Logo após fecharmos nossa terceira viagem de navio, as notícias sobre problemas em cruzeiros marítimos começaram a pulular na imprensa.

Ficamos um pouco preocupados, mas as experiências anteriores haviam sido tão boas, que não vimos razão para mudança de planos.

Desta feita, viajamos num navio de bandeira italiana, adicionalmente animados, eu e meu filho, com as perspectivas culinárias: pizzas e massas!

Um dos pontos-chaves de uma viagem marítima, o diretor de cruzeiros, era uma figura tão impagável quanto competente. Falava fluentemente cinco idiomas, tinha tiradas e “cacos” hilários. Seu único problema era estar um pouco desatualizado sobre futebol:

Em dado momento, ele perguntou quantos passageiros eram de Santos para, em seguida, em tom irônico, pedir para que só os que “torciam pelo Santos FC” mantivessem as mãos levantadas... Dois títulos nacionais e dois estaduais na década, e ele faz essa “gracinha” anacrônica. Aliás, havia um duplo “complô” contra os santistas no navio, pois o informativo de bordo, ao referir-se aos passeios previstos para a cidade, afirmou que seria visitada a sede do Santos FC, clube onde Pelé “iniciou sua carreira”, como se ele não houvesse jogado quase 20 anos no “Peixe” e conquistado os títulos mais importantes de sua carreira nesse período. O texto ainda dizia que Pelé era “um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro”... O “Atleta do Século XX”, para o autor do texto, era apenas um dos melhores jogadores brasileiros. Isso é coisa de corintiano ou argentino!

Os shows eram ótimos! Especial menção merece a apresentação dos passageiros:

Um deles resolveu tocar, ao piano, o tema do filme Titanic! A platéia entreolhou-se, um pouco surpresa com a escolha, mas, logo em seguida, caiu na gargalhada quando a equipe de animação passou a demonstrar, simultaneamente, a utilização de coletes salva-vidas...

A proverbial desinformação do Hemisfério Norte sobre o Brasil também estava lá, impávida:

Durante uma competição entre passageiros foi perguntado qual era o menor país da América do Sul. “Do Sul?” perguntaram. “Do Sul”, confirmaram. Os grupos mencionaram todos os países do continente, sem confirmação de acerto. Apelaram para as colônias: Guiana, Guiana Francesa... Nada! Então, a animadora disse que a resposta poderia surpreender alguns e já havia gerado polêmica, anteriormente, mas que a equipe havia pesquisado e confirmado. O menor país da América do Sul, segundo ela, era El Salvador!

Ninguém acreditou naquele absurdo, pois até Trinidad e Tobago, muito mais próximas do litoral Norte brasileiro, pertencem à América Central. Além disso, El Salvador não é o menor país nem lá!

Sob protestos generalizados, a apresentadora alegou, em sua “defesa”, que o material das atividades vinha da Itália e que havia checado a informação num “atlas italiano”... Só se for da época de Cristóvão Colombo! Ou, então, aquele tal que mostra que a Amazônia é “território internacional”, e que a capital do Brasil é Buenos Aires. Nada é perfeito! Fazer o quê...

Atentos aos problemas com outros cruzeiros, tivemos cuidado com a água: só bebemos mineral. Assim, sobrevivemos incólumes e só levemos para casa o “balanço do mar” e alguns quilos a mais, além da certeza de que nativos de 80 países diferentes podem conviver em paz e harmonia quando uns dependem dos outros e os preconceitos e barreiras culturais transformam-se em pontes cordiais, curiosidade amigável.

O mundo deveria ser um imenso navio de classe única! De fato, ele navega pelo universo...

Também trouxemos outra certeza: a de que nossas pizzas são as melhores!

O fascínio do mar, estar com quem a gente ama e ter a chance de sair um pouco a rotina fazem até um sujeito meio neurótico como eu “più felice”. Esse sentimento, com certeza, confortou aqueles que ainda tiveram que encarar até 14 horas de viagem até suas cidades.

Um tanto ao mar, um tanto à terra... Que bons ventos sempre nos unam e levem!

Nota do Editor: Adilson Luiz Gonçalves é mestre em educação, escritor, engenheiro, professor universitário (UNISANTOS e UNISANTA) e compositor. E-mail: prof_adilson_luiz@yahoo.com.br.