurição confiável capaz de prever modelos funcionais de universidades do porvir, toda cautela será pouca nas mudanças que se farão visando a ajustar os cursos às demandas presentes, sem por a perder as melhores conquistas do passado. Creio firmemente que, pelas regras de sua organização e pelo ritmo próprio do seu funcionamento, geralmente mais lento que o desejável, as universidades terão que, cautelosamente ir experimentando, caso a caso, diversos tipos de inovações, notadamente no que diz respeito ao preparo de seus alunos para o trabalho. Arrisco mesmo a dizer, que no futuro, a universidade deve cuidar do saber, a partir das raízes do conhecimento diversificado que constitui a herança cultural humana, e deixar o fazer por conta dos atores mais pragmáticos que já atuam com sucesso e atualização permanente de seus serviços, no mercado. Nota do Editor: Paulo Nathanael Pereira de Souza é doutor em educação e presidente do Conselho de Administração do CIEE.
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